Limitação do cabimento da reclamação ao STJ contra aplicação de precedente qualificado e orientação sobre vias recursais adequadas para controvérsias

Documento esclarece a impossibilidade de utilização da reclamação ao Superior Tribunal de Justiça para questionar a aplicação, pelos tribunais de origem, de precedente qualificado (tese firmada em recurso especial repetitivo), destacando que eventuais divergências devem ser resolvidas por meio das vias recursais ordinárias, e não pela via reclamatória.


TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:

É incabível a reclamação ao Superior Tribunal de Justiça para controle da aplicação, pelos tribunais de origem, de precedente qualificado (tese firmada em recurso especial repetitivo), devendo eventuais desacordos quanto à correta aplicação ser dirimidos pelas vias recursais ordinárias, e não pela via reclamatória.

COMENTÁRIO EXPLICATIVO

A decisão reafirma a hermenêutica consolidada na Corte Especial do STJ quanto à inadmissibilidade da reclamação para impugnar a aplicação, por tribunais de origem, de teses jurídicas estabelecidas em recursos especiais repetitivos. O instrumento da reclamação, nesse contexto, não se presta ao controle do acerto da subsunção do precedente à situação fática do caso concreto. Tal entendimento decorre da modificação legislativa promovida pela Lei 13.256/2016, que restringiu o cabimento da reclamação, excluindo expressamente a hipótese de controle da observância de acórdão em recursos repetitivos, mantendo-a apenas para precedentes oriundos de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR).

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

  • CF/88, art. 105, I, "f" – Competência do STJ para julgar reclamações para preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões.

FUNDAMENTO LEGAL

  • CPC/2015, art. 988, IV (com a redação dada pela Lei 13.256/2016) – Estabelece as hipóteses de cabimento da reclamação, restringindo-a para assegurar a observância de acórdão proferido em IRDR, excluindo os recursos repetitivos.
  • CPC/2015, art. 928 – Define os precedentes obrigatórios, abrangendo IRDR e recursos repetitivos, mas com tratamento diferenciado para fins de reclamação.
  • Lei 13.256/2016 – Alterou o regime da reclamação judicial, restringindo hipóteses de cabimento.

SÚMULAS APLICÁVEIS

  • Não há súmula específica do STJ ou STF aplicável diretamente à tese, mas a orientação é reiterada pela jurisprudência da Corte Especial do STJ, notadamente nos julgados:
    - Rcl Acórdão/STJ, rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 6/3/2020;
    - AgInt na Rcl Acórdão/STJ, rel. Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, DJe 31/8/2023.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tese reafirma a autonomia das instâncias ordinárias para a adequada subsunção dos precedentes qualificados (especialmente aqueles oriundos de recursos especiais repetitivos) às circunstâncias concretas do caso, reservando ao STJ apenas o papel de uniformizador, e não de revisor casuístico, da interpretação de lei federal. Essa diretriz busca racionalizar o sistema de precedentes obrigatórios e evitar a sobrecarga das Cortes Superiores com demandas que, na essência, são de reapreciação da matéria fática ou de sua subsunção ao precedente. O efeito prático é conferir maior segurança jurídica e eficiência ao sistema recursal, mesmo que possa ocasionar, pontualmente, decisões divergentes nas instâncias inferiores. O entendimento fortalece o mecanismo dos recursos especiais repetitivos como técnica de uniformização do direito, mas limita seu controle à via recursal ordinária, preservando o desenho constitucional e legal do sistema de precedentes.

ANÁLISE CRÍTICA

O fundamento jurídico da decisão repousa na interpretação restritiva do art. 988, IV, do CPC/2015, após a alteração promovida pela Lei 13.256/2016. A argumentação do acórdão é sólida ao destacar que a exclusão da reclamação para controle de recursos repetitivos foi uma opção de política judiciária, visando a desafogar as Cortes de Superposição. Consequentemente, a admissibilidade de reclamação ficou limitada às hipóteses expressamente previstas no texto legal, não admitindo ampliação por analogia ou por construção judicial. O acórdão também ressalta que eventual discordância quanto à aplicação do precedente deve ser veiculada por meio dos meios recursais ordinários, inclusive com a possibilidade de agravo interno nas instâncias locais.

A consequência prática mais relevante é a clara delimitação do papel das Cortes Superiores, que, embora sejam responsáveis pela uniformização da interpretação da lei federal, não atuam como terceira instância para reanálise de fatos e provas ou de aplicação individualizada de precedentes. O precedente contribui para uma distribuição mais racional das competências jurisdicionais e para a celeridade processual, ainda que implique a necessidade de os jurisdicionados estruturarem sua atuação recursal de modo mais estratégico, atentando-se para a correta utilização dos instrumentos processuais disponíveis.