Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 233.2953.2951.8525

1 - TJRJ APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. COMPRA DE AUTOMÓVEL USADO. VÍCIOS OCULTOS. DANOS MATERIAIS E MORAIS CONFIGURADOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

Cogente aplicação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, com todos seus consectários legais, uma vez que parte recorrida, nitidamente, insere-se no conceito de fornecedor, consagrado na Lei 8.078/90, art. 3º, caput. In casu, incontroversa a aquisição de veículo seminovo pelo demandante junto a parte ré, ora apelante, bem como a apresentação de defeitos por várias vezes. Igualmente incontroversa a ultimada recusa de conserto, sob a alegação de que o automóvel perdera a garantia após o decurso de 90 dias, ter passado dos 3.000km percorridos e de ter sido modificado com a instalação do GNV. Exsurgira como ponto controvertido, portanto, a existência ou não da obrigação de a parte apelante em suportar os reparos necessários para o pleno funcionamento do bem comercializado. Nessa esteira, inclusive, por força da norma processual, incumbia à parte apelante provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral (CPC, art. 373, II), na medida em que a petição inicial fora instruída com prova dos vícios descritos e valores despendidos pelo consumidor. Compulsando os autos, verifica-se, ainda, que a instalação do Kit GNV ocorrera em março de 2023, quase dois meses após a compra do veículo, e depois da apresentação dos primeiros defeitos (ID 54435633). Com efeito, o primeiro defeito - estouro da tampa do reservatório de água, único reparado pela parte apelante - fora noticiado no dia 20 de janeiro, dois dias depois da compra do veículo. Decorridos 21 dias desde a compra, novo defeito surgira - problema com a embreagem - cujo conserto fora rechaçado pela parte apelante, sob a alegação de que a garantia alcançaria apenas o motor e caixa, procedendo o consumidor, por conta própria, com o reparo. Dias depois, aventados novos defeitos - problema no motor de arranque, mistura indevida de água e óleo, a qual danificara o motor, e novo problema com a embreagem - os quais não foram reparados pela parte apelante, embora sustente o contrário em suas razões. Destarte, o acervo probatório corrobora a narrativa autoral de que o automóvel fora comercializado pela parte apelante com vários defeitos ocultos, percebidos pelo consumidor logo após a tradição e que não possuem qualquer relação com a instalação do Kit GNV ou com a quilometragem alcançada pelo veículo. Nesse ponto, ademais, como frisou o sentenciante, competia à parte apelante demonstrar não só que o automóvel fora alienado em boas condições de uso, mas também que a alteração promovida pelo consumidor e/ou o atingimento da quilometragem inicialmente garantida contribuíram para os percalços descritos pelo consumidor. Isso porque, mesmo não sendo um automóvel novo, não se mostra razoável a sequência de vícios experimentados e que comprometeram a efetiva fruição do bem. Outrossim, oportuno salientar que as relações consumeiristas encontram-se sob a égide da Teoria do Risco do Empreendimento, segundo a qual todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento, independentemente de culpa, pois a responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar a atividade de produzir, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. Entender de modo diverso importaria na transferência do risco da atividade do fornecedor para a parte mais fraca e vulnerável da relação, o consumidor. Logo, a despeito da insurgência defensiva, patente a comercialização de bem, cuja qualidade não se coadunava com aquela que legitimamente se esperava, mesmo de um automóvel seminovo, motivo pelo qual compete à parte apelante reembolsar a parte apelada pelos gastos despendidos, como assinalou o sentenciante. Por derradeiro, considerando os percalços vividos pelo apelado, não há dúvidas do seu direito de ser indenizado pelos prejuízos morais, uma vez que a gravidade do fato transcende o mero aborrecimento. Ora, ainda que se trate de um veículo usado, não é de se esperar que logo após a tradição o automóvel apresente variados defeitos. Ademais, o consumidor, nesse ínterim, precisou contactar a parte apelante inúmeras vezes na tentativa de solucionar os problemas, desperdiçando seu tempo e energia, e, ainda assim, precisara recorrer à via judicial. No que tange à quantificação do dano moral, ensina doutrina e jurisprudência, que em seu arbitramento pelo juiz, deve ser levado em conta, além do caráter compensatório do instituto, o seu viés preventivo, punitivo e pedagógico, de modo a coibir reincidências. Nesse contexto, afigura-se pertinente a verba indenizatória arbitrada pelo juízo sentenciante em R$5.000,00 (cinco mil reais), não merecendo retoque. Recurso desprovido.... ()

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