Impossibilidade de desistência recursal após início do julgamento do Recurso Especial representativo da controvérsia conforme art. 543-C do CPC devido à prevalência do interesse público
Modelo de fundamentação jurídica que aborda a inviabilidade da desistência recursal quando o procedimento de julgamento do Recurso Especial representativo da controvérsia já foi iniciado, destacando a prevalência do interesse público e coletivo sobre o interesse individual da parte, conforme o artigo 543-C do Código de Processo Civil.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
É inviável o acolhimento de pedido de desistência recursal formulado quando já iniciado o procedimento de julgamento do Recurso Especial representativo da controvérsia, na forma do art. 543-C do CPC, em razão da prevalência do interesse público e coletivo sobre o interesse individual da parte recorrente.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
O acórdão da Corte Especial do STJ, ao analisar pedido de desistência em recurso especial submetido ao regime dos recursos repetitivos, enfatiza que a sistemática dos incidentes de recursos repetitivos foi criada justamente para conferir efetividade à duração razoável do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII) e isonomia na solução de demandas massificadas. A desistência, após o início do procedimento coletivo, comprometeria não apenas o desfecho do caso concreto, mas todo o sistema, pois exigiria a repetição de fases processuais de abrangência nacional, prejudicando milhares de jurisdicionados com demandas idênticas.
Destaca-se que o interesse coletivo na fixação de tese jurídica prevalece sobre o interesse individual do recorrente, que não pode dispor de uma questão que ultrapassa sua esfera subjetiva, sob pena de manipulação do sistema jurisdicional e de afronta à dignidade da Justiça.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
CF/88, art. 5º, LXXVIII – “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
CF/88, art. 103-A, §1º – “Os tribunais poderão, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.
FUNDAMENTO LEGAL
CPC/1973, art. 501 – “O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso.”
CPC/1973, art. 543-C (introduzido pela Lei 11.672/2008) – “O relator, após selecionar recurso especial que contenha questão de direito relevante, submetê-lo-á à apreciação do órgão colegiado competente, que decidirá a respeito da controvérsia repetitiva, que servirá de orientação para os demais casos idênticos.”
Resolução 8/2008 do STJ – Dispõe sobre o procedimento dos recursos repetitivos.
SÚMULAS APLICÁVEIS
Não há súmulas do STJ ou STF diretamente aplicáveis à tese de indeferimento de desistência após iniciado o procedimento do recurso repetitivo. Contudo, a jurisprudência consolidada na Corte Especial, especialmente nos EREsp 218.426/SP, orienta no mesmo sentido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A decisão em análise é de elevada relevância sistêmica, pois reforça a natureza pública e coletiva dos recursos repetitivos, blindando-os contra tentativas de esvaziamento processual por meio de desistências em momentos processuais críticos.
Ao privilegiar o interesse coletivo, o STJ assegura a função institucional dos tribunais superiores na uniformização da jurisprudência e na racionalização da prestação jurisdicional, prevenindo manipulações estratégicas que poderiam inviabilizar o enfrentamento de teses de repercussão nacional.
Como consequência prática, parte recorrente em recurso repetitivo não pode mais dispor livremente de seu interesse recursal após instaurado o procedimento de julgamento coletivo, sob pena de prejudicar a coletividade de jurisdicionados e comprometer a celeridade e efetividade processual.
A decisão pode impactar futuras tentativas de desistência em demandas coletivizadas, inclusive em outros ritos que envolvam incidência de interesses metaindividuais, e serve de paradigma para o tratamento de incidentes processuais de massa em todo o Poder Judiciário.
Criticamente, a fundamentação do acórdão equilibra de modo adequado os valores constitucionais da razoável duração do processo, isonomia e acesso à justiça, além de harmonizar a autonomia da vontade processual com os limites impostos pelo interesse público, evitando distorções e garantindo a funcionalidade do sistema de precedentes.