
Análise dos efeitos da desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal de micro e pequenas empresas com base em fundamentos constitucionais e legais
Estudo detalhado sobre a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal contra micro e pequenas empresas, abordando fundamentos constitucionais, requisitos legais, procedimentos processuais e impactos na responsabilização dos sócios. Inclui modelos de peças processuais para defesa e requerimento do incidente de desconsideração.
Publicado em: 26/07/2025 Processo CivilEmpresaOs efeitos da desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal de micro e pequenas empresas
INTRODUÇÃO
A desconsideração da personalidade jurídica constitui um dos instrumentos mais relevantes do direito processual contemporâneo, especialmente no contexto da execução fiscal movida contra micro e pequenas empresas. Diante das peculiaridades dessas entidades, a utilização desse mecanismo demanda análise criteriosa, tanto sob a ótica dos fundamentos constitucionais quanto dos dispositivos legais específicos, a fim de harmonizar a efetividade da tutela jurisdicional com a preservação do ambiente empreendedor e dos direitos fundamentais dos sócios.
CONCEITO E EVOLUÇÃO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
A personalidade jurídica confere autonomia patrimonial às pessoas jurídicas, permitindo-lhes adquirir direitos e contrair obrigações em nome próprio. Contudo, tal autonomia não é absoluta. O instituto da desconsideração da personalidade jurídica surgiu para coibir fraudes, abusos e desvios de finalidade, possibilitando que os efeitos de determinadas obrigações sejam estendidos aos bens dos sócios ou administradores, desde que presentes os requisitos legais.
Doutrinariamente, a teoria maior, adotada pelo ordenamento brasileiro, condiciona a medida à identificação de abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, conforme expressamente disposto no CCB/2002, art. 50. Já a teoria menor, menos restritiva, aplica-se em hipóteses excepcionais, como em determinadas relações de consumo e ambientais.
FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS
O tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte encontra amparo constitucional, especialmente nos artigos 170 e 179 da Constituição Federal de 1988. Ressalte-se ainda o CF/88, art. 10, §1º, que prevê direitos e garantias às pessoas jurídicas em determinadas situações, resguardando princípios como a livre iniciativa, a função social da empresa e a dignidade da pessoa humana. Tais fundamentos impõem ao Poder Judiciário e à Fazenda Pública o dever de cautela na adoção de medidas que possam comprometer a atividade empresarial e os direitos dos sócios, mormente quando se tratar de execuções fiscais.
FUNDAMENTOS LEGAIS DA DESCONSIDERAÇÃO NA EXECUÇÃO FISCAL
CÓDIGO CIVIL E CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
O CCB/2002, art. 50 estabelece que, em caso de abuso da personalidade jurídica – caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial –, pode o juiz, a requerimento da parte ou do Ministério Público, estender os efeitos das obrigações da pessoa jurídica aos bens dos administradores ou sócios.
No âmbito processual, o CPC/2015, art. 133 a 137 regulamenta o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), aplicável a todos os tipos de processos, inclusive o fiscal, conforme entendimento doutrinário majoritário. O CPC/2015, art. 319 ainda fixa os requisitos essenciais da petição inicial, incluindo o pedido de desconsideração, quando necessário.
LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA E NORMAS CORRELATAS
Ainda que a Lei 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal - LEF) não discipline expressamente o incidente de desconsideração, a aplicação subsidiária do CPC/2015 é amplamente admitida. Ademais, outras normas, como o CPP, art. 12 (no âmbito penal) e o CP, art. 284, §1º, trazem princípios que podem ser utilizados por analogia, especialmente no que tange à responsabilização pessoal e à necessidade de respeito ao devido processo legal.
Em âmbito estadual, a Lei 7.250/2014, art. 50 pode estabelecer regras específicas quanto à responsabilização dos sócios e administradores, reforçando a necessidade de observância dos requisitos legais para a desconsideração.
Ressalte-se, ainda, a previsão do CCB/2002, art. 11, §1º, III, que trata de situações em que a personalidade jurídica pode ser desconsiderada em razão de ilicitude ou fraude.
REQUISITOS E PROCEDIMENTO PARA A DESCONSIDERAÇÃO NA EXECUÇÃO FISCAL
A desconsideração da personalidade jurídica na execução fiscal, especialmente quando dirigida contra micro e pequenas empresas, demanda a observância de requisitos materiais e formais. Do ponto de vista material, é imprescindível a demonstração do abuso de personalidade, mediante prova cabal do desvio de finalidade ou da confusão patrimonial.
Formalmente, o CPC/2015, arts. 133 a 137, aplicáveis subsidiariamente ao processo de execução fiscal, exigem a instauração do incidente processual, com a participação dos sócios ou administradores, assegurando-lhes o contraditório e a ampla defesa, em consonância com o princípio constitucional do devido processo legal (CF/88, art. 5º, LIV e LV).
O pedido de desconsideração pode ser formulado pelo exequente, devendo conter fundamentação fática e jurídica, com indicação dos elementos que ensejam a medida (CPC/2015, art. 319). Após a instauração do incidente, os sócios ou administradores serão citados para se manifestar, podendo apresentar defesa e provas.