Jurisprudência em Destaque

STJ. 2ª Seção. Recurso especial repetitivo. Eletrificação rural. Recurso especial representativo de controvérsia. Administrativo. Financiamento de rede de eletrificação rural. Ação de restituição dos valores aportados. Prazo prescricional. Prescrição. Extinção do processo. Precedentes do STJ. CPC, arts. 269, VI e 543-C. CCB/2002, arts. 205, 206, § 3º, IV e 2.028. CCB, art. 177. Dec. 41.019/1957, arts. 138, 140, 141 e 142.

Postado por Emilio Sabatovski em 20/06/2013
«... 2. A matéria alusiva à prescrição da pretensão ao ressarcimento de valores investidos em expansão de rede de eletrificação já foi apreciada em sede de recurso especial repetitivo, de minha relatoria, chegando a Segunda Seção ao seguinte entendimento: «prescreve em 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 5 (cinco) anos, na vigência do Código Civil de 2002, a pretensão de cobrança dos valores aportados para a construção de rede de eletrificação rural, posteriormente incorporada ao patrimônio da CEEE/RGE, respeitada a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002".

O suporte fático do precedente acima mencionado dizia respeito a contrato firmado entre os autores e a RGE, tendo a concessionária se obrigado a restituir ao consumidor, após o decurso do prazo de quatro anos, as quantias investidas pelo seu valor histórico. Daí por que se aplicou o art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil de 2002, já que a pretensão deduzida era de «cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular".

Porém, têm aportado a esta Corte controvérsias com outros contornos fáticos e jurídicos, envolvendo contratos nos quais há vedação expressa à restituição de valores (comumente designados «Termo de Contribuição").

Por ocasião do despacho de afetação, vislumbrei que, em princípio, não se trata de pretensão a cobrança de «dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular". Nesses casos, tem se questionado a legalidade da vedação contratual à restituição dos valores aportados no custeio da rede elétrica - tema discutido no julgamento anterior, do REsp. 1.243.646/PR.

Por isso, afigurou-se-me conveniente a rediscussão da matéria, com re afirmação e atualização do entendimento sufragado no REsp. 1.063.661/RS, julgado pelo rito do art. 543-C, CPC.



3. Nesse passo, absolutamente acertada a jurisprudência tranquila que antecedeu o mencionado precedente, entendendo incidir o prazo prescricional aplicável àquelas hipóteses de «dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular» (art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil de 2002).

Na verdade, tal entendimento foi antecedido por precedente desta Segunda Seção, de relatoria Ministro João Otávio de Noronha, em cujo voto condutor ficou assentado que:


Em caso como tais, que envolvem dívidas líquidas documentadas, em que a obrigação é certa quanto à existência e determinada quanto ao objeto, o Novo Código Civil estabeleceu especificamente que a prescrição aplicável à pretensão do respectivo titular ocorre no prazo de cinco anos, a partir do vencimento da obrigação, consoante prevê o artigo 206, § 5º, inciso I. (REsp. 1.053.007/RS, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27.05.2009)

A ementa desse julgado é a seguinte:


AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE FORNECIMENTO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA. FINANCIAMENTO E ADIANTAMENTO DE OBRAS DE ELETRIFICAÇÃO. INAPLICABILIDADE DA PRESCRIÇÃO TRIENAL OU DECENAL DO ARTIGO 205 DO NOVO CÓDIGO CIVIL CORRESPONDENTE AO ARTIGO 177 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. ARTIGO 206, § 5º, INCISO I.


1. O prazo prescricional das ações de cobrança de dívida líquida constante em instrumento público ou particular de natureza pessoal é qüinqüenal, enquadrando-se na regra específica do inciso I, parágrafo 5º, do artigo 206 do Novo Código Civil.


2. Recurso especial não-conhecido.


(REsp 1053007/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/08/2009, DJe 09/12/2009)

  • 1.053.007/STJ (Prazo prescricional. Prescrição. Ação de cobrança. Contrato de fornecimento de rede de energia elétrica. Financiamento e adiantamento de obras de eletrificação (rural). Inaplicabilidade da prescrição trienal ou decenal do art. 205 do CCB/2002 correspondente ao art. 177 do CCB (anterior). Prescrição quinquenal. CCB/2002, art. 206, § 5º, I).


Outros casos, todavia, em que a moldura fática e a causa de pedir se diferenciam, a solução, a meu juízo, não pode ser a mesma.

Nos presentes autos - assim como em outros oriundos de diversas Unidades da Federação -, não há pura e simplesmente um instrumento contratual a prever dívida líquida a ser paga pela concessionária em determinado prazo.

A exemplo dos processos oriundos do Paraná - o que ficou claro no julgamento anterior, do REsp. 1.243.646/PR -, a pactuação era total ou parcialmente em sentido inverso, constando que a concessionária não restituiria o valor pago pelo consumidor em nenhuma hipótese.

A situação fática de processos oriundos do Rio Grande do Sul, como no caso em exame, revela a existência de dois instrumentos contratuais: um «CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO", no qual havia previsão de que o aporte financeiro seria restituído «não antes de 4 anos pelo valor histórico", a contar da conclusão da obra; e outro instrumento nominado de «TERMO DE CONTRIBUIÇÃO", no qual havia previsão expressa de que o aporte ocorreria sob a forma de contribuição do consumidor, «não lhe cabendo qualquer espécie de reembolso em momento algum, conforme disposição legal vigente".

Com efeito, o prazo de prescrição aplicável a situações como a presente deve ser aferido a partir dessas duas realidades distintas, não me parecendo possível a aplicação homogênea a toda controvérsia do lapso prescricional previsto no art. 206, § 5º, inciso I, do Código Civil de 2002, que diz respeito a dívidas líquidas.

Entendo que à pretensão de ressarcimento do valor previsto no chamado «CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO", aplica-se o entendimento firmado no REsp. 1.063.661/RS, devendo manter-se inalterada a jurisprudência firmada em recurso especial repetitivo.



4. Porém, a solução, a meu juízo, deve ser outra no particular relativo à restituição dos valores previstos no «TERMO DE CONTRIBUIÇÃO", como a seguir descrito.

A moldura fática soberanamente traçada nos presentes autos - e que normalmente se repete em diversos outros processos - é a de que o consumidor se insurge contra a legalidade da cláusula contratual que prevê a não devolução dos valores aportados por ele para o financiamento de rede elétrica, seja vedando expressamente, seja afirmando que a participação financeira do consumidor dar-se-ia a título de «contribuição".

Nesses casos, inexistindo dívida reconhecida contratualmente pela concessionária, acoimam-se as mencionas pactuações com a pecha da invalidade/abusividade, pretendendo-se, a partir do reconhecimento do vício, o ressarcimento dos valores anteriormente pagos.

O sistema civil brasileiro de 1916, como é amplamente sabido, não tratou com muito esmero os institutos da prescrição e da decadência, atribuindo prazos ditos prescricionais a direitos potestativos, sujeitos evidentemente a decadência.

Colhem-se como exemplos dessa erronia o pedido de anulação de casamento (art. 178, § 1º e § 4º, II, § 5º, I e II), a ação para se contestar a paternidade de filho (art. 178, § 3º), a ação para revogar doação (art. 178, § 6º, I), ação do adotado para se desligar da adoção (art. 178, § 6º, XIII), ação para anulação de contratos em razão de vício de vontade (art. 178, § 9º, inciso V).

Quanto à prescrição, desde o diploma revogado, o legislador optou por prever um prazo geral (art. 177) e situações discriminadas sujeitas a prazos especiais (art. 178), sem exclusão de outros prazos conferidos por leis específicas.

Grosso modo, esse método foi transferido para o Código Civil de 2002, que também prevê um prazo geral (art. 205), e prazos específicos (art. 206) de prescrição.

Essa sistemática, por si só, possui a virtualidade de apanhar, ordinariamente, todas as pretensões de direito subjetivo e lhes conferir um prazo de perecimento: se a pretensão não se enquadra nos prazos prescricionais específicos, sujeitar-se-á, certamente, ao prazo geral.

No Código Civil de 1916 - embora baralhando conceitos - os prazos de prescrição e decadência estavam previstos nos arts. 177 a 179.

A partir da leitura e conjugação dos artigos acima transcritos, percebe-se que a situação tratada nos autos não se ajusta a nenhum prazo específico de prescrição, incidindo, assim, a regra geral para as ações pessoais, prevista no art. 177 do Código Civil.

Tal conclusão é a mesma adotada no precedente firmado no recurso repetitivo já mencionado (REsp. 1.063.661/RS).



Isso porque, na vigência do Diploma revogado, a separação entre ações pessoais e reais era a regra geral de definição de prazos prescricionais, quando a situação controvertida não se enquadrava nos prazos específicos.

Assim, tanto o pedido de restituição dos valores previstos no chamado «CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO", quanto o de restituição do valor subjacente ao «TERMO DE CONTRIBUIÇÃO", enquadram-se ambos no que o Código Civil anterior denominava ações pessoais, estando ambos sujeitos ao prazo vintenário de prescrição.

Contudo, na vigência do Código Civil de 2002, a situação é outra, uma vez que se abandonou o critério das ações «pessoais» ou «reais» como elemento definidor de prazos gerais de prescrição. Agora, há um prazo geral de dez anos, previsto no art. 205, aplicável sempre quando não incidir um dos prazos específicos listados pelo art. 206.

Confira-se:


Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.


Art. 206. Prescreve:


§ 1-. Em um ano:


I - a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou dos alimentos;


II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo:


a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;


b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;


III - a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais, árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários;


IV - a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram para a formação do capital de sociedade anônima, contado da publicação da ata da assembléia que aprovar o laudo;


V - a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e os liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da liquidação da sociedade.


§ 2-. Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem.


§ 3-. Em três anos:


I - a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;


II - a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias;


III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com capitalização ou sem ela;


IV - a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;


V - a pretensão de reparação civil;


VI - a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-fé, correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição;


VII - a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da lei ou do estatuto, contado o prazo:


a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade anônima;


b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou da reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento;


c) para os liquidantes, da primeira assembléia semestral posterior à violação;


VIII - a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;


IX - a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.


§ 4-. Em quatro anos, a pretensão relativa à tutela, a contar da data da aprovação das contas.


§ 5-. Em cinco anos:


I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;


II - a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato;


III - a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo.

Destarte, no particular relativo ao «TERMO DE CONTRIBUIÇÃO", não incide o prazo de cinco anos previsto no art. 206, § 5º, inciso I, porque de «dívidas líquidas» não se trata.

Importante ressaltar, nesse momento, que no julgamento anterior (REsp. 1.243.646/PR), no ponto alusivo a eventuais ilegalidades em contratos desse jaez, ficou excluída a possibilidade de infringência ao Código de Defesa do Consumidor pela cláusula que afasta a restituição dos valores, não se havendo falar por isso em nulidades absolutas, como as previstas no art. 51 daquele mencionado diploma.

Em verdade, de tudo que se afirmou no julgamento precedente (REsp. 1.243.646/PR), o único pleito remanescente e possível (após o resultado de mérito daquele julgamento) é na hipótese de o consumidor alegar e provar a inadequação do contrato à legislação regente à época, qual seja, Decreto 41.019/57, com as alterações trazidas pelo Decreto 83.269/79 e Decreto 98.335/89, assim também a normatização baixada pelo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica - DNAEE, que definia os encargos de responsabilidade da concessionária e do consumidor, relativos a pedidos de extensão de redes de eletrificação, com base na natureza de cada obra.

Com efeito, haveria ilegalidade na retenção dos valores pagos pelo consumidor se os mencionados aportes fossem, na verdade, de responsabilidade da concessionária, tendo esta se apropriado de quantia de terceiro que, a rigor, deveria ter sido desembolsada por ela própria.

Em suma, haveria ilegalidade se o consumidor tivesse arcado com parte (ou totalidade) da obra que cabia à concessionária.

Assim, a meu juízo, incide o prazo de três anos previsto no art. 206, § 3º, inciso IV, para a «pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa", no que concerne à restituição de valores contidos em instrumentos contratuais que vedava a devolução (como os chamados TERMOS DE CONTRIBUIÇÃO).

Deveras, o novo regramento consignou prazo prescricional específico para a pretensão em análise, que envolve ressarcimento de valores cujo pagamento - como se alega - tenha sido indevido.

Vale dizer, o novo Código limitou o lapso de tempo em que se permite ao prejudicado o ajuizamento da actio de in rem verso.

A solução da controvérsia revelada nos autos perpassa o conceito e a abrangência do instituto do enriquecimento sem causa, com base no qual deve-se aferir o âmbito de aplicação dos dispositivos legais acima referidos.

Caio Mario de Silva Pereira assim conceitua o instituto:


Toda aquisição patrimonial deve decorrer de uma causa, ainda que seja ela apenas um ato de apropriação por parte do agente, ou um ato de liberalidade de uma parte em favor da outra. Ninguém enriquece do nada.


O sistema jurídico não admite, assim, que alguém obtenha um proveito econômico às custas de outrem, sem que esse proveito decorra de uma causa juridicamente reconhecida. A causa para todo e qualquer enriquecimento não só deve existir originariamente, como também deve subsistir, já que o desaparecimento superveniente da causa do enriquecimento de uma pessoa, às custas de outra, também repugna ao sistema (Código Civil, art. 885). Esse é o espírito do denominado princípio do enriquecimento sem causa, disciplinado pela primeira vez de forma expressa no Código Civil de 2002. (Instituições de Direito Civil, volume III,).

Prosseguindo, leciona que:


Para que o enriquecimento sem causa se configure, é preciso que o proveito obtido por sua atividade ou por sua causa tenha sido ilegitimamente apropriado pelo beneficiado, sem que o lesado possa por qualquer outro meio obter o benefício dela decorrente.

Na mesma linha, obtempera Humberto Theodoro Júnior:


O enriquecimento, sem justa causa, é fonte da obrigação de restituir tudo o que o beneficiário lucrou à custa do empobrecimento de outrem (art. 884).


A ação para recuperar a perda sofrida nasce para o prejudicado no momento em que o beneficiário absorve em seu patrimônio o bem a que não tinha direito. Ao mesmo tempo que sofre o prejuízo, adquire o prejudicado o direito ao ressarcimento, acompanhado da imediata pretensão. Tudo se passa simultaneamente. Por isso, do próprio fato do enriquecimento sem causa começa a correr a prescrição da pretensão de recuperá-lo. A situação é a mesma do ato ilícito: o responsável se coloca em mora desde o momento em que o praticou (art. 398) (THEODORO JÚNIOR, Humerto. Comentários ao código civil, volume 3. t.2. Sálvio de Figueiredo Teixeira (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2003, p 327).

Anardo Rizzardo, por sua vez, traz alguns exemplos em que a prescrição alusiva à ação de enriquecimento sem causa incidiria:


Inúmeras as situações que comportam o ressarcimento, sendo o elemento configurativo o proveito resultante a uma das partes de uma relação contratual ou extracontratual. Assim, a falta de pagamento da dívida no momento oportuno, o investimento de capital recebido sem a retribuição pelo tempo em que ficou a parte usufruindo do mesmo capital, o acréscimo feito em uma obra a pedido do contratante, o empréstimo de um instrumento que trouxe vantagens à pessoa, a utilização de uma área de terras no cultivo econômico, a permanência em um imóvel além do prazo combinado, o pagamento do preço inferior ao vigente no mercado, são alguns exemplos (RIZZARDO, Arnaldo. Parte Geral do Código Civil. p. 617).

Há também precedentes nesta Corte a abraçar essa tese:


CONSUMIDOR E PROCESSUAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. COBRANÇA INDEVIDA DE VALORES. INCIDÊNCIA DAS NORMAS RELATIVAS À PRESCRIÇÃO INSCULPIDAS NO CÓDIGO CIVIL. PRAZO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO TRIENAL. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.


1. O diploma civil brasileiro divide os prazos prescricionais em duas espécies. O prazo geral decenal, previsto no art. 205, destina-se às ações de caráter ordinário, quando a lei não houver fixado prazo menor. Os prazos especiais, por sua vez, dirigem-se a direitos expressamente mencionados, podendo ser anuais, bienais, trienais, quadrienais e quinquenais, conforme as disposições contidas nos parágrafos do art. 206.


2. A discussão acerca da cobrança de valores indevidos por parte do fornecedor se insere no âmbito de aplicação do art. 206, §3º, IV, que prevê a prescrição trienal para a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa. Havendo regra específica, não há que se falar na aplicação do prazo geral decenal previsto do art. 205 do CDC. Precedente.


3. A incidência da regra de prescrição prevista no art. 27 do CDC tem como requisito essencial a formulação de pedido de reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço, o que não ocorreu na espécie.


4. O pedido de repetição de cobrança excessiva que teve início ainda sob a égide do CC/16 exige um exame de direito intertemporal, a fim de aferir a incidência ou não da regra de transição prevista no art. 2.028 do CC/02.


5. De acordo com esse dispositivo, dois requisitos cumulativos devem estar presentes para viabilizar a incidência do prazo prescricional do CC/16: i) o prazo da lei anterior deve ter sido reduzido pelo CC/02; e ii) mais da metade do prazo estabelecido na lei revogada já deveria ter transcorrido no momento em que o CC/02 entrou em vigor, em 11 de janeiro de 2003.


6. Considerando que não houve impugnação do dies a quo do prazo prescricional definido pelo Tribunal de Oirgem - data da colação de grau do recorrente, momento no qual ocorreu o término da prestação de serviço educacional -, e que, na espécie, quando o CC/02 entrou em vigor não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto na lei antiga, incide o prazo prescricional trienal do CC/02, motivo pelo qual o acórdão recorrido não merece reforma.


7. Recurso especial não provido.


(REsp 1238737/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/11/2011, DJe 17/11/2011)

  • 1.238.737/STJ (Consumidor. Hermenêutica. Prazo prescricional. Ação de repetição de indébito. Cobrança indevida de valores. Incidência das normas relativas à prescrição insculpidas no Código Civil. Prazo especial. Prescrição trienal. Pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa. Hipótese que consumidor pede restituição de valores cobrados indevidamente por fornecedor de serviços, in casu, instituição particular de ensino superior. Precedente do STJ. CDC, arts. 27 e 42, parágrafo único. CCB/2002, arts. 205, 206, § 3º, IV, 884 e 2.028. CCB, art. 177).



________________________


PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO.


RECOMPOSIÇÃO DE PREÇOS. REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. ART. 206, § 3º, IV, DO CÓDIGO CIVIL. PLEITO EFETUADO APÓS A CONCLUSÃO DA OBRA. RESSARCIMENTO DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. RECURSO NÃO PROVIDO.


1. Pessoa jurídica vencedora de licitação propôs ação de recomposição de preços contra sociedade de economia mista. Alega que houve uma significativa elevação do dólar, que ocasionou exorbitante aumento nos preços dos insumos básicos, materiais e equipamentos empregados na realização da obra, comprometendo a equação econômica ajustada no momento da contratação. Discute-se, no apelo especial, se a prescrição na hipótese é regida pelo prazo geral de dez anos, previsto no art. 205, do Código Civil, ou se deve ser aplicado o de três anos, contido no art. 206, § 3º, IV, daquele mesmo diploma.


2. O recurso não merece ser conhecido pela alegativa de dissídio jurisprudencial, uma vez que o recorrente não realizou o necessário cotejo analítico entre os arestos confrontados, deixando de demonstrar a existência de similitude fática entre eles. Dessarte, descumpriu-se o disposto nos artigos 541, parágrafo único, do CPC, e 255 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.


Precedentes.


3. De acordo com o entendimento pacificado no STJ, as ações movidas contra as sociedades de economia mista não se sujeitam ao prazo prescricional previsto no Decreto-Lei 20.910/32, porquanto possuem personalidade jurídica de direito privado, estando submetidas às normas do Código Civil.


4. O art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002 estipula o prazo prescricional de três anos para as ações de ressarcimento por enriquecimento sem causa.


5. A situação narrada nos autos se amolda ao disposto no art. 206, § 3º, IV, do CC. O pleito para recomposição de preços foi realizado após a entrega da obra, isto é, quando já exaurido o objeto contratual. Dessa feita, não se trata de simples anulação ou revisão de cláusulas contratuais, mas de verdadeiro pedido de ressarcimento formulado perante a Administração Pública, a qual se beneficiou do desequilíbrio econômico-financeiro do contrato.


6. Recurso especial não provido.


(REsp 1145416/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 17/03/2011)


________________________

5. Assim, diante das questões jurídicas subjacentes ao caso concreto, encaminho os seguintes entendimentos para efeitos do art. 543-C do CPC:

5.1. Nas ações em que se pleiteia o ressarcimento dos valores pagos a título de participação financeira do consumidor no custeio de construção de rede elétrica, a prescrição deve ser analisada, separadamente, a partir de duas situações: (i) pedido relativo a valores cujo ressarcimento estava previsto em instrumento contratual e que ocorreria após o transcurso de certo prazo a contar do término da obra (pactuação prevista em instrumento geralmente nominado de «CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO"); (ii) pedido relativo a valores para cujo ressarcimento não havia previsão contratual (pactuação prevista em instrumento geralmente nominado de «TERMO DE CONTRIBUIÇÃO".

5.2. No primeiro caso (i), «prescreve em 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 5 (cinco) anos, na vigência do Código Civil de 2002, a pretensão de cobrança dos valores aportados para a construção de rede de eletrificação rural, [...] respeitada a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002» (REsp 1.063.661/RS, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/02/2010);



5.3. No segundo caso (ii), a pretensão prescreve em 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 3 (três) anos, na vigência do Código Civil de 2002, por se tratar de demanda fundada em enriquecimento sem causa (art. 206, § 3º, inciso IV), observada, igualmente, a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002.

6. No caso concreto, o acórdão recorrido firmou a premissa fática de ter havido o desembolso de CR$ 50.427,14, a título de TERMO DE CONTRIBUIÇÃO, e de CR$ 8.218,32, como CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO.

Por outro lado, a despeito de constar na inicial alegação de aporte financeiro no ano de 1999, o acórdão recorrido entendeu que o desembolso dos valores ocorreu em 17 de agosto de 1993 (fl. 220).

Assim, aplicando-se o prazo vintenário para ambos os aportes, verifica-se que, por ocasião da entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11 de janeiro de 2003), não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional antigo, fazendo incidir os novos prazos, nos termos da regra de transição prevista no art. 2.028.

Destarte, para o pedido de ressarcimento dos valores previstos no CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO, o prazo prescricional findaria em 11 de janeiro de 2008 (cinco anos, a contar da vigência do novo Código); para o pedido de ressarcimento dos valores previstos no TERMO DE CONTRIBUIÇÃO, o prazo prescricional findaria em 11 de janeiro de 2006 (três anos, a contar da vigência do novo Código).

O autor ajuizou a ação em 15 de janeiro de 2009, por isso a totalidade de sua pretensão está mesmo alcançada pela prescrição.

7. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para extinguir o feito com julgamento de mérito (art. 269, inciso IV, do CPC), reconhecendo a prescrição. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (133.6633.3000.7800) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Recurso especial repetitivo (Jurisprudência)
▪ Eletrificação rural (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Recurso especial representativo de controvérsia (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Administrativo (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Financiamento de rede de eletrificação rural (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Custeio de obra de extensão de rede elétrica (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Consumidor (v. ▪ Recurso especial repetitivo) (Jurisprudência)
▪ Extinção do processo (v. ▪ Prescrição) (Jurisprudência)
▪ CPC, art. 543-C
▪ CCB/2002, art. 205
▪ CCB/2002, art. 206, § 3º, IV
▪ CCB/2002, art. 2.028.
▪ CCB, art. 177
Dec. 41.019/1957, art. 138 (Legislação)
Dec. 41.019/1957, art. 140 (Legislação)
Dec. 41.019/1957, art. 141 (Legislação)
Dec. 41.019/1957, art. 142 (Legislação)
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