Jurisprudência em Destaque

STJ. 5ª T. Homicídio culposo. Pena. Aumento da pena. Circunstância especial. Profissão. Médico. Erro médico. Negligência médica. Trabalho de parto. Falta de acompanhamento médico. Considerações do Min. Campos Marques sobre o tema. CP, art. 121, § 4º, 1ª parte.

Postado por Emilio Sabatovski em 02/09/2013
«... No tocante ao cerne da postulação, há que se observar, de pronto, os termos do respectivo dispositivo - art. 121, § 4º, do Código Penal -, que estabelece que, «no homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício», e do qual se extrai, tenho para mim, ao utilizar a expressão «se resulta», no singular, «da inobservância de regra técnica de profissão», que está se referindo, sem qualquer observação, à circunstância que deu causa ao resultado, de modo que é possível concluir que o legislador, com tal mandamento, pretendeu apenar mais severamente o profissional que, embora tenha o cabedal necessário de conhecimentos para o exercício de sua ocupação, não o empregou adequadamente, produzindo o evento criminoso.

Não é outro, aliás, o esclarecimento observado na Exposição de Motivos do Código Penal, em que, com um exemplo, fica claro que se pretendeu impor um acréscimo na reprimenda, em decorrência de o agente ser um profissional no ramo do qual resultou a morte, pois fez constar que, «com estes dispositivos, o projeto visa, principalmente, a condução de automóveis, que constitui, na atualidade, devido a um generalizado descaso pelas cautelas técnicas (notadamente quanto à velocidade), uma causa frequente de eventos lesivos contra a pessoa".

Ora, se referiu à velocidade, que importa, de regra, em imprudência, e da qual, quase sempre, «resulta o crime» de homicídio ou lesão corporal culposa, sem fazer qualquer distinção em exigir uma outra circunstância, me parece claro que desejou estabelecer, como já disse, um maior apenamento àquele que, tendo conhecimento da profissão, a desconsidera, dando causa ao resultado por imprudência ou negligência.

A lição do insuperável Nelson Hungria não reclama, por igual, outra condição para a aplicação da hipótese, pois diz que «a inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, que importa agravação especial, não se confunde com a imperícia, que é uma das modalidades da culpa», com a complementação de que «na imperícia, o agente não tem conhecimentos técnicos; na agravante, ao contrário, o agente tem esses conhecimentos, mas deixa de empregá-los, por indiferença ou leviandade.» (in Comentários ao Código Penal, Editora Forense, volume V, 6ª edição, página 192).

Elucidativo, por igual, o escólio de Heleno Cláudio Fragoso, ao ensinar que «a agravação surge através de um plus de culpabilidade» e que «só se aplica quando se trata de um profissional, pois somente em tal caso se acresce a medida do dever de cuidado e a reprovabilidade da falta de atenção, diligência ou cautela exigíveis."

Para ilustrar, o grande e saudoso mestre exemplifica que, «se alguém constrói um muro divisório de seu terreno e se tal muro vem a ruir causando a morte, por ter sido edificado com a inobservância de regras técnicas, parece evidente que uma culpa agravada só poderia ter um técnico na construção de muros», e arremata que, «quem, não sendo técnico, se lançasse à construção de um muro, seria apenas culpado da imprudência elementar ao crime culposo."

Ao referir, então, nesta última situação, de que o agente «seria apenas culpado da imprudência elementar ao crime culposo», deixa bem claro que, em se tratando de um profissional, tal modalidade de culpa mereceria o acréscimo ora em análise.

Mas, continuando, Fragoso ainda esclarece que, «a maior responsabilidade surge somente pelos acrescidos deveres que tem o profissional» (grifei), e completa, para não deixar dúvidas, que, «se o muro for construído por um profissional, com inobservância dos deveres de seu ofício, a censurabilidade será bem maior, porque o profissional está adstrito a mais graves responsabilidades.» (in Lições de Direito Penal, Editora Forense, Parte Especial, volume I, 10ª edição, páginas 78/79).

Damásio de Jesus, por sua vez, leciona que, «a qualificadora só é aplicável a profissional, uma vez que somente nessa hipótese é maior o cuidado objetivo necessário, mostrando-se mais grave o seu descumprimento» e que, «quando se trata, por exemplo, de amador, o grau de censurabilidade da inobservância do dever de cuidado não vai além do que normalmente se exige para a existência do crime culposo», com a conclusão de que «a incidência da qualificadora significaria aplicar pena e agravá-la diante da mesma circunstância.» (grifei, in Direito Penal, Editora Saraiva, 2º Volume, 32ª edição, página 116).

Da jurisprudência, a propósito, é de se destacar a posição adotada pelo Ministro Gilmar Mendes, no Habeas Corpus 86.969-6, que, no corpo do acórdão, ao tratar especificamente do assunto, consignou que:


"É verdade que, em tese e de lege ferenda, poder-se-ia considerar um possível bis in idem na medida em que a «imperícia» - ou seja, no caso, a inobservância de regra técnica da profissão - já estaria contida no próprio tipo penal do homicídio culposo (arts. 121, § 3º c/c 18, II, ambos do Código Penal), mas a questão é que, efetivamente e de lege lata, o legislador instituiu aquele fato - repita-se: a inobservância de regra técnica da profissão, arte ou ofício - como causa específica de aumento de pena para a situação do homicídio culposo (art. 121, § 4º, do CP), afastando assim qualquer consideração de impropriedade na sua incidência para o caso em análise."

Neste Corte Superior, embora existam diversos precedentes em sentido contrário à minha posição, cumpre destacar, no entanto, o que segue:


PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ART. 121, §§ 3º E 4º DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE A IMPERÍCIA, COMO MODALIDADE DE CULPA, E A MAJORANTE RELATIVA À INOBSERVÂNCIA DE REGRA TÉCNICA DE PROFISSÃO, ARTE OU OFÍCIO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA. FALTA DE CUIDADO OBJETIVO DEVIDAMENTE INDICADA NA EXORDIAL.


I - Não é inepta a denúncia que indica precisamente em que consistiu a falta de cuidado objetivo exigível.


II - Tratando-se de atuação de profissionais, no caso anestesistas, a inobservância de regra técnica pertinente ao caso concreto, estando devidamente indicada na exordial, também evidencia que esta é válida.


III - Assim, não há qualquer bis in idem na imputação fática concreta, mormente se a causa de aumento específica (no punctum saliens, a inobservância de regra técnica de profissão) se mostra voltada ao exercício profissional.


IV - Delineada a falta de cuidado objetivo exigível, é desta imputação que o acusado se defende e não da qualificação eventualmente adotada (v.g.: negligência, imprudência e imperícia).


Igual raciocínio diz com a causa especial de aumento de pena.


Habeas corpus denegado, liminar cassada.


(HC 63929 / RJ, 5ª Turma, relator Ministro Felix Fischer, DJe de 09/04/2007).

E mais:


CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO CULPOSO. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 41 DO CPP. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. NÃO CONHECIMENTO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. NÃO CONHECIMENTO. AFRONTA AO ART. 619, CPP. INOCORRÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ANALISADOS NOS LIMITES DOS RECURSO. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA, QUANTO À PENA-BASE NÃO VERIFICADA. CONFUSÃO ENTRE NEGLIGÊNCIA E INOBSERVÂNCIA DE REGRA TÉCNICA. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.


[...]


A negligência, sendo modalidade de culpa e integrante do tipo penal, não se confunde com a inobservância de regra técnica, que, como causa especial de aumento de pena, pertence ao terreno da culpabilidade.


Recurso parcialmente conhecido e desprovido.


(REsp 191911 / SP, 5ª Turma, relator Ministro Gilson Dipp, DJe de 03/06/2002).

  • 191.911/STJ (Homicídio culposo. Profissão. Médico. Atendimento negligente realizado em pronto-socorro de hospital. Culpa. Confusão entre negligência e inobservância de regra técnica. Bis in idem. Não ocorrência. CP, art. 121, § 3º e § 4º).


Por fim, vale consignar que, a prevalecer a posição adotada pelo eminente Ministro relator, a circunstância de especial aumento de pena ora em análise só poderá ser aplicada se o agente, ao cometer a infração, incidir em duas ou mais ações ou omissões imprudentes ou negligentes, uma para configurar a culpa e outra para majorante, o que não é, com todo o respeito, o que diz a lei, que, pela minha leitura, não custa insistir, pretendeu impor um maior grau de reprovabilidade na conduta do profissional que, ao agir de forma culposa, o fez com inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício.

No caso dos autos, a omissão no atendimento à parturiente importou, induvidosamente, no descumprimento de uma importante obrigação do médico e que acabou resultando no crime objeto deste autuado. ...» (Min. Campos Marques).»

Doc. LegJur (134.7424.2000.1100) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Homicídio culposo (Jurisprudência)
▪ Pena (v. ▪ Circunstância especial) (Jurisprudência)
▪ Aumento da pena (v. ▪ Pena) (Jurisprudência)
▪ Circunstância especial (v. ▪ Pena) (Jurisprudência)
▪ Profissão (v. ▪ Pena) (Jurisprudência)
▪ Médico (v. ▪ Pena) (Jurisprudência)
▪ Erro médico (v. ▪ Pena) (Jurisprudência)
▪ Negligência médica (v. ▪ Homicídio culposo) (Jurisprudência)
▪ CP, art. 121, § 4º, 1ª parte
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