Definição regulamentar de grau mínimo de disacusia não impede concessão de auxílio-acidente previdenciário desde que comprovados deficiência auditiva, nexo causal e redução da capacidade laborativa
Este documento esclarece que o ato regulamentar que estabelece um grau mínimo de perda auditiva (disacusia) não pode ser usado isoladamente para negar o benefício previdenciário de auxílio-acidente. A concessão do benefício deve considerar a presença dos requisitos legais, como a deficiência auditiva, o nexo causal com o acidente e a consequente redução da capacidade para o trabalho do segurado.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
A definição, em ato regulamentar, de grau mínimo de disacusia (perda auditiva), não exclui, por si só, a concessão do benefício previdenciário de auxílio-acidente. Assim, não se pode recusar a concessão do benefício acidentário ao obreiro pelo simples fato de o grau de perda auditiva estar abaixo do mínimo previsto em tabelas regulamentares (como a de Fowler), desde que presentes os requisitos legais: deficiência auditiva, nexo causal e redução da capacidade laborativa.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
O acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial repetitivo, consolidou o entendimento de que o grau mínimo de disacusia estabelecido em ato regulamentar não afasta, de forma automática e isolada, o direito ao benefício de auxílio-acidente. O foco da análise deve recair sobre a existência dos requisitos legais: a demonstração de sequela auditiva, a comprovação do nexo causal entre a moléstia e a atividade laboral, e a efetiva redução da capacidade para o trabalho habitual. O Tribunal rechaçou a aplicação da Súmula 7/STJ (vedação ao reexame de provas), enfatizando que a questão se refere à valoração jurídica do conjunto probatório, e não à sua reapreciação. O entendimento privilegia a supremacia da legislação federal sobre atos normativos infralegais (como tabelas técnicas), garantindo proteção social ao trabalhador segurado.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
- CF/88, art. 7º, XXVIII – Garantia de seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.
- CF/88, art. 194 e art. 201, I – Princípios da seguridade social e previsão da cobertura de eventos de incapacidade laborativa.
FUNDAMENTO LEGAL
- Lei 8.213/91, art. 86, §4º – “A perda da audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do auxílio-acidente, quando, além do reconhecimento de causalidade entre o trabalho e a doença, resultar, comprovadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.”
- CPC/2015, art. 543-C – Regime dos recursos repetitivos.
SÚMULAS APLICÁVEIS
- Súmula 44/STJ – “A definição, em ato regulamentar, de grau mínimo de disacusia, não exclui, por si só, a concessão do benefício previdenciário.”
- Súmula 111/STJ – Honorários advocatícios em causas previdenciárias.
- Súmula 204/STJ – Juros moratórios em ações previdenciárias.
- Súmula 148/STJ – Correção monetária nas ações previdenciárias.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese firmada pelo STJ tem enorme relevância social e jurídica, pois reforça a proteção do trabalhador em situações de redução da capacidade auditiva decorrente do labor, mesmo que em grau inferior ao previsto em atos normativos, como as tabelas técnicas adotadas administrativamente. A decisão fortalece a prevalência da lei sobre regulamentos infralegais, resguardando o direito fundamental à seguridade social. No campo prático, a tese impede o indeferimento automático do benefício com base exclusiva em critérios quantitativos mínimos estabelecidos por tabelas administrativas, obrigando a análise concreta dos elementos do caso concreto e promovendo maior justiça social. O entendimento possui potencial de impactar positivamente inúmeros processos judiciais e administrativos, servindo de referência para a uniformização e racionalização da jurisprudência nacional.
ANÁLISE CRÍTICA
O fundamento jurídico da decisão está alicerçado no respeito à hierarquia das normas e na interpretação teleológica da legislação previdenciária, que visa à efetiva proteção do segurado. A argumentação do acórdão é robusta ao distinguir entre reexame de provas (vedado em recurso especial) e valoração jurídica do conjunto probatório (permitida), afastando a aplicação da Súmula 7/STJ. A consequência prática da decisão é a ampliação do acesso ao benefício de auxílio-acidente para trabalhadores que, embora apresentem perda auditiva abaixo dos limites das tabelas técnicas, demonstrem efetiva redução da capacidade laborativa relacionada ao trabalho. Juridicamente, o precedente impede que critérios meramente quantitativos restrinjam direitos sociais previstos em lei, consolidando a jurisprudência em favor dos hipossuficientes e promovendo a função social do Direito Previdenciário.