Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Seguridade social. Previdência privada. Plano de pecúlio por morte. Natureza do contrato. Seguro de vida. Semelhança. Mora do contratante. Cancelamento automático. Impossibilidade. Ausência de interpelação. Jurisprudência firme da 2ª Seção do STJ. Teoria do adimplemento substancial. Aplicabilidade. Tentativa de purgação da mora antes do fato gerador (sinistro). Recusa da entidade de previdência. Princípio da boa-fé objetiva. Princípio da função social do contrato. Conduta do consumidor pautada na boa-fé. Relevância. Pagamento devido. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre o tema. Lei 6.435/1977, art. 21, § 3º. Lei Compl. 109/2001, art. 73. CCB/2002, arts. 421 e 422. Dec. 81.402/1978

Postado por Emilio Sabatovski em 21/03/2012
... 5. A jurisprudência que exige a interpelação prévia do devedor como condição necessária à resolução do contrato justifica-se até mesmo por outros fundamentos, como a exigência de que os contratantes guardem a mais estreita boa-fé e de que seja analisada a gravidade do inadimplemento em face da parcela das obrigações já cumpridas.

Incide a teoria do adimplemento substancial dos contratos, que visa a impedir o uso imoderado do direito de resolução pelo credor, quando o rompimento do pacto não se ajusta a exigências de índole social ou pautadas pela boa-fé objetiva.

Por essa ótica, a faculdade que o credor tem de simplesmente resolver o contrato, diante do inadimplemento do devedor, deve ser reconhecida com cautela, sobretudo quando evidente o desequilíbrio financeiro entre as partes contratantes, como no caso dos autos.

Assim, deve o julgador ponderar quão grave foi o inadimplemento, a ponto de justificar a resolução da avença.

Como bem assevera Athos Gusmão Carneiro, em um sistema de resolução judiciária dos contratos, a apreciação valorativa do inadimplemento contratual é alicerçada na análise global do contrato inexecutado, inclusive de sua natureza, e na consideração do comportamento total dos contraentes, desde o início da avença. Destarte, ante eventual adimplemento limitado ou inexato, a decisão judicial, ou pela resolução da avença ou pela simples condenação em perdas e danos, dependerá de uma avaliação da repercussão do incumprimento no equilíbrio sinalagmático do contrato (Inadimplemento Contratual Grave - Discricionariedade do Juiz. In. Revista de Processo. Ano 20. Abril-Junho de 1.995, 78).

Vale dizer que, para a resolução do contrato, inclusive pela via judicial, há de se considerar não só a inadimplência em si, mas também o adimplemento da avença durante a normalidade contratual.

A partir desse cotejo, entre adimplemento e inadimplemento, é que deve o juiz aferir a legitimidade da resolução do contrato, de modo a realizar, por outro lado, os princípios da função social e da boa-fé objetiva.

Nessa linha, a insuficiência obrigacional poderá ser relativizada com vistas à preservação da relevância social do contrato e da boa-fé, desde que a resolução do pacto não responda satisfatoriamente a esses princípios.

Essa é a essência da doutrina do adimplemento substancial do contrato.

No direito italiano, por exemplo, a teoria do adimplemento substancial é expressamente reconhecida, mercê do que dispõe o art. 1.455 do Código Civil: o contrato não pode ser resolvido se o inadimplemento de uma das partes tem escassa importância, resguardado o interesse da outra parte.

Regra análoga é encontrada no art. 802, 2, do Código Civil português, de 1966: o credor não pode, todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial, atendendo ao seu interesse, tiver escassa importância.

É de se notar, portanto, que a teoria do substancial adimplemento visa a impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor, em prol da preservação da avença, quando viável e for de interesse dos contraentes.

Ou, como aduz Jones Figueiredo Alves, o suporte fático que orienta a doutrina do adimplemento substancial, como fator desconstrutivo do direito de resolução do contrato por inexecução obrigacional, é o incumprimento insignificante (Adimplemento Substancial como Elemento Decisivo à Preservação do Contrato. In. Revista Jurídica Consulex. Ano XI, 240, Janeiro de 2007).

6. No caso ora em apreço, a conduta da beneficiária do pecúlio, a meu juízo, está inequivocamente revestida de boa-fé, a mora - que não foi causada exclusivamente pelo consumidor - é de pequena importância, e a resolução do contrato não era absolutamente necessária, mostrando-se também interessante a ambas as partes a manutenção do pacto, como se verá.

Dessume-se dos autos que o contrato de previdência privada, cujo benefício era o pecúlio em razão de morte, foi assinado pelo de cujus, falecido marido da autora, em 11.5.2000, tendo sido a ora recorrente indicada como beneficiária de capital de R$ 42.000,00.

O contratante faleceu em 19.6.2001.

Na peça contestatória, a recorrida afirma que o contrato foi cancelado em razão de inadimplência por 90 (noventa) dias em 17.5.2001, apoiando-se em cláusula contratual nesse sentido. Aduz que a última contribuição paga foi em 15.2.2001, referente ao mês anterior.

Todavia, noticia também a própria recorrida que em 23.5.2001 - antes portanto do falecimento do contratante e apenas seis dias depois de o contrato ter sido administrativa e unilateralmente cancelado -, as parcelas relativas às mensalidades de março, abril e maio de 2001 foram pagas, mas que, em razão do anterior cancelamento administrativo, os valores foram devolvidos pela instituição financeira.

Com efeito, depreende-se que o inadimplemento do contrato - a par de ser relativamente desimportante em face do substancial adimplemento verificado durante todo o período anterior -, não pode ser imputado exclusivamente ao consumidor.

Na verdade, era evitável o inadimplemento e decorreu essencialmente do arbítrio injustificável da recorrida - entidade de previdência e seguros -, em não receber as parcelas em atraso, antes mesmo da ocorrência do sinistro, não agindo assim com a boa-fé e cooperação recíproca, essenciais à harmonização das relações civis.

Assim, na verdade a entidade de previdência obstou a purgação de uma mora de somenos importância, antes mesmo da ocorrência do sinistro, somando-se à inequívoca conduta pautada pela boa-fé do consumidor, mostrando-se injustificável a negativa de pagamento do pecúlio depois de verificado o fato gerador.

Incide também, no particular - além dos precedentes sobre seguro, necessidade de interpelação e teoria do adimplemento substancial dos contratos -, o que dispõe o art. 21, § 3º, da Lei 6.435/77:


Art. 21 [...]


3º O pagamento de benefício ao participante de plano previdenciário, dependerá de prova de quitação da mensalidade devida, antes da ocorrência do fato gerador, na forma estipulada no plano subscrito.

Há precedente a determinar o pagamento do pecúlio, mediante purgação da mora, inclusive, se o fato gerador já houver ocorrido, desde que haja previsão contratual de tolerância com o atraso, verbis:


Previdência privada. Pecúlio. Atraso no pagamento de contribuição.


Levantamento da mora decorrente de previsão ostentada no regulamento.


I - Constando do regulamento integrante do contrato do pecúlio, expressamente, poderem ser quitadas mensalidades em até noventa dias (art. 12, § 3º), é possível, dentro desse prazo de tolerância, o levantamento da mora mesmo que após o evento morte do associado.


II - Recurso não conhecido.


(REsp 141.951/RS, Rel. MIN. ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/06/2000, DJ 18/09/2000, p. 125)


---

Com mais razão, a meu juízo, esse entendimento deve ser adotado quando o consumidor tentou purgar a mora, ainda antes do fato gerador, só não o conseguindo por negativa da própria entidade de previdência.

7. Diante do exposto, conheço do recurso especial e lhe dou provimento para julgar procedente o pedido autoral, determinando que a recorrida pague o pecúlio devido, nos termos do contrato firmado. ... (Min. Luis Felipe Salomão).

Doc. LegJur (121.8342.3000.4800) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Seguridade social (Jurisprudência)
Previdência privada (Jurisprudência)
Pecúlio (Jurisprudência)
Plano de pecúlio por morte (v. Previdência privada ) (Jurisprudência)
Seguro de vida (Jurisprudência)
Mora do contratante (v. Seguro de vida ) (Jurisprudência)
Cancelamento automático (v. Seguro de vida ) (Jurisprudência)
Interpelação (v. Pecúlio ) (Jurisprudência)
Teoria do adimplemento substancial (v. Seguro de vida ) (Jurisprudência)
Purgação da mora (Jurisprudência)
Princípio da boa-fé objetiva (Jurisprudência)
Princípio da função social do contrato (Jurisprudência)
Função social do contrato (Jurisprudência)
Contrato (v. Função social do contrato ) (Jurisprudência)
Boa-fé (v. Boa-fé objetiva ) (Jurisprudência)
(Legislação)
(Legislação)
CCB/2002, art. 421
CCB/2002, art. 422
(Legislação)
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