Jurisprudência em Destaque

STJ. 2ª T. Administrativo. Ação civil. Improbidade administrativa. Prova testemunhal. Ausência de intimação do réu para audiência de oitiva de testemunha. Colisão entre princípios, contraditório, ampla defesa, economia processual e instrumentalidade das formas. Sopesamento. Prova não essencial. Fato incontroverso. Nulidade. Ausência de prejuízo. Pas de nullité sans grief. Considerações do Min. Humberto Martins sobre o tema. Lei 8.429/1992. CPC, arts. 242, § 2º, 249, § 1º e 331. CF/88, art. 5º, LV.

Postado por Emilio Sabatovski em 08/05/2012
«... Alega o recorrente que o acórdão violou os arts. 242, § 2º, e 331 do CPC.

Em suas razões, aduz que os princípios do contraditório e o da ampla defesa foram inobservados quando o juiz de primeira instância não procedeu à intimação do réu para a audiência de oitiva de testemunha.

Afirma também que «a não observância do que dispõe o referido art. 331 do Código de Processo Civil, representou um grande prejuízo para o Recorrente, que assim ficou impedido de se manifestar a respeito da produção de provas importantes para o deslinde da presente lide. Tal situação constitui, a par do que dispõe a Constituição Federal, violação ao princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa» (fl. 1.041-e).

Conclui dizendo que «o despacho de fls. 436, não cumpriu os objetivos delineados pelo legislador no artigo 331 do Código de Processo Civil, eis que se limitou a designar audiência de instrução e julgamento e fixar prazo para apresentar rol de testemunhas» (fl. 1.042-e).

O Tribunal de origem, ao apreciar essas questões, entendeu que:


«Examinando detidamente os autos, verifica-se que a correta exegese acerca da identificação de eventual cerceamento do direito de defesa tem por base o cotejo entre o que restou decidido, à luz do acervo probatório, e a pretensão da parte no desempenho da tarefa de comprovar suas afirmações.


A oitiva da testemunha Marli Ferreira Chaves (termo à fl. 563) inobservou a intimação do apelante para que dela pudesse participar. Seja por que motivo for, o ato de cientificação não foi produzido.


Todavia, verifica-se que como elemento de prova, o depoimento questionado não foi o sustentáculo da sentença para apreciar o pedido inicial, tanto que ali há menção expressa aos documentos colacionados, conforme se vê à fl. 623: ...A prova documental e testemunhal dá conta de que, realmente, a funcionária Marly Ferreira Chaves não prestou de fato seus serviços ao gabinete do requerido, a partir do mês de maio de 2001. (Sic).


Ainda que se alijasse referido depoimento sobejam os fundamentos pelos quais foi amostrado o convencimento norteador do decisum fustigado, isto sobretudo se consideradas as afirmações do apelado (desde a sua manifestação preliminar) que, em momento algum, refutou ou contradisse o fato de Marli, mesmo vinculada a seu gabinete com dispêndio de salário pelo cofre municipal, ter se mudado para a Espanha.


Isto é incontroverso e, como se sabe, desnecessita ser comprovado.


...


Não se detecta, assim, mácula ao princípio do devido processo legal, desdobrado nos postulados do contraditório e da ampla defesa, vez que o recorrido não teve relegado seu direito à produção de provas, nem mesmo viu-se impedido da possibilidade de acesso às mesmas, tudo com fincas a todos os atos instrutórios e à fundamentação lançada na sentença.


A propósito, a jurisprudência, de modo unívoco, acena no sentido de inexistir cerceamento do direito de defesa quando, ainda que a parte seja obstada de produzir a prova pretendida, haja substrato probante suficiente a embasar convencimento. Então, este o ponto primordial a ser observado.


Desse modo, afasta-se a preliminar de cerceamento do direito de defesa a fulminar a sentença, uma vez que a oitiva da testemunha objeto da alegada nulidade não se constituiu em elemento fundamental de convicção, que se prendeu aos demais elementos probatórios, aliás sobejantes, ao proceder o pedido inicial.» (fls. 992/994-e, grifou-se.)

Conforme se observa no trecho transcrito, a situação fática cristalizada pela instância ordinária sinaliza que o recorrente não foi intimado quando da audiência da testemunha Marli Ferreira Chaves.

Essa situação, sem muito esforço para se constatar, demonstra uma anomalia no procedimento adotado pelo juízo processante, o que, à primeira vista, sugere a necessidade de se anular todo o processo por cerceamento do direito de defesa.

Todavia, a decretação das nulidades não pode ser automática.

Explica-se o porquê.

Não apenas o Direito Constitucional mas também o Processual Civil recebe a influência cada vez maior da ideologia pós-positivista, segundo a qual, em razão da hegemonia axiológica dos princípios, estes se convertem em alicerce de todo sistema normativo e, assim como as regras, podem disciplinar situações concretas e impor obrigação legal.

Na obra «Teoria dos Direitos Fundamentais», o jurista alemão Robert Alexy esclarece que a diferença primordial entre princípios e regras, da qual decorrem todas as outras, é que esses contém um mandamento de otimização. Isso quer dizer que é intrínseco a um princípio o comando de se aplicar no maior número de casos possíveis.

Em decorrência desse mandamento de otimização, os princípios estão sujeitos a constantes colisões. Não é raro, ao aplicador do Direito, se deparar com situações nas quais dois ou mais princípios incidam sobre um mesmo caso concreto e que, se aplicados em conjunto, levariam a resultados inconciliáveis, a juízos concreto de dever-ser jurídico contraditórios.

Diferente das regras - em que eventuais conflitos são apenas aparentes, pois ou há uma cláusula de exceção entre elas, ou uma deverá ser declarada inválida - na tensão entre princípios um deles terá que ceder, sem que isso implique na perda da sua validade.

Segundo Alexy:


«Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta. Isso é que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com maior peso têm precedência. Conflito entre regras ocorrem na dimensão da validade, enquanto as colisões entre princípios - visto que só princípios válidos podem colidir - ocorrem, para além dessa dimensão, na dimensão do peso.»

(ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais, Ed. Malheiros, São Paulo, 2008, p. 93.)

Portanto, em uma colisão entre princípios, não há uma relação de precedência absoluta. A preponderância de um sobre o outro dependerá do caso concreto, que, em razão das específicas condições, revelará qual princípio tem mais peso e por tal motivo deve prevalecer.

No Direito Processual, cada vez mais banhado pela filosofia pós-positivista, é possível observar, pelo menos no que interessa ao caso dos autos, a existência de princípios que, analisados isoladamente, poderiam indicar uma colisão, pois conduzem a resultados contraditório.

De um lado, e aí está o cerne das razões do recorrente, encontra-se a incidência dos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, do respeito à forma e ao contraditório, e, de outro, nos termos do fundamento do acórdão recorrido, os princípios da economia processual e da instrumentalidade das formas.

Como ocorre em todo caso em que há uma colisão entre princípios, a solução deste imbróglio passará, necessariamente, pelo sopesamento, ou seja, pena análise das condições específicas do caso concreto que levam um princípio a ter mais prevalência sobre o outro.

Há, no caso dos autos, uma flagrante irregularidade processual consistente na ausência de intimação do ora recorrente para acompanhar a audiência da testemunha Marli Ferreira Chaves. Esse fato, analisado isoladamente, representa uma ofensa ao contraditório e ao devido processo legal, motivo pelo qual a primeira solução que se poderia pensar seria a anulação do processo desde a ocorrência na anomalia.

Contudo, há especificidades que não recomendam esse desfecho. Conforme explicitado pelo Tribunal de origem:

a) o depoimento da referida testemunha não foi sustentáculo da sentença para apreciar o pedido inicial;

b) em momento algum, desde a manifestação preliminar, o acusado refutou ou contradisse o fato sobre o qual a testemunha depôs, qual seja, o de que ela estava vinculada ao gabinete do réu, recebendo salários do cofre municipal, ao tempo em que morava na Espanha.

Portanto, o que se observa é que a irregularidade da ausência de intimação do acusado não lhe trouxe prejuízo, seja porque a prova produzida sem o contraditório não foi determinante na fundamentação da sentença, seja porque o fato sobre o qual a testemunha foi interrogada era incontroverso ante a ausência de impugnação do réu.

Tais circunstâncias elevam o peso dos princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, já que, em que pese a ausência de intimação do acusado para exercer o contraditório na oitiva da testemunha, tal vício não lhe acarretou prejuízo.

Aplica-se, in casu, o princípio do «pas de nulitté sans grief», segundo o qual não há nulidade sem prejuízo, ou seja, não se declarará nulo nenhum ato processual quando este não causar prejuízo, nem houver influído na decisão da causa ou na apuração da verdade real.

Ante o exposto, rejeito a preliminar de nulidade processual decorrente do cerceamento de defesa. ...» (Min. Humberto Martins).»

Doc. LegJur (123.0700.2000.5000) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Administrativo (Jurisprudência)
Ação civil (v. Improbidade administrativa ) (Jurisprudência)
Improbidade administrativa (Jurisprudência)
Prova testemunhal (Jurisprudência)
Intimação (Jurisprudência)
Intimação do réu (v. Prova testemunhal ) (Jurisprudência)
Audiência de oitiva de testemunha (v. Prova testemunhal ) (Jurisprudência)
Colisão entre princípios (v. Defesa ) (Jurisprudência)
Contraditório (Jurisprudência)
Defesa (Jurisprudência)
ampla defesa (v. Defesa ) (Jurisprudência)
Economia processual (Jurisprudência)
Instrumentalidade das formas (Jurisprudência)
Prova não essencial (v. Nuldiade ) (Jurisprudência)
Fato incontroverso (v. Nulidade ) (Jurisprudência)
Nulidade (Jurisprudência)
Ausência de prejuízo (v. Nulidade ) (Jurisprudência)
Prejuízo (v. Nulidade ) (Jurisprudência)
Pas de nullité sans grief (v. Nulidade ) (Jurisprudência)
(Legislação)
CPC, art. 242, § 2º
CPC, art. 249, § 1º
CPC, art. 331
CF/88, art. 5º, LV.
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