Renúncia à aposentadoria (desaposentação) no RGPS como direito patrimonial disponível sem devolução dos valores recebidos
Documento que trata da possibilidade legal de renúncia à aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social, permitindo ao segurado obter nova aposentadoria mais vantajosa sem devolver os valores já recebidos do benefício anterior. Explica os fundamentos jurídicos e direitos do segurado envolvidos no processo de desaposentação.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
A renúncia à aposentadoria (desaposentação) é possível no âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), sendo direito patrimonial disponível do segurado. O segurado pode abdicar do benefício anteriormente concedido para fins de obtenção de nova aposentadoria mais vantajosa, sem a necessidade de devolução dos valores percebidos a título do benefício renunciado.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consolidou o entendimento de que a aposentadoria, por possuir natureza patrimonial e disponível, pode ser objeto de renúncia pelo seu titular. Assim, viabiliza-se ao segurado a obtenção de benefício previdenciário mais vantajoso, computando-se os períodos contributivos posteriores à primeira aposentação.
A Corte afastou a exigência de devolução dos valores recebidos, fundamentando que, durante o período em que o segurado esteve aposentado, o benefício era legítimo e devido, não se podendo exigir a restituição como condição para o novo jubilamento.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
- CF/88, art. 5º, II (Princípio da legalidade – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei)
- CF/88, art. 7º, XXIV (direito à aposentadoria)
- CF/88, art. 195, §5º (princípio da precedência da fonte de custeio – nenhum benefício será criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total)
FUNDAMENTO LEGAL
- Lei 8.213/1991, art. 18, §2º (vedação à cumulação de benefícios e à concessão de novo benefício por tempo de contribuição enquanto vigente o anterior)
- Lei 8.213/1991, art. 11, §3º (contribuição do aposentado ao RGPS para fins de custeio da Seguridade Social)
- Lei 8.213/1991, art. 96, III (vedação de contagem de tempo já utilizado para concessão de outro benefício em regime distinto)
SÚMULAS APLICÁVEIS
- Súmula 111/STJ (honorários advocatícios em ações previdenciárias)
- Súmula 204/STJ (juros de mora em prestações previdenciárias)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese firmada pelo STJ teve impacto relevante no cenário previdenciário nacional, garantindo maior amplitude à autonomia do segurado em relação aos seus direitos previdenciários. A dispensa de devolução dos valores recebidos, ao mesmo tempo em que reforça a proteção à confiança legítima do beneficiário, também evita ônus desproporcional e de difícil execução ao segurado.
A decisão, contudo, não encerra a controvérsia, uma vez que o tema foi posteriormente submetido ao crivo do STF, que, em julgamento posterior, fixou tese em sentido oposto. No entanto, o precedente do STJ evidencia a evolução jurisprudencial e a preocupação com a segurança jurídica e o equilíbrio financeiro-atuarial do sistema.
Do ponto de vista prático, a orientação do STJ influenciou o ajuizamento de milhares de ações de desaposentação no país, ampliando o debate sobre os limites da renúncia de benefícios e a possibilidade de revisão do ato concessório sem necessidade de ressarcimento ao erário.
ANÁLISE CRÍTICA
A argumentação do acórdão valoriza a natureza disponível e patrimonial dos benefícios previdenciários, reconhecendo ao segurado a faculdade de renúncia, elemento essencial do direito privado. O afastamento da devolução dos valores se sustenta na premissa de que o benefício recebido foi legítimo enquanto vigente e que o desfazimento do ato concessório não implica retroação dos efeitos.
O julgado se alinha com a tendência jurisprudencial de proteção ao segurado, mas esbarra em preocupações acerca do desequilíbrio atuarial e à preservação da fonte de custeio, argumentos destacados pelo voto vencido do relator. Em termos processuais, a fixação da tese sob o rito dos repetitivos promoveu uniformização da matéria no STJ, mas gerou insegurança jurídica diante da posterior posição do STF.
A consequência prática da decisão foi o reconhecimento do direito à desaposentação sem devolução de valores, com repercussão direta sobre o regime financeiro da Previdência Social e o planejamento de benefício por parte dos segurados. A despeito da posterior reversão pelo STF, o precedente do STJ permanece relevante para análise histórica e para compreensão dos fundamentos que permearam o debate sobre a desaposentação no Brasil.