Ação penal pública condicionada à representação da vítima em crimes de lesão corporal leve contra mulher no contexto doméstico e familiar
Documento aborda a natureza da ação penal nos crimes de lesão corporal leve praticados contra a mulher no ambiente doméstico e familiar, destacando que a persecução penal depende da representação da vítima para seu início.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
Nos crimes de lesão corporal leve cometidos em detrimento da mulher no âmbito doméstico e familiar, a ação penal é pública condicionada à representação da vítima.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento representativo da controvérsia, consolidou o entendimento de que, após o advento da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), a persecução penal dos crimes de lesão corporal leve praticados no contexto doméstico ou familiar contra a mulher depende da representação da ofendida como condição de procedibilidade da ação penal. Essa posição decorre da análise sistemática dos arts. 12, I, e 16 da Lei Maria da Penha, os quais preveem expressamente a possibilidade de representação e de retratação pela vítima desses delitos, indicando a vontade do legislador de não afastar o regime de ação penal pública condicionada nesses casos, mesmo com a vedação à aplicação dos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95 (art. 41).
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
CF/88, art. 226, §8º (proteção à família e criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações);
CF/88, art. 5º, I (igualdade entre homens e mulheres).
FUNDAMENTO LEGAL
Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), arts. 12, I, 16 e 41;
CP, art. 129, §9º;
CPP, art. 38;
Lei 9.099/95, art. 88.
SÚMULAS APLICÁVEIS
Não há súmulas específicas do STF ou STJ sobre a matéria, mas a decisão possui caráter repetitivo e vinculante em seu âmbito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese é de fundamental relevância para a proteção dos direitos da mulher e integridade da família, pois busca equilibrar a necessidade de repressão à violência doméstica com a autonomia da vítima para decidir quanto ao prosseguimento da ação penal. O entendimento evita que o processo penal seja um instrumento de revitimização, ao mesmo tempo que mantém mecanismos protetivos e de responsabilização. A exigência de representação não significa impunidade, mas sim respeito à vontade livre da mulher, desde que essa vontade seja manifestada de forma espontânea, sob supervisão judicial. O reflexo prático é a necessidade de atuação célere das autoridades para garantir audiências de retratação e a verificação de eventual coação ou constrangimento, prevenindo fraudes processuais. No plano jurisprudencial, a decisão baliza a atuação em todo o território nacional, sendo parâmetro para juízes e órgãos de persecução penal.
ANÁLISE CRÍTICA
A argumentação jurídica fundamenta-se na interpretação sistemática e teleológica da Lei Maria da Penha, privilegiando a proteção da mulher e a preservação da família sem desconsiderar sua autonomia. A opção por condicionar a ação penal à representação da vítima impede que o Estado atue de forma paternalista, subtraindo da mulher a capacidade de autodeterminação. Contudo, a decisão exige do Judiciário atenção redobrada à voluntariedade da manifestação da vítima, evitando situações de coação ou dependência, que historicamente dificultam a responsabilização dos agressores. Juridicamente, a tese reforça o papel do Ministério Público e do Judiciário na fiscalização da regularidade do procedimento e na efetiva proteção dos direitos fundamentais. Praticamente, pode contribuir para maior número de denúncias espontâneas e para a personalização da resposta estatal a cada caso concreto.