Jurisprudência em Destaque

STJ. 1ª Seção. Recurso especial. Ministério Público Estadual. Legitimidade recursal para atuar perante as cortes superiores. Direito de ação. Considerações do Min. Mauro Campbell Marques sobre o tema. CF/88, arts. 5º, XXXV, 105, III, 127, § 1º e 128, I e II. CPC, art. 541. Lei 8.038/1990, art. 26.

Postado por Emilio Sabatovski em 02/12/2012
«... Primeiramente, passo à análise da legitimidade do Ministério Público Estadual para atuar perante os Tribunais Superiores.

É sabido que esta Corte Superior de Justiça até aqui ampara a tese de que o Ministério Público Estadual não é parte legítima para atuar perante os Tribunais Superiores, uma vez que tal atividade estaria restrita ao Ministério Público Federal. Precedentes: AgRg no AgRg no Ag 1388777/GO, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Segunda Turma, julgado em 19/06/2012, DJe 28/06/2012; AgRg nos EREsp 1162604/SP, Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, Primeira Seção, julgado em 23/05/2012, DJe 30/05/2012; AgRg no RMS 35.019/GO, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 07/02/2012, DJe 13/02/2012; AgRg na SLS 828/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, DJe 12.2.2009; AgRg nos EREsp 769.811/SP, Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJe 1º.2.2010.

Ocorre que tal entendimento, em meu sentir, merece revisão.

A tese adotada nesta Corte Superior de Justiça fundamenta-se no pressuposto de que o Ministério Público é instituição una, cabendo a seu chefe, o Procurador-Geral da República, representá-la, atuando, em seu nome, junto às Cortes Superiores: STF e STJ. Como fundamento normativo de tal tese, temos a Lei Complementar Federal 75/93 e o art. 61 do RISTJ.

Essa construção, em sentido meramente literal, não se mostra precisa.

Tal raciocínio resume-se na ideia de que a legislação orgânica do Ministério Público e o RISTJ conferem aos membros da segunda instância dos Ministérios Públicos dos Estados a possibilidade de interpor recursos extraordinários e especiais aos tribunais superiores, por força de decisões proferidas nos tribunais estaduais. Porém, a atribuição para oficiar junto aos tribunais superiores é do Procurador-Geral da República ou de Subprocuradores da República por ele designados.

Conquanto o Superior Tribunal de Justiça integre a estrutura administrativa do Conselho da Justiça Federal, por meio do Presidente, do Vice-Presidente e de três Ministros eleitos do STJ (inteligência do art. 3º, incisos I e II, do Regimento Interno do CJF), o Tribunal da Cidadania extrapola a natureza de mero Tribunal Federal, haja vista que, na qualidade de Corte Superior, incumbida de uniformizar, em âmbito nacional, e não apenas federal, a interpretação judicial da legislação federal infraconstitucional, atua como verdadeiro Tribunal da Federação brasileira, cuja jurisprudência há de ser observada, a título de paradigma, quer pelos Tribunais Regionais da União, quer pelos Tribunais Judiciários Estaduais.

Por outro lado, a Constituição Republicana estabelece como princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (art. 127, § 1º da CR/88), organizando o Ministério Público brasileiro em dois segmentos: Ministério Público da União, que compreende o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios; e o Ministério Público dos Estados (art. 128, incisos I e II, da CR/88).

Tal estruturação assentada constitucionalmente implica duas consequências: (i) não há hierarquia entre os dois ramos distintos do Ministério Público (da União e dos Estados); (ii) a unidade institucional é princípio aplicável apenas no âmbito de cada Ministério Público.

A esse propósito a doutrina: Hugo Nigro Mazzilli (Regime jurídico do Ministério Público, 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 116); Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, 19. Ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 547-548); José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo, 28. Ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 601); José Frederico Marques (Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, Campinas, Millenium editora, 2000, p. 245).

Salienta-se que a própria Constituição, ao assentar que o Procurador-Geral da República é o chefe do Ministério Público da União, enquanto os Ministérios Públicos estaduais são chefiados pelos respectivos Procuradores-Gerais de Justiça (Cf. art. 128, §§ 1º e 3º da CR/88), sinaliza a inexistência de relação hierárquica entre o Ministério Público da União e os Ministérios Públicos dos Estados.

A inexistência de tal relação hierárquica é uma manifestação expressa do princípio federativo, onde a atuação do MP estadual não se subordina ao MP da União.

Tanto é verdade que o regime federativo se manifesta no âmbito do Ministério Público, que cada um dos seus ramos possui autonomia funcional e administrativa, iniciativa legislativa para a criação e extinção de seus cargos e serviços auxiliares, e também essa mesma iniciativa em matéria orçamentária.

Assim, não permitir que o Ministério Público do Estado interponha recursos em casos em que seja autor da ação que tramitou originariamente no âmbito da Justiça Estadual, ou mesmo ajuizar ações ou medidas originárias (o mandado de segurança, a reclamação constitucional , pedidos de suspensão de segurança ou de tutela antecipada) junto aos tribunais superiores, e nelas apresentar recursos subsequentes (embargos de declaração, agravo regimental, recurso extraordinário) significa negar a aplicação do princípio federativo e a autonomia do Parquet Estadual.

Não se nega o acerto da afirmação de que cabe ao Procurador-Geral da República, ou aos Subprocuradores da República, por delegação ou designação, oficiar nos feitos junto ao STF e ao STJ, mas isso não retira a possibilidade do Ministério Público Estadual atuar em suas ações e na causa de seus interesses como parte.

Realmente, só ao Procurador-Geral da República é permitido ajuizar ações diretas de inconstitucionalidade, ações penais ou ações civis originárias para as quais seja legitimado o Ministério Público da União junto ao STF e ao STJ.

Também não se apresenta dúvida de que ao Procurador-Geral da República ou a Subprocuradores da República, cabe ofertar pareceres em processos que tramitem junto ao STF e ao STJ, atuando como custos legis.

Absolutamente diverso quando se trata da interposição de recursos extraordinários ou especiais, e dos recursos subsequentes (agravos regimentais, embargos de declaração e embargos de divergência), ou mesmo do ajuizamento de mandado de segurança, reclamação constitucional, ou pedidos de suspensão de segurança ou de tutela antecipada, relativamente a feitos de competência da Justiça dos Estados em que o MP Estadual é autor. Caso contrário, não há que se falar em autonomia e independência institucional do Ministério Público Estadual.

Dessa forma, é legitimo concluir que impetrar mandado de segurança, ajuizar reclamação constitucional, pedido de suspensão de segurança, ou de tutela antecipada, ou ainda interpor outros recursos subsequentes nos feitos que tramitem tanto no STF como no STJ nos casos em que o MP Estadual é o autor da ação (agravos regimentais, embargos de declaração, ou embargos de divergência), não são atribuições exclusivas do Ministério Público da União.

Nesses casos, o MP Estadual oficia como autor, enquanto o Procurador-Geral da República oficia como fiscal da lei. Exercem, portanto, papeis diferentes, que não se confundem e não se excluem reciprocamente.

Reitera-se que não permitir que o Ministério Público Estadual atue perante esta Corte Superior de Justiça significa: (a) vedar ao MP Estadual o acesso ao STF e ao STJ; (b) criar espécie de subordinação hierárquica entre o MP Estadual e o MP Federal, onde ela é absolutamente inexistente; (c) cercear a autonomia do MP Estadual; e (d) violar o princípio federativo; (e) desnaturar o jaez do STJ de Tribunal Federativo, uma vez que tolheria os meios processuais de se considerarem as ponderações jurídicas e o pensamento do MP Estadual, inclusive como um modo de oxigenar a jurisprudência da Corte, por meio da análise dos debates jurídicos oriundos dos MPs Estaduais, dando-se-lhes a plenitude dos meios processuais de expressão das suas teses jurídicas.

Ademais, negar ao MP Estadual, como autor da demanda, a possibilidade de interposição de recurso nas Cortes Superiores, através do Procurador-Geral de Justiça, é na prática, impedir, de forma ilegítima, o acesso da parte à instância extraordinária.

Negar aos Ministérios Públicos Estaduais a propositura de ações, medidas originárias, ou recursos junto aos tribunais superiores, especialmente nos casos em que os recursos sejam decorrentes de ações em que o MP Estadual é autor, significa real redução de direitos, não podendo o Parquet Estadual ser tolhido do seu direito de invocar a atuação desta Corte Superior de Justiça.

Condicionar o destino de ações, em que o autor é o Ministério Público Estadual, à interposição ou não de recursos pelo Ministério Público Federal, é submeter seu legítimo exercício do poder de ação assentado constitucionalmente (art. 5º, inciso XXXV) ao MPF. Isso se apresenta tanto violação ao exercício do direito constitucional de ação, que inclui a legítima interposição de recursos previstos em lei (art. 5º, XXXV da CR), como a violação da autonomia institucional do Ministério Público do Estado (art. 127, § 2º, e art. 128, § 3º da CR), do próprio princípio federativo (art. 1º e 18 da CR) e desta Corte Superior como um Tribunal Federativo.

Assim, mostra-se fundamental demonstrar que o Ministério Público Estadual não está vinculado nem subordinado, no plano processual, administrativo e/ou institucional, à Chefia do Ministério Público da União, o que lhe confere ampla possibilidade de postular, autonomamente, perante esta Corte Superior de Justiça.

Salienta-se que a atuação do Ministério Público Estadual perante o Superior Tribunal de Justiça não afasta a atuação do Ministério Público Federal, um agindo como parte e o outro como custos legis.

Ademais, a legitimação do Ministério Publico Estadual para atuar junto aos Tribunais Superiores vem sendo reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. Tanto é que a Suprema Corte editou a Resolução nº 404, de 7 de agosto de 2009 (alterada pela Resolução 469, de 30 de setembro de 2011), cujo art. 5º dispõe:


Art. 5º Quando partes na causa, os Ministérios Públicos dos Estados, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios e as Defensorias Públicas dos Estados e do Distrito Federal serão intimados na pessoa que os represente no feito.

Recentemente, durante o julgamento da questão de ordem no Recurso Extraordinário 593.727/MG, em que discutia a constitucionalidade da realização de procedimento investigatório criminal pelo Ministério Público, decidiu-se pela legitimidade do Ministério Público Estadual atuar perante a Suprema Corte. Vejamos trecho do Informativo 671 do STF:


Em seguida, o Supremo, por votação majoritária, resolveu questão de ordem – suscitada pelo PGR – com o fito de assentar a legitimidade do Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, ora recorrido, para proferir sustentação oral. O Min. Cezar Peluso, relator, anotou que o Plenário já teria reconhecido que o parquet estadual disporia de legitimação para atuar diretamente nesta Corte nas causas por ele promovidas originariamente. Elucidou que o PGR poderia desempenhar, no Supremo, 2 papéis simultâneos: a) o de fiscal da lei; ou b) o de parte. Assim, quando o MPU, em qualquer dos seus ramos, figurasse como parte do feito, só ao PGR seria dado oficiar perante o STF, porque ele quem encarnaria os interesses confiados pela lei ou pela Constituição a este órgão. Explicou que, nos demais casos, esse parquet exerceria, evidentemente, a função de fiscal da lei. Nesta última condição, a sua manifestação não poderia preexcluir a das partes, sob pena de ofensa ao princípio do contraditório. Destarte, sugeriu que a Lei Complementar federal 75/93 somente incidisse no âmbito do MPU, sob pena de cassar-se a autonomia dos Ministérios Públicos estaduais, que estariam na dependência, para promover e defender interesse em juízo, da aprovação do Ministério Público Federal. RE 593727/MG, rel. Min. Cezar Peluso, 21.6.2012. (RE-593727)

Como já dito no início do voto, não desconheço dos precedentes no sentido da tese de que o Ministério Público Estadual não é parte legítima para atuar perante os Tribunais Superiores, uma vez que tal atividade estaria restrita ao Ministério Público Federal. Porém, nenhum deles foi julgado sob a égide do entendimento proferido pelo Supremo Tribunal Federal, transcrito acima (Questão de Ordem no RE 593727/MG).

Também é de pertinência frisar que não haverá qualquer embaraço na tramitação processual neste Superior Tribunal de Justiça para cumprimento das medidas legais de intimação dos Ministérios Públicos Estaduais já que elas terão como destinatários, exclusivamente, os respectivos Chefes dessas Instituições nos Estados, realçando-se que a deflagração dos prazos, a teor do que já decidido pelo Supremo Tribunal Federal (HC 83917, Relator Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 27/04/2004, DJ 25/06/2004), o dies a quo, será sempre a data de ingresso dos autos na sede do Parquet, sem olvidar que, no âmbito deste STJ, a quase unanimidade dos autos são digitalizados e podem ser encaminhados por meio eletrônico para que se cumpra a Lei.

De igual modo não se vislumbra qualquer dificuldade quanto ao local de onde deve se pronunciar oralmente o Procurador-Geral de Justiça ou seu representante especialmente designado para tal ato, este tomará a tribuna reservada às partes, deixando inalterada a posição do membro do Parquet federal atuante no órgão julgador deste STJ que, por sua vez, estará na qualidade de custos legis. Tal disposição física dos agentes nas sessões do STJ em nada desmerecerá os membros dos Ministério Públicos Estaduais em relação ao federal pois, como sabido, no Tribunal da Cidadania, os Ministros, membros do Ministério Público e advogados, possuem lugares estabelecidos no mesmo patamar de bancadas.

Nessa linha, reconheço a legitimidade do Ministério Público Estadual para atuar perante esta Corte Superior de Justiça, na qualidade de autor da ação, atribuindo efeitos prospectivos à decisão.

Ressalta-se que nas causas em que o Ministério Público Estadual for parte, este deve ser intimado das decisões de seu interesse. ...» (Min. Mauro Campbell Marques).»

Doc. LegJur (128.0785.3000.2400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Recurso especial (Jurisprudência)
▪ Ministério Público (Jurisprudência)
▪ Ministério Público Estadual (Jurisprudência)
▪ Legitimidade recursal (v. ▪ Ministério Público Estadual) (Jurisprudência)
▪ Direito de ação (v. ▪ Ministério Público) (Jurisprudência)
▪ CF/88, art. 5º, XXXV
▪ CF/88, art. 105, III
▪ CF/88, art. 127, § 1º
▪ CF/88, art. 128, I e II
▪ CPC, art. 541
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