Impugnação à inscrição em dívida ativa de valores indevidamente recebidos em benefício previdenciário com fundamento na inadequação da execução fiscal e necessidade de ação de enriquecimento ilícito

Documento que argumenta contra a inscrição em dívida ativa para cobrança de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, destacando que a cobrança deve ocorrer por meio de ação civil de enriquecimento ilícito e não por execução fiscal baseada em Certidão de Dívida Ativa (CDA), devido à ausência de previsão legal específica.


TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:

À míngua de lei expressa, a inscrição em dívida ativa não é a forma de cobrança adequada para os valores indevidamente recebidos a título de benefício previdenciário, que devem submeter-se à ação de cobrança por enriquecimento ilícito para apuração da responsabilidade civil, sendo incabível a execução fiscal com base em Certidão de Dívida Ativa (CDA) para tal finalidade.

COMENTÁRIO EXPLICATIVO

O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que, na ausência de previsão legal específica, não é possível ao INSS inscrever em dívida ativa valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário, ainda que decorrentes de dolo, fraude ou má-fé. Tais valores não se enquadram no conceito de dívida ativa não tributária, não havendo título executivo extrajudicial legítimo para fundamentar a execução fiscal. O ressarcimento deve ser buscado mediante ação judicial própria, na qual serão assegurados o contraditório e a ampla defesa ao devedor, e apenas após o trânsito em julgado da sentença condenatória será possível a execução dos valores. A tentativa de cobrança por via administrativa e posterior execução fiscal afronta o devido processo legal, pois presume a responsabilidade civil sem oportunizar defesa prévia ao suposto infrator.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

  • CF/88, art. 5º, incisos LIV e LV – Princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

FUNDAMENTO LEGAL

  • Lei 8.213/91, art. 115, II e §1º – Limita-se a prever descontos nos próprios benefícios, não autorizando inscrição em dívida ativa.
  • Decreto 3.048/99, art. 154, §2º e §4º, II – Regulamenta hipóteses de desconto e restituição, porém extrapola a lei ao determinar inscrição em dívida ativa.
  • Lei 6.830/80, art. 2º – Define as hipóteses de execução fiscal, restrita a créditos certos, líquidos e exigíveis, fundados em lei.
  • Lei 4.320/64, art. 39, §2º – Estabelece o conceito de dívida ativa não tributária.
  • CCB/2002, arts. 876, 884 e 885 – Tratam do enriquecimento ilícito, fundamento material para a ação condenatória.

SÚMULAS APLICÁVEIS

  • Súmula 83/STJ – Aplica-se entendimento consolidado do STJ quanto à inviabilidade da execução fiscal para cobrança de valores pagos indevidamente a título de benefício previdenciário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tese reafirma a necessidade de respeito ao devido processo legal em matéria de cobrança de valores pagos indevidamente pela Administração Pública, especialmente quando envolvem verbas de natureza alimentar e direitos sociais. A decisão preserva garantias fundamentais do cidadão, impedindo que o Estado, por simples ato administrativo, constitua título executivo apto a constrição patrimonial, sem prévia sentença judicial. O entendimento fortalece a segurança jurídica, limita o poder sancionador estatal e reforça a distinção entre as hipóteses de inscrição em dívida ativa de servidores públicos (disciplinadas por lei especial) e de particulares. Os reflexos futuros da tese incluem a padronização de procedimentos pelo INSS e demais entes federativos, além de evitar execuções fiscais indevidas, com potenciais impactos na redução de litigiosidade e de nulidades processuais em execuções fiscais ajuizadas em desconformidade com o entendimento ora consolidado.

ANÁLISE CRÍTICA

A decisão do STJ apresenta fundamentação sólida ao distinguir créditos decorrentes de responsabilidade civil (enriquecimento ilícito) daqueles tipificados como dívida ativa não tributária, exigindo título executivo judicial para a cobrança daqueles. A argumentação jurídica é coerente com os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, além de observar a taxatividade das hipóteses de execução fiscal previstas em lei. A consequência prática mais relevante é a impossibilidade de constrição patrimonial do beneficiário sem sentença condenatória transitada em julgado, prevenindo arbitrariedades e promovendo o devido processo legal. A tese baliza a atuação administrativa dos órgãos previdenciários e evita a formação unilateral de títulos executivos em hipóteses não previstas em lei, promovendo segurança jurídica e previsibilidade na atuação estatal.