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Responsabilidade do provedor de aplicações de internet conforme o Marco Civil da Internet: limites legais, ordem judicial e exceções para divulgação não consentida de imagens íntimas

Publicado em: 29/07/2024 Civel
Este documento aborda a responsabilidade dos provedores de aplicações de internet conforme o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), destacando que a responsabilização ocorre principalmente mediante descumprimento de ordem judicial para remoção de conteúdo, sendo excepcional a responsabilização por notificação extrajudicial nas hipóteses específicas de divulgação não consentida de imagens íntimas, excluindo conteúdos profissionais e comerciais.

TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:

A responsabilidade do provedor de aplicações de internet por atos praticados por seus usuários, nos termos do Marco Civil da Internet, somente se configura, como regra, diante do descumprimento de ordem judicial de remoção de conteúdo (reserva de jurisdição), sendo excepcional a responsabilização por simples notificação extrajudicial da vítima, aplicável apenas na hipótese de divulgação não consentida de imagens íntimas, cenas de nudez ou atos sexuais de caráter estritamente privado (art. 21 da Lei 12.965/2014), não se estendendo a materiais produzidos profissionalmente para fins comerciais e destinados à circulação.

COMENTÁRIO EXPLICATIVO

A tese distingue o regime de responsabilidade dos provedores de aplicações na internet, normatizado no Marco Civil da Internet ( Lei 12.965/2014). O artigo 19 estabelece a regra da reserva de jurisdição, ou seja, o provedor só responde civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial, permanecer inerte. Excepcionalmente, o art. 21 prevê a responsabilização do provedor por omissão diante de mera notice and take down (notificação extrajudicial do ofendido), restrita a casos de divulgação não consentida de imagens íntimas, de nudez ou atos sexuais de caráter privado. O acórdão delimita que essa exceção não alcança conteúdo produzido profissionalmente com intuito comercial (por exemplo, ensaios sensuais para revistas), pois tal material não é considerado de natureza privada, ainda que posteriormente divulgado sem autorização.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

  • CF/88, art. 5º, X – Direito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas.
  • CF/88, art. 5º, IV e IX – Liberdade de manifestação do pensamento e expressão.

FUNDAMENTO LEGAL

  • Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), art. 19 – Reserva de jurisdição: responsabilidade do provedor após ordem judicial.
  • Lei 12.965/2014, art. 21 – Exceção: responsabilidade em casos de divulgação de nudez ou atos sexuais de caráter privado, mediante notificação extrajudicial.
  • CCB/2002, art. 20 – Proteção à imagem.
  • CCB/2002, art. 186 – Responsabilidade civil.

SÚMULAS APLICÁVEIS

  • Súmula 83/STJ – Jurisprudência pacífica quanto à impossibilidade de se impor aos provedores de pesquisa a obrigação de eliminar resultados de busca sem indicação do respectivo URL.
  • Súmula 211/STJ – Ausência de prequestionamento.
  • Súmula 284/STF – Deficiência de fundamentação recursal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tese tem grande relevância no contexto do direito digital e da proteção de direitos fundamentais na internet. Ao restringir a exceção da responsabilização sem ordem judicial (art. 21) apenas a situações envolvendo exposição de íntima natureza privada, o STJ resguarda o equilíbrio entre a tutela da intimidade e a liberdade de expressão, evitando que provedores sejam compelidos a agir como censores em disputas contratuais ou patrimoniais. A decisão também impede a banalização do instituto, reservando a remoção célere para casos de violência digital que envolvam violação direta, grave e irreparável à intimidade, como nas situações de non-consensual intimate images (NCII).

No plano prático, a decisão confere maior segurança jurídica às plataformas digitais, limitando sua responsabilidade a hipóteses juridicamente qualificadas, e orienta vítimas de divulgação não autorizada de material comercial a buscarem a tutela judicial para remoção e reparação, sob pena de diluição do regime protetivo das vítimas de violência digital. O entendimento pode influenciar futuros debates sobre a constitucionalidade da reserva de jurisdição (tema em repercussão geral no STF), bem como o desenvolvimento de políticas de compliance digital e moderação de conteúdo.

ANÁLISE CRÍTICA

O acórdão demonstra rigor técnico ao delimitar o alcance da exceção do art. 21 do Marco Civil da Internet, evitando interpretações extensivas que sobrecarregariam os provedores e enfraqueceriam o sistema protetivo das vítimas de violência digital. A argumentação fundamenta-se na necessidade de interpretação restritiva das exceções legais e na ponderação entre direitos fundamentais, ressaltando a impossibilidade de os provedores analisarem, sem critérios objetivos, as nuances do consentimento para cada uso comercial de imagem. A decisão também antecipa consequências práticas relevantes: a extensão da exceção poderia inviabilizar a aplicação eficaz da tutela especial conferida às vítimas de NCII e comprometer a liberdade de expressão, ao impor obrigações impossíveis ou desproporcionais às plataformas. O julgado reafirma a importância da atuação judicial para a proteção de direitos da personalidade em ambiente digital, preservando o devido processo legal e a segurança jurídica.


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