Reconhecimento de pessoa realizado em desconformidade com art. 226 do CPP viola garantias constitucionais e torna prova ilícita inválida para condenação ou prisão cautelar
Documento aborda a tese doutrinária e fundamentação legal sobre a invalidade do reconhecimento de pessoa quando não observado o procedimento do art. 226 do Código de Processo Penal, destacando a proteção ao devido processo legal, ampla defesa e vedação às provas ilícitas no âmbito do processo penal, conforme entendimento do STF e normativas do CNJ. Enfatiza os impactos práticos e a importância do rigor procedimental para evitar erros judiciais e garantir direitos fundamentais.
TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:
O reconhecimento de pessoa realizado em desconformidade com o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal viola as garantias constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e da vedação às provas ilícitas, sendo inválido para fundamentar condenação ou decretação de prisão cautelar.
COMENTÁRIO EXPLICATIVO
A decisão do Supremo Tribunal Federal reconhece a extrema relevância do procedimento formal de reconhecimento de pessoas, destacando o seu papel como garantia mínima ao investigado ou acusado em processo criminal. O reconhecimento pessoal, segundo a manifestação do relator e dados empíricos colhidos em pesquisas, é um meio de prova essencialmente precário, sujeito a falhas de memória e influências externas, como estereótipos sociais e racismo estrutural. Diante disso, a inobservância do art. 226 do CPP fragiliza o contraditório, a ampla defesa e pode conduzir à produção de provas ilícitas, com graves consequências para o processo penal, inclusive a condenação de inocentes.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL
- CF/88, art. 5º, LIV: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
- CF/88, art. 5º, LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
- CF/88, art. 5º, LVI: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
FUNDAMENTO LEGAL
- CPP, art. 226: Dispõe sobre o procedimento obrigatório para reconhecimento de pessoas, exigindo, dentre outras formalidades, a presença de pessoas semelhantes e a prévia descrição da pessoa a ser reconhecida.
- Resolução CNJ nº 484/2022: Estabelece diretrizes de boas práticas para reconhecimento de pessoas em procedimentos criminais, reforçando o potencial de erro judicial decorrente de reconhecimentos irregulares.
SÚMULAS APLICÁVEIS
- Não há, até o momento, súmulas vinculantes do 1STF ou do STJ que tratem especificamente do reconhecimento de pessoas e da obrigatoriedade do art. 226 do CPP. Contudo, a jurisprudência tem caminhado para o entendimento da nulidade do reconhecimento realizado em desconformidade com o procedimento legal, quando houver prejuízo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A relevância da tese reside na proteção de direitos fundamentais em processos criminais, estabelecendo balizas objetivas para o reconhecimento de pessoas e combatendo práticas discriminatórias e seletivas no âmbito da persecução penal. A obrigatoriedade do procedimento formal não é mero formalismo, mas garante isonomia, segurança jurídica e respeito ao devido processo legal. O descumprimento do art. 226 do CPP pode resultar na nulidade do ato e, por consequência, na impossibilidade de utilização do reconhecimento como fundamento para restrição de liberdade. Tal entendimento tem potencial para impactar inúmeros processos penais, revisando condenações baseadas exclusivamente em reconhecimentos irregulares e fomentando a adoção de práticas mais seguras e justas no âmbito investigativo e judicial.
ANÁLISE CRÍTICA DOS FUNDAMENTOS E CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS
O acórdão evidencia a necessidade de rigor procedimental como resposta à fragilidade do reconhecimento pessoal, principalmente diante do risco de condenação injusta amparada em provas falhas ou contaminadas por estereótipos sociais. A argumentação sustenta-se em dados concretos (como o estudo da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e as diretrizes do CNJ), demonstrando que a ausência de formalidade no reconhecimento agrava o risco de erros judiciários, sobretudo contra populações vulneráveis e grupos raciais historicamente discriminados.
A adoção da tese fortalece a efetividade dos direitos fundamentais no processo penal brasileiro, aproximando-o de padrões internacionais de proteção. Do ponto de vista prático, poderá resultar em aumento de impugnações a reconhecimentos realizados sem observância do procedimento legal, exigindo do Judiciário maior atenção à regularidade dos atos instrutórios. O reconhecimento da nulidade do ato, salvo quando existam provas independentes e não contaminadas, reforça o caráter excepcional do reconhecimento pessoal como elemento de convencimento judicial.