Jurisprudência em Destaque

STJ. 6ª T. «Habeas corpus». Prova testemunhal. Nulidade. Oitiva de testemunha. Ofensa à ordem estabelecida no art. 212 do CPP. Inversão. Precedentes do STJ. Considerações do Min. Sebastião Reis Júnior sobre o tema. CPP, arts. 563 e 647. CF/88, art. 5º, LXVIII.

Postado por Emilio Sabatovski em 20/12/2012
«... O eminente Relator denegou a ordem por entender que eventual desobediência à ordem imposta pelo art. 212 do Código de Processo Penal caracteriza nulidade relativa, cuja declaração está condicionada à demonstração de efetivo prejuízo, o que não teria ocorrido na espécie.

É certo que, como ressaltou o eminente Relator, firmou-se o entendimento, aqui e no Supremo Tribunal Federal, de que a inversão da ordem de perguntas estipulada pelo art. 212 do Código de Processo Penal constitui nulidade relativa, só podendo viciar o feito quando e se suscitada a tempo e caso demonstrado efetivo prejuízo.

Quanto à questão da nulidade relativa, Ada Pellegrini, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes ensinam-nos que a decretação da nulidade implica perda da atividade processual já relacionada, transtornos ao juiz e às partes e demora na prestação jurisdicional almejada, não sendo razoável desta forma, que a simples possibilidade de prejuízo dê lugar a aplicação da sanção: o dano deve ser concreto e efetivamente demonstrado em cada situação. Isso não significa que em todos os casos se exija a produção de prova da ocorrência do prejuízo; normalmente essa demonstração se faz através de simples procedimento lógico, verificando-se se a perda da faculdade processual conferida à parte ou o comprometimento dos elementos colocados à disposição do juiz no momento da sentença tiveram influência no resultado final do processo. [...] Já com relação às nulidades relativas, o prejuízo sempre deverá ser demonstrado, jamais sendo evidente, pois o prejuízo não é constatado desde logo, como pode ocorrer nas nulidades absolutas, em razão do que se exige alegação e demonstração do dano pelo interessado no reconhecimento do vício (in As nulidades no processo penal. 12ª ed., RT, págs. 28/29).

No caso concreto, a defesa técnica, no momento oportuno, como consignado na ata (fl. 801), suscitou o vício:


A pedido da Defesa, também, fica consignado o protesto quanto ao fato de a Magistrada ter iniciado a inquirição perguntando às testemunhas, invertendo, no entender da Defesa, a ordem estabelecida legalmente (art. 212 do CPP).

Quanto ao eventual prejuízo, entendo, ao contrário do eminente Relator, que a questão foi, sim, indicada por ocasião da impetração, mesmo tendo a impetração sustentado a nulidade absoluta (fls. 756/766):


[...]


Assim, foi sustentado no Recurso Especial, violação aos artigos 212 e 413 do Código de Processo Penal, tendo sido admitida a inconformidade em relação ao primeiro argumento, já que a Magistrada formulou perguntas em primeiro lugar para as testemunhas, causando prejuízo para a defesa, pois dirigiu a instrução nos pontos de interesse da acusação.


[...]


Conforme demonstrado, a Magistrada de Alegrete, na audiência de instrução, inverteu a ordem das perguntas, afrontando o artigo 212 do Código de Processo Penal, em manifesto comprometimento da sagrada imparcialidade que deve reinar no processo, mas antes disto, da devida legalidade processual no atinente às formas.


No depoimento das testemunhas, observa-se que o Juízo formulou antecipadamente as perguntas, fazendo aquelas pertinentes à busca da versão acusatória, em manifesta inversão das fórmulas processuais.


Veja Excelência que:


- no depoimento de Paula Pianesso, a digna Juíza iniciou perguntando várias questões sobre o processo. Posteriormente, o Ministério Público fez seus questionamentos.


- já no depoimento de Luiza Pianesso, a Magistrada iniciou questionando, passou a palavra ao MP e, quando chegado o momento da Defesa, não só possibilitou que o MP fizesse novos questionamentos, como também renovou questões já postas.


- o prejuízo decorrente da inversão da ordem nas perguntas aparece claro na tomada de depoimento de LEONARDO GONÇALVES PINHEIRO, quando a Magistrada deixa de fazer perguntas, ou seja, escolhe aquelas pessoas que lhe interessam, as da acusação, e deixa de perguntar quando a pessoa (efetivamente) não lhe interessa.


Na ata da única audiência realizada, na Comarca de Alegrete, consta claramente a opção da Magistrada pelas pessoas que acusam o réu.


Com relação à mãe da vítima, Genides Terezinha Pianesso (fls. 756/771), a Juíza fez OITENTA perguntas iniciais à testemunha, a maioria de viés nitidamente acusatório (fls. 756/766):


[...]


Após a inquirição inicial, consistente nas oitenta perguntas, a Juíza passa a palavra ao Ministério Público que faz uma pergunta e a Magistrada interfere e passa a perguntar novamente. A acusação volta a perguntar, faz uma pergunta e a juíza pergunta novamente e assim ocorre durante toda a inquirição da testemunha.


[...]


No depoimento da Luiza Pianesso Rodrigues, - filha da vítima (fls. 772/778), a Juíza realiza DEZOITO perguntas iniciais. Passada a palavra ao Ministério Público e à Defesa, a juíza volta a questionar a testemunha sobre ponto fundamental da acusação:


[....]


E, igualmente, no depoimento da outra filha da vítima, Paula Pianessa (fls. 779/785), a Magistrada inicia questionando a testemunha com TRINTA E TRÊS perguntas:


[...]


Quando, por outro lado, o filho do acusado vai prestar seu depoimento, surpreendentemente, a Magistrada não faz qualquer pergunta, passando a palavra diretamente para a defesa:


[...]


O prejuízo é inequívoco, já que houve a pronúncia do acusado em razão de graves delitos, baseado exclusivamente nos depoimentos das testemunhas de acusação, ouvidas com total comprometimento da fórmula legal. Ademais, em se tratando da violação de norma de ordem pública, que estabelece uma garantia ao acusado, a nulidade é absoluta, razão pela qual sequer se tornaria necessário demonstrar o evidente prejuízo.

E parece-me, com vênia daqueles que pensam em contrário, que, efetivamente, o prejuízo ocorreu. Segundo Eugênio Pacelli de Oliveira e Douglas Fischer, a intenção do legislador em alterar o sistema de inquirição foi o de consolidar um novo modelo processual com feições acusatórias, com o distanciamento do juiz do papel de protagonista da prova (in Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência, Lumen Juris, 2ª ed., pág. 458)

No caso, entendo que não ocorreu simplesmente uma inversão na ordem de inquirição das testemunhas. Aconteceu, sim, como bem descrito na inicial, o protagonismo da instrução por parte da Juíza do feito, que inquiriu e reinquiriu exaustivamente algumas das testemunhas de acusação, chegando, em alguns casos, a fazer oitenta perguntas, e se silenciou quanto a algumas das testemunhas de defesa. A impressão que se tem da simples leitura da ata é que a douta Juíza fez, sim, as vezes do órgão acusador, tomando toda a iniciativa de produzir as provas que viessem a demonstrar a culpa do paciente.

Ou seja, as condições para caracterizar a nulidade alegada encontram-se presentes no caso concreto. Aqui, houve não só a impugnação no momento oportuno, como a demonstração, dentro do possível, do prejuízo sofrido.

Vale transcrever lição do Ministro Cezar Peluso manifestada por ocasião da análise de vício de julgamento em processo de natureza penal (inversão da ordem de sustentação oral), quando, sobre a necessidade de demonstração de prejuízo, disse que:


[...]


Alegou-se - e, em casos análogos, se alega sempre - não ter sido demonstrado o prejuízo da defesa. Mas o dano, esse resulta do teor mesmo do julgamento contrário ao réu e, como tal, é certo e induvidoso. Tenho relevado este fato intransponível. O prejuízo da defesa, em casos semelhantes, é sempre certo. Presumida é apenas a relação jurídico-causal entre o vício do processo e o teor do julgamento. E tal relação não pode deixar de presumir-se ante a impossibilidade absoluta de se atribuir o resultado injurioso ao réu a causa independente.


Só se poderia, deveras, afastar, quando menos, esse nexo entre o defeito processual e a certeza do prejuízo da defesa, se o resultado concreto do julgamento, caso em que qualquer recurso seria absolutamente anódino e infrutífero, lhe tivesse sido favorável. Todas as vezes em que, sob argüição de vício processual na sessão de julgamento ou na decisão, a defesa saia de algum modo prejudicada, não é lícito opor argumentação baseada na hipótese de que, fosse outro o procedimento adotado, segundo a lei, o resultado teria sido o mesmo. É simplesmente impossível saber como se comportariam os julgadores, ou o prolator da decisão, se houvera sido observada a ordem legal do processo garantido pela Constituição!


Noutras palavras, não há como nem por onde argumentar com o fato de que a defesa não seria capaz de demonstrar outro prejuízo, senão com o resultado danoso no caso concreto, porque não se pode predizer, ou melhor, não se pode adivinhar que, se tivesse sido outra a ordem observada, o resultado do julgamento teria sido o mesmo.


Por isso, esta Corte, não poucas vezes, aludiu à impossibilidade de o réu provar prejuízo, que eu nem diria mais concreto, porque não há nada mais concreto que ato de todo em todo contrário aos interesses da defesa, como é o juízo condenatório.


(HC 87.926/SP, DJe 24/4/2008)

Assim, entendo que houve, no caso concreto, desobediência ao disposto no art. 212 do Código de Processo Penal, sendo que tal desrespeito foi suscitado no momento oportuno pela parte interessada, além de ter causado prejuízo a essa parte. A nulidade, mesmo relativa, deve ser reconhecida.

Por isso, pedindo vênia ao eminente Relator e a quem pensa de modo contrário, concedo a ordem reclamada neste particular, para anular o processo desde a audiência de instrução do dia 18/5/2009, bem como todos os atos posteriores, determinando que nova audiência seja feita, obedecendo-se ao disposto no art. 212 do Código de Processo Penal. ...» (Min. Sebastião Reis Júnior).»

Doc. LegJur (128.4474.3000.0400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ «Habeas corpus» (Jurisprudência)
▪ Prova testemunhal (Jurisprudência)
▪ Nulidade (v. ▪ Prova testemunhal) (Jurisprudência)
▪ Oitiva de testemunha (v. ▪ Prova testemunhal) (Jurisprudência)
▪ CPP, art. 212
▪ CPP, art. 563
▪ CPP, art. 647
▪ CF/88, art. 5º, LXVIII
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