Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 634.7396.2637.6079

1 - TJRJ Apelação Criminal. Acusado condenado pela prática do crime previsto no art. 273, § 1º, § 1º-A e § 1º-B, na forma do art. 61, II alínea «j do CP, a 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime semiaberto, e 23 (vinte e três) dias-multa no valor mínimo unitário. Foi-lhe permitido recorrer em liberdade. Apelo defensivo postulando, preliminarmente, a nulidade do feito pela ilicitude das provas, consistente na violação de domicílio e na ilegalidade da perícia técnica. No mérito, requer a absolvição por fragilidade probatória e, subsidiariamente: a) a fixação da pena-base no mínimo legal; b) o afastamento da agravante do art. 61, II, «j do CP; b) a mitigação do regime; c) a aplicação da detração penal; d) a substituição da sanção privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. Parecer da Procuradoria de Justiça no sentido do conhecimento e não provimento do recurso. 1. Aduz a exordial que no dia 07/04/2020, o ora apelante falsificava, alterava, tinha em depósito para venda e entregava para consumo produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, mais especificamente o saneante álcool em gel, tratando-se de produto sem registro no órgão de vigilância sanitária competente. 2. O pleito absolutório merece ser acolhido. 3. Infere-se dos autos que, na data dos fatos, policiais civis compareceram à residência do ora denunciado para averiguar denúncia da existência de laboratório clandestino de produção de álcool em gel 70%. Segundo as testemunhas eles estavam recebendo várias denúncias acerca disso e foi registrada ocorrência indicando que o acusado estaria cometendo este delito. Em razão disso, os policiais civis foram averiguar o fato no local, ocasião em que foi franqueada, pela esposa do denunciado, a entrada na moradia do acusado e, em seguida, foram apreendidos os materiais indicativos do crime previsto no art. 273, § 1º, § 1º-A e § 1º-B, na forma do art. 61, II alínea «j do CP, conforme descritos na exordial. Na oportunidade chegou à sua casa o acusado, que foi preso em flagrante. 4. Conquanto admissível a prolação de uma sentença condenatória embasada nos depoimentos dos agentes da Lei, a hipótese é de dúvida quanto à legalidade da ação dos militares que, sem mandado e motivos justificáveis, ingressaram na residência do imputado, onde apreenderam o material que apontava o cometimento do aludido delito. 5. No caso, compartilho do posicionamento dos Tribunais Superiores, no sentido de que denúncia de um suspeito guardar material ilícito em uma moradia não é elemento apto a autorizar o ingresso dos agentes da lei na residência. 7. Na hipótese, eventual permissão para acesso e revista na moradia emitida no ato da diligência não foi ratificada em juízo, pois a esposa do recorrente se absteve de depor. Não há evidências de que a esposa do recorrente, de forma livre e espontânea, franqueou a entrada e buscas em sua moradia. 8. Com efeito, não se infere do feito que havia urgência da diligência na residência a autorizar o ingresso de policiais sem ordem judicial na casa do ora apelante. Ademais, o encontro do material ilícito não torna válida a operação policial. 9. Se os militares sabiam ou desconfiavam que o denunciado guardava material criminoso, cabia solicitar mandado judicial para busca e apreensão na aludida casa. Nada justifica que os agentes da lei extrapolem a sua atribuição, passando ao largo de garantias constitucionais, notadamente a prevista no CF/88, art. 5º, XI, que consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. 10. Ademais, como notório, a própria presença de policiais na porta da casa de alguém já o intimida, até porque muitos agentes de segurança costumam atuar com certa truculência quando abordam pessoas, ou ingressam na moradia do indivíduo, e muitas vezes, em descompasso com os mandamentos legais e constitucionais, portanto, é imperativa uma análise cuidadosa dos fatos narrados. Infelizmente isto ocorre, via de regra, nas comunidades carentes. 11. Concessa maxima venia, a operação realizada mostrou-se confusa. Subsistem dúvidas quanto à prática do delito apurado, ante a inexistência de prova válida a autorizar a busca e apreensão na moradia do imputado. 12. Em um estado democrático de direito não há margem para uma condenação criminal, com base em ações ilegítimas. Não podemos chancelar atuações que desrespeitem direitos e garantias constitucionais, mesmo que posteriormente constate-se a ocorrência de delito. 13. Em tal contexto, aplicável o princípio in dubio pro reo, impondo-se a absolvição do recorrente quanto ao crime que lhe foi atribuído. 14. Recurso conhecido e provido, para absolver o recorrente, com fulcro no CPP, art. 386, VII. Oficie-se.

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