Decisão sobre legitimidade ativa para restituição de indébito tributário do IPI: exclusividade do contribuinte de direito e vedação ao contribuinte de fato pleitear contra o Fisco
Este documento esclarece que a legitimidade ativa para solicitar a restituição de indébito tributário referente ao IPI sobre descontos incondicionais é exclusiva do contribuinte de direito, enquanto o contribuinte de fato possui apenas direito de regresso em esfera privada, não podendo atuar diretamente contra o Fisco. Trata-se de análise jurídica sobre a legitimidade para repetição do indébito em tributos indiretos, fundamentada na relação jurídica tributária aplicável.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
O contribuinte de fato não detém legitimidade ativa para pleitear a restituição de indébito tributário relativo ao IPI incidente sobre descontos incondicionais, recolhido pelo contribuinte de direito, por não integrar a relação jurídica tributária pertinente. A legitimidade ativa para a repetição do indébito de tributos indiretos é exclusiva do contribuinte de direito, sendo o contribuinte de fato titular apenas de direito de regresso em relação privada, vedada sua atuação direta contra o Fisco.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
O acórdão estabelece distinção fundamental entre contribuinte de direito (aquele que figura como sujeito passivo na relação jurídica tributária) e o contribuinte de fato (quem suporta o ônus econômico do tributo). No âmbito dos chamados tributos indiretos, como o IPI, cuja incidência econômica é transferida ao longo da cadeia comercial, a legislação tributária reserva a legitimidade para pleitear a restituição exclusivamente ao contribuinte de direito. O contribuinte de fato, a despeito de suportar o encargo financeiro, não integra a relação jurídico-tributária com o Estado, não podendo, portanto, figurar no polo ativo de ação de repetição de indébito. Eventual direito à restituição do indébito por parte do contribuinte de fato se dá em ação de direito privado, contra o contribuinte de direito que tenha obtido a devolução perante o Fisco.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
- CF/88, art. 5º, incisos II e XXXV – Princípios da legalidade e da inafastabilidade da jurisdição, garantindo que somente aquele a quem a lei confere direito subjetivo pode demandar em juízo.
- CF/88, art. 150, I – Princípio da legalidade tributária, vedando a exigência ou majoração de tributo sem lei que o estabeleça.
FUNDAMENTO LEGAL
- CTN, art. 121 – Define o sujeito passivo da obrigação tributária principal.
- CTN, art. 165 – Estabelece o direito à restituição do tributo pago indevidamente ao sujeito passivo (contribuinte de direito).
- CTN, art. 166 – Dispõe que, nos tributos que comportem transferência do encargo financeiro, a restituição só será feita a quem comprove ter assumido o referido encargo, ou, se o transferiu, esteja autorizado pelo terceiro a recebê-la.
- CTN, art. 46, II; art. 47, II, "a" e "b"; art. 51, II – Tratam da definição do sujeito passivo e da base de cálculo do IPI.
- Lei 4.502/65, art. 14, §§1º e 2º, com redação da Lei 7.798/89 – Dispõem sobre o valor tributável do IPI e impossibilidade de dedução de descontos incondicionais da base de cálculo.
SÚMULAS APLICÁVEIS
- Súmula 282/STF – Matéria não prequestionada não pode ser apreciada em recurso especial.
- Súmula 356/STF – Questão de ordem pública exige prequestionamento para apreciação em recurso especial.
- Súmula 7/STJ – Vedação ao reexame de matéria fático-probatória em recurso especial.
- Súmula 213/STJ – Mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por entidade de classe em favor dos associados independentemente de autorização expressa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese reafirma a teoria da legitimação ad causam no Direito Tributário, restringindo a legitimidade ativa para a repetição de indébito de tributos indiretos ao contribuinte de direito, mesmo diante do repasse do encargo financeiro ao contribuinte de fato. Essa delimitação processual, segundo o Superior Tribunal de Justiça, busca preservar a segurança jurídica e a sistematicidade do direito tributário, evitando a multiplicidade de demandas e a desestabilização das relações jurídicas tributárias. O entendimento privilegia o critério formal-legal na identificação do sujeito passivo, afastando interpretações fundadas apenas em critérios econômicos.
Como consequência prática, distribuidoras e demais elos da cadeia econômica que não sejam sujeitos passivos do tributo ficam impedidos de pleitear diretamente ao Fisco a restituição de valores tidos como indevidamente pagos, mesmo que tenham arcado economicamente com o tributo. Eventual direito à restituição deve ser buscado em ação privada contra o contribuinte de direito, após este obter a restituição junto ao Fisco, o que racionaliza o sistema e evita o enriquecimento sem causa, mas pode gerar dificuldades práticas para o contribuinte de fato.
O acórdão apresenta argumentação consistente, embasada na doutrina e na legislação vigente, além de dialogar com precedentes do próprio STJ e do STF. Entretanto, a crítica doutrinária indica que o art. 166 do CTN, ao condicionar a restituição à autorização do contribuinte de fato, poderia não ter sido plenamente recepcionado pela ordem constitucional, dada a sua possível colisão com o princípio da estrita legalidade e com a proteção contra o enriquecimento sem causa, tópico ainda passível de debate acadêmico futuro. No cenário atual, o entendimento fixado tende a prevalecer, conferindo maior segurança às relações fiscais e processuais, mas poderá ser revisitado caso haja evolução legislativa ou modificação da orientação jurisprudencial.