Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 261.2344.9674.2712

1 - TJDF JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. FRAUDE BANCÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. OPERAÇÕES BANCÁRIAS REALIZADAS DO TERMINAL DE ELETRÔNICO DE AUTOATENDIMENTO DA AGÊNCIA. NEGLIGÊNCIA POR PARTE DO CONSUMIDOR. REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO ORIENTADO PELO FRAUDADOR. PERFIL DO CLIENTE. MOVIMENTAÇÃO ABSOLUTAMENTE ATÍPICA. FALHA NO DEVER DE SEGURANÇA DO BANCO. CULPA CONCORRENTE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.I. Caso em exame1. Trata-se de recurso inominado interposto pelo réu em face da sentença (ID 69584523) proferida pelo Juízo do 6º Juizado Especial Cível de Brasília que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para «CONDENAR A PARTE REQUERIDA, a restituir à autora a quantia de R$ 11.950,00, atualizada monetariamente pelo IPCA desde o evento danoso (01/02/2023) e acrescida de juros de 1% ao mês a partir da citação (15/09/2024); DECLARO a nulidade do contrato de empréstimo (quitado) realizado, no valor de R$ 52.725,00 (cinquenta e dois mil setecentos e vinte e cinco reais), com a consequente desconstituição de todos os débitos consectários (parcelas, mensais e encargos); CONDENO a parte requerida ao ressarcimento das parcelas vertidas pela autora para pagamento do empréstimo de R$ 8.621,36, correspondente ao período entre 01/4/2023 a 20/08/2024. Serão ainda acrescidas as vencidas no curso da ação, na forma do CPC, art. 323, com abatimento de 50% pela culpa concorrente. Incidirá correção monetária pelo IPCA mês a mês e juros de mora de 1% a.m desde a citação (15/09/2024)".2. Recurso próprio e tempestivo (ID 69584525). Custas e preparo recolhidos.3. Em suas razões recursais, o recorrente suscita preliminarmente sua ilegitimidade passiva para o feito. No mérito, sustenta que o autor foi vítima de sua própria negligência, não tendo o banco réu em nada contribuído para o golpe sofrido. Aduz que a situação se deu por fato exclusivo de terceiro, o que afasta o nexo de causalidade. Afirma que a situação caracteriza caso fortuito externo, que exclui a responsabilidade do recorrente. Alega que o fato se deu por culpa exclusiva da vítima, não tendo havido qualquer falha na prestação dos serviços por parte do réu. Relata que as operações foram realizadas atendendo todos os requisitos legais e de segurança, não podendo o banco réu bloqueá-las, sob pena de causar prejuízo ao cliente. Acrescenta que não pode a instituição financeira adentrar a intimidade de seus clientes e fiscalizar uma operação que seguiu todos as normas legais de segurança. Menciona que a restituição de valores ao autor configura locupletamento ilícito, uma vez que o banco não concorreu para o golpe sofrido. Indica a necessidade de manifestação sobre os dispositivos citados para fins de prequestionamento. Pede a concessão de efeito suspensivo ao recurso bem como o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva suscitada, com a extinção do processo sem julgamento do mérito, ou, não sendo o caso, a reforma da sentença, com a improcedência do pedido inicial.4. Em contrarrazões (ID 69584534), a recorrida refuta as alegações do recorrente e pugna pelo desprovimento do recurso.II. Questão em discussão5. Saber se a situação decorreu de culpa exclusiva da vítima ou de terceiros, com a exclusão da responsabilidade da instituição financeira ré.III. Razões de decidir6. Pedido de efeito suspensivo. No sistema dos juizados especiais, a concessão de efeito suspensivo ao recurso ocorre excepcionalmente, nos casos em que é demonstrada a presença de dano irreparável ou de difícil reparação, circunstância não verificada no caso concreto. Pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso rejeitado.7. Preliminar de ilegitimidade passiva. À luz da teoria da asserção, as condições da ação são aferidas em abstrato, considerando-se as assertivas da parte autora na petição inicial e o cabimento, em tese, do provimento jurisdicional almejado. No caso, a parte autora alega que a fraude decorreu de falha na prestação do serviço por parte do banco réu, razão pela qual este é parte legítima a figurar no polo passivo da presente demanda. A análise da eventual responsabilidade pelos fatos narrados conduz à apreciação do mérito, a ser oportunamente analisado. Preliminar rejeitada.8. A relação entabulada entre as partes é nitidamente de consumo, porquanto presentes as figuras do consumidor e do fornecedor de serviços, estando, portanto, sujeita às disposições do CDC (Lei 8.078/90) .9. Nos termos do CDC, art. 14, a responsabilidade do fornecedor de serviços é objetiva, respondendo pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, independentemente da existência de culpa e de dolo. Tal responsabilidade será excluída se provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou que o fato ocorreu por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.10. No caso dos autos, não obstante as alegações do recorrente, tenho que a fraude decorreu de culpa concorrente da vítima e do réu, ora recorrente, não havendo falar em culpa exclusiva da vítima ou de terceiro ou hipótese de fortuito externo.11. Com efeito, as operações bancárias contestadas foram realizadas pela autora no terminal eletrônico de autoatendimento da agência 3606-4 do banco réu, seguindo a orientação passada, pelo telefone, pelos fraudadores. Embora seja fato incontroverso nos autos que a autora tenha sido vítima de golpe perpetrado por terceiros, o êxito da fraude somente ocorreu em virtude de falha na segurança bancária do réu, que permitiu a realização de transações absolutamente fora do perfil de movimentação bancária da autora, tendo em vista os expressivos valores envolvidos (transferência bancária no valor de R$ 23.900,00 e empréstimo bancário no valor de R$ 52.725,00), e, ao que consta, fora inclusive do limite de crédito da autora à época dos fatos. Vale lembrar que, conforme recente decisão do STJ (REsp. Acórdão/STJ), a movimentação bancária completamente atípica deve ser objeto de identificação pelo banco.12. Por outro lado, o golpe somente foi bem sucedido em razão da negligência da autora, que não agiu com a cautela necessária para checar a origem da ligação telefônica recebida e seguiu as orientações passadas pelo fraudador, sem qualquer verificação prévia.13. Assim, patente a culpa concorrente de ambas as partes, estas devem suportar igualmente o prejuízo material, não merecendo qualquer reparo a sentença.14. Nesse sentido: Acórdão 1857559, 07150717820238070016, Relator(a): FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, Primeira Turma Recursal, data de julgamento: 3/5/2024, publicado no DJE: 16/5/2024. Pág.: Sem Página Cadastrada. Acórdão 1878955, 07008075820248070004, Relator(a): SILVANA DA SILVA CHAVES, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 17/6/2024, publicado no DJE: 26/6/2024. Pág.: Sem Página Cadastrada. Acórdão 1844136, 07049035920238070002, Relator(a): MARCO ANTONIO DO AMARAL, Terceira Turma Recursal, data de julgamento: 8/4/2024, publicado no DJE: 22/4/2024. Pág.: Sem Página Cadastrada.15. Por fim, quanto ao pedido de manifestação para fins de prequestionamento, dá-se por prequestionada a matéria, visto não ser necessário fazer uma manifestação específica sobre os dispositivos citados pelo recorrente. Cabe ao órgão julgador expor sua compreensão sobre o assunto e fornecer a devida fundamentação (art. 93, IX, CF/88).IV. Dispositivo e tese16. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Condeno o recorrente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099, de 26.09.1995.17. A súmula de julgamento servirá de acórdão, conforme regra da Lei 9.099/95, art. 46.Tese de julgamento: «Em se tratando de fraude bancária, patente a culpa concorrente de ambas as partes (negligência do autor, ao seguir a orientação do fraudador, e falha no sistema de segurança do réu, ao permitir a realização de transações absolutamente fora do perfil de movimentação bancária do autor), estas devem suportar igualmente o prejuízo material".

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