Jurisprudência Selecionada
1 - STF Ações diretas de inconstitucionalidade. Emenda Constitucional 45/2004, art. 1º. Inserção do, V-A e do § 5º ao CF/88, art. 109. Incidente de deslocamento de competência. Julgamento conjunto com a ADI 3.493. Alegações de ilegitimidade ativa. Preliminares rejeitadas. Medida processual excepcional e subsidiária. Transferência de feitos da Justiça Estadual para a Justiça Federal. Fórmula escolhida pelo poder reformador. Alternativa à previsão de competência geral e aberta. Preservação da competência da Justiça Estadual. Grave violação dos direitos humanos. Ilícito civil ou penal. Proteção do Estado Brasileiro. Responsabilidade internacional. União como ente central e garante. Risco de descumprimento de obrigações previstas em tratados e convenções internacionais. Possibilidade de agir internamente. Interesse expresso da União. Inexistência de ofensa ao pacto federativo e à autonomia dos órgãos judiciários. Caráter nacional e de unidade do Poder Judiciário. Não violação do princípio do juiz natural. Intangibilidade das regras de competência. Não ocorrência. Máxima legitimidade institucional do Procurador-Geral da República. Inexistência de faculdade ou de discricionariedade. Dever-poder de suscitar o incidente. Crivo do STJ. Critérios técnicos. Ofensa ao princípio da legalidade (reserva legal). Não ocorrência. Desnecessidade de noma regulamentadora. Inexistência de ofensas à legalidade, à segurança jurídica, ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa, bem como à garantia constitucional do tribunal do júri. Pedido improcedente.
1. A aptidão da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para inaugurar o controle abstrato de normas foi, por diversas vezes, chancelada pela Suprema Corte, dada a adequação da instituição ao previsto no CF/88, art. 103, IX. Precedentes. Satisfeito, também, o requisito da pertinência temática, uma vez que à AMB compete a defesa das prerrogativas e dos interesses da magistratura em âmbito nacional. 2. Em relação à Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (ANAMAGES), há a peculiaridade de que o dispositivo impugnado veicula forma de deslocamento de competência processual da Justiça Estadual para a Justiça Federal, cuja aplicação interfere diretamente na órbita específica de interesse da magistratura estadual. Está configurada, pois, sua legitimidade ativa e a relação de pertinência entre o objeto da ação e suas finalidades institucionais, que é, em suma, a de representar os magistrados estaduais em âmbito nacional. 3. Nos termos da previsão expressa da CF/88, art. 60, § 4º, não é vedado ao poder constituinte derivado toda e qualquer restrição às chamadas cláusulas pétreas, mas somente aquelas que atinjam núcleo essencial desses limites materiais vedam-se as propostas de emendas tendentes a abolir as cláusulas pétreas. 4. A fórmula escolhida pelo poder reformador para o transporte à Justiça Federal dos feitos em que haja violação grave dos direitos humanos foi o incidente de deslocamento, e não a previsão de uma competência geral e aberta. 5. A criação do instituto representa a adoção de mecanismo de equacionamento jurídico da problemática da ineficiência do aparato estatal de repressão às graves violações dos direitos humanos, tendo presente, especialmente, o papel da União como garante, em nível interno e externo, dos compromissos internacionais firmados pelo Estado Brasileiro na seara dos direitos humanos (art. 21, I; art. 49, I; e CF/88, art. 84, VIII). 6. As disposições ora impugnadas buscam permitir que a União, além da responsabilidade internacional, passe a ter também a responsabilidade de agir internamente nos casos de grave violação de direitos humanos, em cumprimento ao disposto no art. 28 da Convenção Americana de Direitos Humanos. 7. A mera modificação das regras de competência jurisdicional não enseja ofensa ao pacto federativo ou a qualquer cláusula de autonomia dos órgãos judiciários locais, porquanto o Poder Judiciário é pautado, no desempenho de sua função precípua, pelo caráter nacional e de unidade, a despeito da diversidade de organização administrativa. 8. A competência da «Justiça Estadual na feição dada pelo constituinte originário é residual. Nesse passo, a atribuição à Justiça Federal da tarefa de julgar os processos ligados a graves violações de direitos humanos, por meio do incidente de deslocamento, simplesmente retira parcela de jurisdição antes englobada residualmente ao corpo de competências da magistratura estadual. 9. A Justiça Federal, cujo plexo de competências jurisdicionais está definido na Carta de 1988 (art. 109), é, destarte, instância legitimada e regularmente estruturada em nível constitucional. Se é a própria Constituição que estabelece, expressamente, a competência da Justiça Federal, não há óbice de que emenda constitucional disponha sobre o deslocamento de competência em determinados casos. 10. A criação do incidente de deslocamento não agride o princípio do juiz natural sob a vertente de proibição de criação de juízo ex post facto ou direcionado a caso específico, já que se trata de regra abstrata de competência estabelecida previamente ao fato delituoso. As investigações e os processos versados sobre delitos cometidos anteriormente à edição da Emenda Constitucional 45/2004 não podem ser objeto do incidente de deslocamento de competência. 11. A intangibilidade das regras de competência não é parte da cláusula do juiz natural, sob pena de se inviabilizar o próprio exercício da jurisdição e se amesquinhar outras garantias, como a imparcialidade do juízo. 12. A fórmula estampada no texto questionado foi estabelecida de forma abstrata e prévia. O elemento variante é o suporte fático da regra, consistente na «grave violação de direitos humanos e «[n]a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte. 13. Sob o prisma da máxima legitimidade institucional, o Procurador-Geral da República, em consonância com sua importante missão constitucional, entre outras nobres atribuições, tem o dever-poder de suscitar o deslocamento quando preenchidos os requisitos estabelecidos constitucionalmente. Ademais, o juízo do Procurador-Geral da República, em última análise, submete-se ao crivo do colegiado do STJ, cuja apreciação se pauta por critérios jurídicos, e não políticos, o que afasta a alegação de que pode haver arbitrariedade em sua formulação. 14. A expressão «grave violação dos direitos humanos pode ser compreendida como todo atentado de grande monta aos direitos humanos previstos em instrumentos normativos internacionais de proteção a cuja aplicabilidade o Brasil tenha formalmente aderido. Nesse sentido, o conceito em questão, embora não remeta a um rol taxativo e restritivo, é plenamente identificável, na medida em que o rol de direitos deve ser definido com fundamento nas normas consuetudinárias internacionais ou nos tratados e instrumentos normativos internacionais dos quais o Brasil seja signatário. 15. É legítima e imperiosa a aplicabilidade imediata da norma impugnada tão logo seja vigente, uma vez que possui todos os elementos qualificadores necessários a sua incidência. Em verdade, por se tratar de normas concernentes aos direitos humanos, nem sequer se pode esperar uma definição legal. 16. Quanto à observância das demais cláusulas do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, ressalta-se que os investigados ou acusados participam do processamento do incidente, oferecendo suas razões. Além disso, gozam as partes de todas as prerrogativas processuais definidas nas normas constitucionais e processuais, independentemente de tramitar o processo na Justiça Estadual ou na Federal. A previsão do deslocamento também não agride a competência do tribunal do júri, já que, na Justiça Federal, também se observa a reserva de jurisdição da corte popular, como previsto no art. 4º do Decreto-lei 253, de 28 de fevereiro de 1967. 17. Pedido julgado improcedente.... ()
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