Jurisprudência em Destaque

STJ. 3ª T. Sociedade anônima. Administrador de sociedade. Responsabilização civil do diretor financeiro. Aprovação das contas por assembleia geral sem ressalvas. Prévia anulação. Precedentes do STJ. Lei 6.404/1976, arts. 134, § 3º e 159. CCB/2002, art. 186.

Postado por Emilio Sabatovski em 16/08/2012
«... III - Da exoneração da responsabilidade civil do recorrido

Quanto à ação de responsabilidade por dano causado pelo administrador de sociedade por ações, estatui o artigo 159 da Lei 6.404/76, sob a rubrica de «Ação de Responsabilidade»:


«Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembléia geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.


§ 1º A deliberação poderá ser tomada em assembléia geral ordinária e, se prevista na ordem do dia, ou for conseqüência direta de assunto nela incluído, em assembléia geral extraordinária.

O conflito dos autos surge em relação ao artigo 134, § 3º, da referida norma, ao prescrever que «A aprovação, sem reserva, das demonstrações financeiras e das contas, exonera de responsabilidade os administradores e fiscais, salvo erro, dolo, fraude ou simulação (art.286)».

Na presente hipótese, que se refere à exoneração de responsabilidade civil do recorrido, decidiu o Tribunal que


«(...)


Em 6.4.2009 a Assembleia Geral Extraordinária (AGE) aprovou o ajuizamento da ação contra o recorrente, sendo que em 27.4.2009, os acionistas se reuniram (AGO) e aprovaram, sem reservas, as contas.


(...)


Considera-se que o acesso à ordem jurídica deve ser irrestrito (art. 5º, XXXV, da CF), sendo essa uma verdade constitucional impeditiva de interpretações que, na dúvida, retirem do litigante o seu interesse e a sua legitimidade de ir a Juízo postular reparação de direitos lesados. A lei introduziu uma ressalva nas ações de responsabilidade civil que são movidas pela companhia contra os administradores, condicionando o seu exercício a uma prévia e transparente posição democrática (votação em assembleia) e, no caso em apreço, surgiu uma incerteza por uma incoerência nas deliberações. A primeira foi no sentido de autorizar a ação uti universi e a outra, quando examinadas as contas (AGO), deliberou-se aprovar as contas, sem reservas.


Caso a ação tivesse sido ajuizada no interregno entre as duas assembleias não caberia controverter sobre a primazia da vontade declarada na assembleia extraordinária (de 6.4.2009). Porém e porque a ação foi promovida em junho, ou seja, dois meses depois de ter sido realizada a assembléia ordinária (27.4.2009) que, sem ressalvas, aprovou as contas da administração, é forçoso reconhecer que quando protocolizada a inicial não existia mais autorização para demandar o ex-diretor.


As declarações de pessoas coletivas são interpretadas mediante fatores objetivos, exatamente porque o art. 134, § 3º, da Lei 6404/76, estabelece que a aprovação, sem reserva das demonstrações financeiras e das contas exonera de responsabilidade os administradores e fiscais, salvo erro, dolo, fraude ou simulação. O texto é de incidência internacional e foi admitido, na Itália (...). Os escritores entraram na discussão levantada por De Gregório, que repudiava a conclusão simplista de que a mera aprovação das contas exonera o administrador culpado e reafirmaram que a assembleia, ao aprovar os balanços apresentados sem um anexo contendo a contestação dos atos praticados, assume o risco e imputa a si mesmo o dano causado pelo seu mandatário (obra citada, p. 239, § 379 - bis).


Chama atenção o desmembramento das assembleias, embora não caiba afirmar a impropriedade de convocar os acionistas para, de forma extraordinária, votar sobre a responsabilidade do administrador, embora o mais coerente e democrático seria inserir a matéria na ordem do dia da assembleia geral ordinária, porque decorrência da questão principal a ser votada (...).


O tema (responsabilidade) seria propício para debate junto da aprovação de contas, em virtude da singularidade da operação e da condição subalterna do sujeito a ser investigado para reparar os danos da sociedade, de modo que é muito mais evidente que, quando os acionistas tomaram conhecimento da oportunidade de aprovarem as operações (com ressalva ou sem a reserva da ação ainda não ajuizada) deliberaram encerrar a questão que colocaria o recorrente como exclusivo estrategista de operações que sempre foram praticadas com beneplácito da companhia e que, em virtude de mudança de política cambial, inverteu o resultado ganhando nocividade financeira. E isto pode estar, de alguma maneira, ao rumo da investigação aberta pela CVM, cujo relatório, de 7.12.2009, atribuiu responsabilidade ao recorrente e a mais 13 integrantes da Sadia, inclusive Walter Fontana Filho, Presidente do Conselho de Administração e membro do Comitê Financeiro da Sadia (fl. 2893). O encerrar o caso não é, portanto, deliberação sem causa, de modo que dar como exonerados os administradores (e não só o diretor, ora recorrente) integra plano de política empresarial que urge respeitar.


O fato é que a licença da assembleia para a companhia agir contra o administrador significa, sempre, uma rejeição das contas e uma condenação, que deveria ser pormenorizada, do administrador acusado de mentor do ato danoso não autorizado e se revela incompatível com o desejo de processar ou acusar, o fato de menos de trinta dias serem aplaudidas as contas, sem uma denúncia formal de que persistiria a responsabilidade do recorrente diante das operações e do resultado financeiro aprovado.


(...)


O que vale é a segunda assembleia (ordinária) quando, examinada a operação desastrosa com derivativos diante do contexto global da companhia, atos pretéritos e estrutura financeira organizada para recepcionar tais derivativos, concluiu-se que o melhor seria encerrar o conflito e não criar a lide.


Esse o interesse da companhia declarado por expressão vinculativa, o que implica afirmar que o recorrente está livre da responsabilidade que se lhe quer imputar.


Veja-se que essa fragmentação de reuniões implicou na eliminação (porque afastado da companhia) do direito do recorrente apresentar perante os acionistas, suas justificativas e ordens de aprovação para agir da forma como procedeu. É de boa ordem que se permitisse a palavra do diretor acusado de responsabilidade pelo prejuízo, como determina o art. 134, § 1º, da LSA, o que não se verificou.


(...)


Isso posto, dá-se provimento para, na forma do art. 267, IV, do CPC, julgar extinta a ação (falta de pressuposto obrigatório para desenvolvimento da ação de responsabilidade uti universi) (...)» (fls. 3.026/3.030 - grifou-se).

Com efeito, já no Decreto-Lei 2.627, de 26 de setembro de 1940, o Brasil adotava o entendimento de que a aprovação da gestão constitui ato jurídico perfeito a proteger os interesses dos administradores, sem cuja anulação estes não podem ser responsabilizados.

Já dizia o artigo 101 da citada norma que «A aprovação, sem reserva, do balanço e das contas exonera de responsabilidade os membros da diretoria e do Conselho Fiscal, salvo erro, dolo, fraude ou simulação (artigo 156)».

Na época, escreveu Trajano de Miranda Valverde:


«(...)


A deliberação da assembléia geral ordinária, que aprovou o balanço das contas da diretoria pode ser anulada (art. 156), quando eivada de erro, dolo, fraude, simulação (...) Em qualquer dos casos, é manifesto que a deliberação da assembléia geral que aprovou o balanço e as contas foi obtida por meio de atos, processos ou expedientes a deliberação. Tanto a sociedade como qualquer acionista poderão pleitear, judicialmente a anulação da deliberação.» (Sociedade por Ações, Edição Revisada Forense, Rio de Janeiro, 1953, Vol. II, págs. 140/141)

Com razão a aprovação do balanço e das contas implicava a quitação dos administradores da sociedade anônima, cuja anulação só poderia ser perseguida pela via judicial, mediante a prova de erro, dolo, fraude ou simulação.

Tal entendimento foi mantido na Lei 6.404 de 15/12/1976, conhecida como a Lei das Sociedades Anônimas:


«Art. 134. Instalada a assembléia-geral, proceder-se-á, se requerida por qualquer acionista, à leitura dos documentos referidos no artigo 133 e do parecer do conselho fiscal, se houver, os quais serão submetidos pela mesa à discussão e votação.


§ 3º A aprovação, sem reserva, das demonstrações financeiras e das contas, exonera de responsabilidade os administradores e fiscais, salvo erro, dolo, fraude ou simulação (artigo 286)». (grifou-se)


«Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembléia-geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.»


«Art. 286. A ação para anular as deliberações tomadas em assembléia-geral ou especial, irregularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulação, prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberação.»

Verifica-se que a regra do artigo 134, § 3º, da Lei 6.404/76 é especial em relação ao artigo 159 do mesmo diploma legal, de modo que, no caso de aprovação de contas, não bastaria a prévia deliberação da assembleia geral para a propositura da ação de responsabilidade civil, mas, sim, antes ou concomitantemente, o ajuizamento da ação de anulação da assembleia que aprovou as contas.

Nesse sentido tem-se posicionado a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, conforme se verifica nos seguintes precedentes:


«AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL SOCIEDADE ANÔNIMA. NECESSIDADE DE PRÉVIA AÇÃO DE ANULAÇÃO DA ASSEMBLÉIA DE APROVAÇÃO DE CONTAS. PRESCRIÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. APLICAÇÃO DA MULTA DO ARTIGO 557, § 2º DO CPC.


1. Ação de responsabilidade. Prescrição: o entendimento dominante neste STJ é de que, para propositura da ação de responsabilidade civil contra os administradores, é necessária a prévia propositura da ação de anulação da assembléia de aprovação de contas da sociedade no prazo bienal previsto no artigo 286 da Lei 6.404/76. A partir do trânsito em julgado da sentença que acolher a anulação é que começa a fluir o prazo trienal para a ação de responsabilidade.


2. Agravo regimental ao qual se nega provimento» (AgRg no Ag 640.050/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 19/5/2009, DJe 1º/6/2009 - grifou-se).


«AGRAVO REGIMENTAL - SOCIEDADE ANÔNIMA - APROVAÇÃO SEM RESSALVAS DAS CONTAS PELA ASSEMBLÉIA GERAL - PRÉVIA ANULAÇÃO DO ATO DE APROVAÇÃO PARA EVENTUAL RESPONSABILIZAÇÃO DO ADMINISTRADOR - NECESSIDADE - AGRAVO IMPROVIDO.


1. Salvo se anulada, a aprovação das contas sem reservas pela assembléia geral exime os administradores de quaisquer responsabilidades.


2. Agravo regimental improvido» (AgRg no Ag 950.104/DF, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 19/3/2009, DJe 30/3/2009 - grifou-se).


«COMERCIAL. PRESCRIÇÃO. SOCIEDADE ANÔNIMA. APROVAÇÃO DAS CONTAS DOS ADMINISTRADORES. A aprovação das contas pela assembléia geral implica quitação, sem cuja anulação os administradores não podem ser chamados à responsabilidade. Recurso especial não conhecido» (REsp 257.573/DF, Rel. Ministro Waldemar Zveiter, Rel. p/ Acórdão Ministro Ari Pargendler, Terceira Turma, julgado em 8/5/2001, DJ 25/6/2001 - grifou-se).

Nessa linha de raciocínio, somente após o trânsito em julgado da sentença que acolher a anulatória, pela ocorrência dos citados vícios, é possível ajuizar a ação de responsabilidade pertinente.

A análise desse tema, inclusive, também já foi enfrentada no Supremo Tribunal Federal, Relator Ministro Rodrigues Alckmin, citado pelo ilustre Ministro Antônio de Pádua Ribeiro no voto proferido no REsp 257.573/DF:


«(...)


O objetivo expresso na inicial só poderia ser intentado depois de anulada, previamente, a deliberação da assembléia. É a lição de Cunha Peixoto (...) a aprovação das contas dos administradores pela assembléia geral impede que se promova a ação de responsabilidade civil contra os diretores, a não ser que se anule, primeiramente, o ato da assembléia eivado de qualquer vício de erro, dolo, fraude ou simulação (...)».

No presente caso, portanto, não há falar em ação de responsabilização contra o recorrido, porquanto o diretor foi exonerado de responsabilidade desde que teve suas demonstrações financeiras aprovadas pela assembleia geral posterior.

Ademais, cumpre lembrar que, em tema de sociedades anônimas, Modesto Carvalhosa sustenta que as assembleias gerais sucessivas têm plenos poderes para ratificar ou reconsiderar suas próprias deliberações, sanando vícios ou defeitos, ou alterando suas conclusões tomadas em assembleias anteriores («Comentários à Lei de Sociedades Anônimas», Saraiva, 2003, vol 3, pág. 391).

De fato, com aquela aprovação, e à míngua de sua anulação pela via adequada, não se pode falar em ação de responsabilidade civil, pois esta só existiria se anulado o ato que aprovou definitivamente as contas, ou seja, somente no caso de ser afastada a exoneração da responsabilidade do diretor, o que, como visto, não ocorreu.

Ainda por pertinente, transcreve-se Nelson Eizirik, que, não obstante discordar da necessidade de prévia anulação, ao tratar da matéria, contudo, diz que «o voto favorável à aprovação das contas do exercício é incompatível com a aprovação de propositura da ação de responsabilidade contra os administradores» (Temas de direito societário, Rio de Janeiro: Renovar, 2005, pág. 113).

Logo, trata-se, sim, de impedimento de propositura de ação de responsabilidade civil autorizada anteriormente à exoneração legal dessa responsabilidade, resultante da simples razão de que não é cabível ação de responsabilidade civil contra quem dessa responsabilidade, por força de lei e do ato jurídico perfeito, foi exonerado. ...» (Min. Ricardo Villas Bôas Cueva).»

Doc. LegJur (125.5323.6000.4500) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Sociedade (Jurisprudência)
Sociedade anônima (Jurisprudência)
Administrador de sociedade (v. Sociedade anônima ) (Jurisprudência)
Responsabilização civil (v. Sociedade anônima ) (Jurisprudência)
Diretor financeiro (v. Sociedade anônima ) (Jurisprudência)
Aprovação das contas por assembleia geral sem ressalvas (v. Sociedade anônima ) (Jurisprudência)
Lei 6.404/1976, art. 134, § 3º (Legislação)
Lei 6.404/1976, art. 159 (Legislação)
CCB/2002, art. 186
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