Responsabilidade do endossatário por danos decorrentes de protesto indevido em título de crédito com vício formal e ausência de causa para emissão de duplicata
Documento que aborda a responsabilidade civil do endossatário que recebe título de crédito com vício formal, destacando que ele responde por danos causados por protesto indevido, com direito de regresso contra endossantes e avalistas.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
O endossatário que recebe, por endosso translativo, título de crédito contendo vício formal, sendo inexistente a causa para conferir lastro à emissão de duplicata, responde pelos danos causados diante de protesto indevido, ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
A tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça distingue de modo técnico e preciso as situações envolvendo a circulação de duplicatas por endosso translativo. Ao receber duplicata carente de causa (isto é, sem negócio jurídico subjacente que lhe confira legitimidade), o endossatário — em geral, uma instituição financeira — assume a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes do protesto indevido, como a inclusão do nome do sacado em órgãos de proteção ao crédito. O fundamento reside em que se trata de vício formal intrínseco ao título, o qual não se convalida pela mera circulação. Contudo, preserva-se o direito de regresso do endossatário contra os endossantes e avalistas, permitindo que a responsabilidade seja, em última análise, atribuída a quem deu causa ao vício.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
CF/88, art. 5º, incisos V e X — direito à indenização por dano material e moral e proteção à honra e à imagem.
FUNDAMENTO LEGAL
- Lei 5.474/68, art. 2º — a duplicata só pode ser emitida em razão de venda mercantil ou prestação de serviços.
- Lei 5.474/68, art. 13, §4º — exigência de protesto para exercício do direito de regresso.
- CPC/2015, art. 543-C — sistemática dos recursos repetitivos (aplicável à época da decisão pelo CPC/1973, então vigente).
- CCB/2002, art. 186 — responsabilidade civil por ato ilícito.
- CP, art. 172 — emissão de duplicata simulada como crime.
SÚMULAS APLICÁVEIS
- Súmula 54/STJ — juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.
- Súmula 362/STJ — correção monetária incide a partir do arbitramento da indenização por dano moral.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese reafirma a importância da responsabilidade objetiva do endossatário no manejo e circulação de títulos de crédito, especialmente em operações bancárias de desconto de duplicatas. Ao delimitar a responsabilização pelo protesto indevido de duplicata sem lastro, o STJ protege o sacado contra prejuízos decorrentes da circulação de títulos viciados, reforçando a necessidade de diligência por parte das instituições financeiras. A decisão tem relevante impacto para o sistema bancário e para o comércio, pois incentiva maior rigor na verificação da regularidade dos títulos, desestimulando práticas abusivas ou negligentes que podem gerar constrangimentos e danos patrimoniais e extrapatrimoniais. Ressalte-se, ainda, que a tese não afasta o direito de regresso do endossatário, resguardando o equilíbrio na cadeia cambial. O entendimento pode produzir reflexos significativos em futuras demandas envolvendo títulos de crédito e responsabilidade civil, fortalecendo pilares de segurança jurídica, boa-fé objetiva e proteção ao crédito no ambiente negocial.
ANÁLISE CRÍTICA
A decisão examina de forma criteriosa a diferença entre vícios formais (que acompanham o título em toda a sua circulação) e exceções pessoais (inoponíveis ao endossatário de boa-fé). O STJ rechaça a aplicação da abstração cambiária para legitimar a circulação de duplicatas sem causa, alinhando-se à natureza eminentemente causal desse título. A argumentação demonstra evolução jurisprudencial no sentido de coibir o protesto indevido e responsabilizar o agente que, por negligência ou interesse, aceita e protesta título irregular, mesmo que não tenha sido o causador direto do vício. Na perspectiva prática, reforça-se a necessidade de due diligence bancária e o dever de cuidado no recebimento de duplicatas, sob pena de responsabilização civil. Por outro lado, a manutenção do direito de regresso equilibra a equação jurídica, desestimulando aventuras processuais e incentivando a responsabilização do agente originário do vício. Em síntese, a decisão contribui para uma maior segurança nas relações comerciais, sem vulnerar os princípios do direito cambiário, mas protegendo o sacado diante de práticas indevidas no mercado de títulos de crédito.