Exclusão da responsabilidade objetiva de instituição financeira em caso de golpe do leilão falso via conta digital com cumprimento das normas do Banco Central
Análise da ausência de responsabilidade objetiva de instituição financeira por danos causados por golpe do leilão falso em conta digital, considerando o cumprimento dos procedimentos normativos do Banco Central para abertura, manutenção de contas, verificação de identidade, e prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
Não há responsabilidade objetiva de instituição financeira por danos decorrentes de “golpe do leilão falso” praticado por meio de conta digital, quando comprovado que o banco cumpriu adequadamente os procedimentos exigidos pelas normas do Banco Central para abertura e manutenção de contas, especialmente quanto à verificação e validação da identidade e qualificação do titular, bem como à prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
A decisão do Superior Tribunal de Justiça, no âmbito do Recurso Especial n. Acórdão/STJ, firmou entendimento relevante quanto à extensão da responsabilidade civil objetiva das instituições financeiras em casos de fraudes praticadas por terceiros — notadamente golpes envolvendo contas digitais criadas em bancos digitais. O julgado ponderou que, embora as instituições financeiras respondam objetivamente por danos oriundos de fortuito interno (Súmula 479/STJ), tal responsabilidade não é absoluta, devendo ser aferida à luz do cumprimento dos deveres regulatórios específicos. O banco digital, ao demonstrar que observou rigorosamente os procedimentos previstos na Resolução 4.753/19 do Banco Central do Brasil e demais normas pertinentes, não pode ser responsabilizado por fraudes perpetradas por terceiros, caso não haja prova de defeito na prestação do serviço ou de descumprimento das normas aplicáveis.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
CF/88, art. 5º, incisos V e X – direito à reparação por danos e direito à inviolabilidade da honra e da vida privada.
CF/88, art. 170, V – defesa do consumidor e responsabilidade pelo risco da atividade econômica.
FUNDAMENTO LEGAL
CDC, art. 14, §3º, II – exclusão da responsabilidade quando comprovada culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros.
CCB/2002, art. 927, parágrafo único – responsabilidade objetiva em atividades de risco.
Resolução BACEN 4.753/19 – requisitos para abertura e manutenção de contas digitais.
Lei 9.613/98 – prevenção à lavagem de dinheiro.
SÚMULAS APLICÁVEIS
Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”
(Observação: a súmula foi analisada, mas considerada inaplicável ao caso concreto, dada a ausência de defeito na prestação do serviço.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese reafirma que a responsabilidade civil objetiva das instituições financeiras por fraudes bancárias não é absoluta, devendo ser afastada quando comprovado o cumprimento integral das normas regulatórias. A decisão privilegia a segurança jurídica e evita o risco de imputar às instituições financeiras uma espécie de responsabilidade automática e ilimitada, que poderia desestimular a expansão do sistema bancário digital e a inclusão financeira. Em termos práticos, o julgado orienta bancos digitais e tradicionais a manter documentação robusta que comprove o rigor nos procedimentos de identificação e prevenção a ilícitos, sob pena de responsabilidade. Para os consumidores, alerta-se para a necessidade de cautela em operações realizadas por meios eletrônicos, sobretudo em ambientes não verificados. No horizonte, a tese pode influenciar futuras discussões sobre a delimitação do fortuito interno nas relações bancárias digitais, bem como estimular o aprimoramento contínuo dos mecanismos de segurança nas instituições financeiras, sem, contudo, impor-lhes obrigações além do que determina a regulação estatal.
ANÁLISE CRÍTICA
O fundamento jurídico da decisão encontra-se solidamente amparado na legislação consumerista e civil, bem como nas normas regulatórias do Banco Central. A argumentação destaca a necessidade de distinguir entre responsabilidade objetiva e culpa exclusiva de terceiros, evitando a responsabilização automática do banco em situações em que a prestação do serviço se deu de modo regular. Do ponto de vista processual, ressalta-se a inversão do ônus da prova, cabendo ao banco demonstrar o cumprimento das normas – o que foi realizado nos autos. Em termos materiais, a decisão equilibra a proteção do consumidor e a razoabilidade na distribuição dos riscos no ambiente bancário digital. As consequências práticas da tese são relevantes: evita-se o chamado “risco integral” para as instituições financeiras, encorajando a inovação e a bancarização digital, sem abrir mão da proteção ao consumidor, desde que comprovada a regularidade dos procedimentos internos.