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TST. SDI-I. Responsabilidade civil. Dano moral e dano material. Empregado. Acidente de trabalho. Recurso de revista. Recurso de embargos. Indenização por danos morais e materiais. Morte do empregado. Meio ambiente de trabalho. Responsabilidade do empregador. Princípio da precaução. Verba fixada em R$ 50,000,00 para cada genitor e pensão mensal de 2/3 do piso da categoria profissional do trabalhador. Considerações do Min. Aloysio Corrêa da Veiga sobre o tema. CF/88, art. 5º, V e X. CCB/2002, arts. 186, 927 e 932.

Postado por Emilio Sabatovski em 18/01/2013
«... De início, por relevante, é de se destacar que no presente caso o acidente de trabalho não decorre da atividade do reclamante na empresa, mas em conseqüência do trabalho que estava sendo executado por outro empregado, que efetuou manobra de marcha-ré à noite, vindo a atingir o autor, jovem de 18 anos, recém-contratado, que exercia a atividade de bituqueiro (empregado que recolhe a cana cortada), mas que se encontra dormindo no meio da cana cortada, em local sem iluminação, com muita poeira, vindo a falecer em razão do atropelamento.

Antes de adentrar no exame do tema, é necessário atentar para a tese contida na decisão da c. Turma que entende que a responsabilidade do empregador no ambiente de trabalho não decorre mais de culpa presumida e sim da responsabilidade objetiva a que se refere o art. 927, parágrafo único, da CLT, que dispõe:


«Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.»

Embora na doutrina clássica seja indispensável a culpa para que se reconheça a obrigação de reparar o dano, os estudiosos da matéria atualmente trazem um novo olhar para o tema, como alude Caio Mario quando alerta que a culpa como fundamento da responsabilidade civil, é insuficiente, sendo que o fundamento da teoria objetiva é mais humano do que a culpa, já que reparte com maior eqüidade, os efeitos dos danos sofridos.

No caso em exame, todavia, não é o foco do debate a existência de atividade de risco, na medida em que o autor estava em situação peculiar, descansando, e o trabalho efetuado pelo motorista que veio a atropelar o empregado também não equivale a atividade de risco. O que aconteceu, na realidade, foi uma fatalidade que veio a atingir um jovem trabalhador que, por mais provável, em razão de uma atividade estafante, deitou-se em local inadequado para descansar.

É fato incontroverso que empregado «bituqueiro» é aquele responsável por coletar as canas que a máquina deixa de colocar no caminhão.

O princípio da culpa em sua modalidade subjetiva, ainda se traduz numa melhor saída para que o ambiente de trabalho seguro, obrigação da empresa, torne-se cada vez melhor fiscalizado, com o fim de reduzir o número de acidentes de trabalho hoje existente.

Nesse sentido é que o empregador que zela pelo ambiente de trabalho seguro não terá o mesmo tratamento daquele negligente, descuidado, na reparação do dano por acidente de trabalho. Nesse sentido a c. Turma reforçou o fato de que houve culpa concorrente, em razão da conduta verificada no presente caso, em que o acidente se deu em razão do trabalho de outro empregado da empresa, o motorista que deu a ré no veículo que atropelou o autor.

Isso porque não apenas a empresa, como também o trabalhador, devem estar atentos com o cumprimento das regras de segurança, ainda que seja de responsabilidade do empregador a fiscalização do ambiente de trabalho. Se havia norma prevendo que era proibido se deitar no meio da cana cortada, e o empregado não observou a norma, a responsabilidade deve ser dividida, eis que se infere conduta que também se encaixa em culpa por imprudência, a denotar a existência de culpa concorrente entre autor e réu.

O artigo 186 do atual Código Civil, anterior 159 do CC de 1916, consagra a regra geral da responsabilidade civil que assim dispõe, verbis:


Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Com efeito, a responsabilidade sem culpa stricto sensu traz como elemento o desenvolvimento de atividade de risco, que permite uma previsão genérica da responsabilidade.

A teoria do risco profissional considera que o dever de indenizar decorre da própria atividade profissional, sendo que o seu desenvolvimento está diretamente ligado aos acidentes do trabalho. São as hipóteses em que a atividade desenvolvida pelo empregado constitui-se em risco acentuado ou excepcional pela natureza perigosa, de modo que a responsabilidade incide automaticamente. Assim, a obrigação de indenizar por ocorrência de acidente de trabalho subsiste em casos em que não são procedidas as medidas com o fim de possibilitar um ambiente de trabalho saudável, ergonômico.

É preciso saber, portanto, se existe a responsabilidade objetiva em termos do dano causado por acidente de trabalho ou se tal responsabilidade é apenas subjetiva, diante da expressa disposição constitucional trazida.

Embora o art. 927, parágrafo único, traga a obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, resta especificado na norma que tal ocorrerá nos casos especificados em lei ou quando a atividade implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

O risco, por óbvio, diz respeito à saúde e à higidez física do trabalhador, a denotar que a norma deixou ao julgador a tarefa de dirimir o que pode ser reconhecido por atividade de risco.

De todo modo, além de se perguntar se o dano está vinculado à atividade do autor, também deverá o julgador indagar se o risco é decorrente do trabalho exercido na empresa.

O exercício de atividade de risco, no presente caso, não resta demonstrado, como já dito, diante da peculiaridade do acidente que veio a vitimar o empregado.

A teoria do risco profissional delimita que o dano a ser reparado advém da execução do contrato, e está fundada na teoria do risco proveito, traduzindo-se do brocardo: ubi emolumentum, ibi onus, cujo conceito se extrai da doutrina de Serpa Lopes:


Risco-proveito. É uma corrente fundada no princípio ubi emolumentum ibi onus. Consideram os seus partidários nada haver de mais justo do que aquele que obtém o proveito de uma empresa, o patrão se onerar com a obrigação de indenizar os que forem vítimas de acidentes durante o trabalho. O patrão, ao celebrar o contrato de trabalho, pode já incluir nas suas estimativas a provável responsabilidade por qualquer acidente que o seu operário possa sofrer, durante horas de serviço. Trata-se de uma concepção hoje considerada e prevista no Direito positivo. (in Curso de Direito civil – Fontes contratuais das obrigações. Vol. V. 4ª Ed. – Ed. Rio de Janeiro. Pag. 171)

Aqui também se alude à teoria do risco da atividade econômica, por força do art. 2º da CLT, que se extrai a responsabilidade do empregador, pois é do trabalho e do risco a ele inerente que o empregado se coloca na situação de sofrer danos.

Incumbe destacar, ainda, que o Código Civil determina a responsabilidade da empresa por danos causados por seus empregados, seus prepostos, quando se determina:


Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:


«o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.»

Nesse sentido é que se entende que, independentemente de culpa do empregador, é sua a responsabilidade, vale dizer: independentemente de culpa não significa dizer ausência de culpa. Ela, nessas atividades se presume. Apenas não se indaga a culpa.

Essa é a primeira questão que se impõe a ser resolvida, de não ser possível a responsabilidade objetiva, já que a norma que determina a responsabilidade do empregador é constitucional – art. 7º, XXVIII e não impõe senão a responsabilidade por culpa ou dolo.

É certo que a Constituição Federal define a responsabilidade por acidente de trabalho quando o empregador incorrer em dolo ou culpa. Não haveria, em princípio, responsabilidade sem culpa.

Em nenhum momento a regra contida no inciso XXVIII afirmou que haveria a responsabilidade, apenas e tão-somente, houvesse a prova do dolo e da culpa.

O que se pretendeu com relação à tormentosa questão da indenização pelo dano moral foi a de reconhecer a existência da culpa lato sensu, que decorre ipso facto do risco acentuado da atividade, que importa no descuido do empregador, quando não são oferecidos os meios de proteção com relação ao trabalho.

Se, mesmo com todos os meios de proteção, há o infortúnio, é verdade que haveria a responsabilidade diante do risco da atividade e da negligência do empregador com o meio ambiente de trabalho, não do risco da vida. Viver já é um risco. O que não é possível, todavia, é não se admitir a prova em contrário oriunda da presunção de culpa decorrente da atividade de risco.

O caso dos autos vai remeter exatamente para o fato que ocasionou o acidente de trabalho, o descuido com o meio ambiente de trabalho, já que não fosse isso não estaria o trabalhador descansando em local inadequado.

Cabe aqui ressaltar as condições rústicas do ambiente onde o autor trabalhava (canavial) e as adversidades do ambiente de trabalho, do momento do acidente (madrugada) e da falta de fiscalização durante a atividade do motorista do veículo e mesmo de o empregador não ter conhecimento de que o empregado dormia no local em que se realizavam manobras. A vítima sofreu acidente do trabalho quando descansava, de madrugada, no meio do canavial, deitado sobre a cana-de-açúcar cortada. Um caminhão, responsável pelo transporte da cana, manobrou no meio da lavoura cortada, em marcha à ré, e o atingiu, provocando escoriações na cabeça e, em seguida, sua morte.

Nesse sentido, deve ser mantida a decisão da c. Turma porque se verifica no caso em exame a existência de culpa, de todo presumida, por omissão e negligência, que deve ser apreciada em cada caso concreto com o fim de agregar o terceiro elemento a determinar a reparação do dano moral, a culpa, já que a Corte a quo concluiu pela sua ausência.

A culpa tem em seu elemento não apenas a culpa em si mesma, como também o dolo. Enquanto que do dolo não se afasta a intenção, a culpa decorre dos três elementos que lhe integram: negligência, imprudência ou imperícia.

Neste contexto, as atividades desenvolvidas pelo empregador que tragam riscos físicos ou psicológicos aos seus empregados, ainda que potenciais, impõem-lhe o dever de preveni-los. Sua abstenção ou omissão acarreta o reconhecimento da responsabilidade subjetiva pelos eventos danosos que porventura venham a ocorrer.

As atuais preocupações reveladas pela sociedade, no que tange às questões correlatas ao meio ambiente, às condições de trabalho, à responsabilidade social, aos valores éticos e morais, bem como a dignidade da pessoa humana, exigem do empregador estrita observância do princípio da precaução.

Este princípio informa que quando houver ameaça de danos ao meio ambiente seguro e sadio do trabalho, a ausência de absoluta certeza não deve ser utilizada como meio para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir o dano. Mister, portanto, a adoção de critérios de prudência e vigilância a fim de evitar o dano, ainda que potencial, notadamente quando se observa as adversidades do ambiente em que o reclamante laborava.

Trata-se de uma obrigação de resultado: a prevenção em matéria de saúde e segurança no trabalho exige do empregador o dever de antecipar e avaliar os riscos de sua atividade empresarial e a efetivação das medidas de precaução necessárias. O princípio da precaução deve ser aplicado no interesse do trabalhador.

Infere-se do v. julgado regional que restou comprovado o nexo de causalidade entre a atividade desenvolvida e o resultado danoso de que é vítima o trabalhador.

Do v. acórdão embargado, prolatado pela C. 3ª Turma, constata-se que o trabalhador era inexperiente e que tinha apenas 18 anos de idade à data do óbito. Além de se tratar de local de difícil acesso, com baixa visibilidade, é de se destacar que a luz de ré do caminhão estava em perfeito funcionamento, que foram designados dois «bituqueiros» para acompanhar e orientar a vítima, tendo esta sido avisada sobre o fato de que não poderia descansar no meio do canavial, sobre a cana-de-açúcar cortada.

Ressalte-se, ainda, que as reclamadas forneceram ao trabalhador acidentado equipamentos de segurança, em especial camisa na cor verde, com faixas de sinalização refletivas e que ministraram treinamento a todos os empregados quando da contratação, tendo eles sido alertados a não dormirem na lavoura, principalmente sobre a cana-de-açúcar. Também é de se ver que a empresa foi acionada imediatamente pelo fiscal de frente, que comunicou o acidente e verificou que o empregado já estava sem vida, em local de difícil acesso, distante cerca de 20 km da cidade de Estiva Gerbi.

Ainda assim, é de todo inviável se atribuir culpa exclusiva ao empregado que, mesmo treinado, com equipamento de proteção, ainda assim sofre acidente durante a atividade, já que a ilação lógica é de que se sua atividade demanda descanso, deve ser atribuído um local seguro para esse momento de pausa e incumbe ao empregador zelar para a segurança nesse ambiente.

Isso porque, ainda que não vítima de atropelamento, mas sim, por hipótese de uma mordida de animal peçonhento, a morte durante a jornada de trabalho estaria, ainda assim, vinculada a conduta ilícita do empregador que se descuidou da proteção do empregado durante a jornada de trabalho.

É de se destacar a disposição contida no art. 1383 do CC francês: «Chacun est responsable Du dommage qu´il a causé non seulement par son fait, mais encore par sa négligence ou par son imprudence» («cada um é responsável pelo dano que provocou não somente por sua culpa, mas ainda por sua negligência ou por sua imprudência») .

Diante desses fundamentos, não há como afastar a responsabilidade da empresa, porque demonstrada negligência do empregador com o ambiente de trabalho, em que se colocou em risco a integridade física do empregado, a determinar a indenização, conforme bem elucidou a c. Turma.

Por essas razões, nego provimento aos embargos. ...» (Min. Aloysio Corrêa da Veiga).»

Doc. LegJur (130.3490.6000.0200) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Responsabilidade civil (Jurisprudência)
▪ Dano moral (Jurisprudência)
▪ Empregado (v. ▪ Dano moral) (Jurisprudência)
▪ Acidente de trabalho (v. ▪ Empregado) (Jurisprudência)
▪ Recurso de revista (Jurisprudência)
▪ Recurso de embargos (v. ▪ Recurso de revista) (Jurisprudência)
▪ Indenização por danos morais e materiais (v. ▪ Dano moral) (Jurisprudência)
▪ Morte do empregado (v. ▪ Dano moral) (Jurisprudência)
▪ Meio ambiente de trabalho (v. ▪ Dano moral) (Jurisprudência)
▪ Responsabilidade do empregador (v. ▪ Acidente de trabalho) (Jurisprudência)
▪ Princípio da precaução (v. ▪ Acidente de trabalho) (Jurisprudência)
▪ CF/88, art. 5º, V e X
▪ CCB/2002, art. 186
▪ CCB/2002, art. 927
▪ CCB/2002, art. 932
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