
Desafios e fundamentos jurídicos da penhora de ativos digitais na execução fiscal: proteção patrimonial, princípios constitucionais e inovação tecnológica no processo executivo
Análise detalhada dos desafios práticos e jurídicos da penhora de ativos digitais, como criptomoedas, na execução fiscal, com enfoque na proteção patrimonial do executado, fundamentos constitucionais (CF/88, arts. 1º, III, 5º, LIV, LV e XXII), e legislação aplicável (Lei 6.830/1980; Lei 7.250/2014, art. 50; CPC/2015, art. 319), além de recomendações estratégicas para advogados diante das lacunas normativas e inovações tecnológicas.
Publicado em: 14/08/2025 AdvogadoProcesso CivilConsumidorOS DESAFIOS DA PENHORA DE ATIVOS DIGITAIS NA EXECUÇÃO FISCAL: PROTEÇÃO PATRIMONIAL E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
INTRODUÇÃO
A execução fiscal é um dos instrumentos mais relevantes para a efetividade da cobrança de créditos tributários e não tributários pela Fazenda Pública. Contudo, diante da evolução tecnológica e do crescente uso de ativos digitais, notadamente criptomoedas e outros bens intangíveis, o Poder Judiciário e os advogados enfrentam novos desafios quanto à localização, bloqueio e penhora desses bens. O presente artigo visa analisar, sob uma perspectiva constitucional, legal e doutrinária, os principais entraves e soluções práticas relativos à penhora de ativos digitais, especialmente no âmbito da proteção patrimonial e dos limites impostos pela inovação tecnológica.
CONCEITO DE ATIVOS DIGITAIS E SUA NATUREZA JURÍDICA
Os ativos digitais abrangem uma variedade de bens e direitos representados em formato eletrônico, com destaque para as criptomoedas (como o Bitcoin e o Ethereum), tokens e demais representações digitais de valor. Doutrinariamente, a natureza jurídica desses ativos ainda é objeto de debate, oscilando entre a classificação como bens móveis incorpóreos (CCB/2002, art. 11, §1º, III) e como direitos patrimoniais disponíveis. A ausência de regulamentação específica no ordenamento jurídico brasileiro amplia a complexidade de sua apreensão no processo executivo.
FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS APLICÁVEIS
O princípio do devido processo legal (CF/88, art. 5º, LIV) e a garantia do contraditório e ampla defesa (CF/88, art. 5º, LV) são balizas essenciais na constrição de qualquer patrimônio do executado. Ademais, o direito de propriedade (CF/88, art. 5º, XXII) e o princípio da dignidade da pessoa humana (CF/88, art. 1º, III) impõem limites à atuação estatal, especialmente quanto à preservação do mínimo existencial e à proteção de bens absolutamente necessários à subsistência. No âmbito das relações laborais, o artigo 10, §1º da CF/88, também assegura proteção patrimonial aos depósitos e fundos vinculados ao trabalhador.
FUNDAMENTOS LEGAIS DA PENHORA DE ATIVOS DIGITAIS
A Lei 6.830/1980 (LEF) disciplina a execução fiscal, estabelecendo as regras para a penhora de bens do devedor. O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015, art. 319) exige a descrição detalhada dos bens sujeitos à constrição, enquanto o Código de Processo Penal (CPP, art. 12) e o Código Penal (CP, art. 284, §1º) abordam questões relativas à apreensão e à restituição de bens em situações específicas. A Lei 7.250/2014, art. 50, por sua vez, prevê medidas de indisponibilidade patrimonial para garantir a efetividade das execuções fiscais e administrativas.
A aplicação dessas normas aos ativos digitais demanda interpretação extensiva, na medida em que tais bens não estão expressamente previstos no rol legal tradicional, sendo necessário utilizar princípios gerais do direito e analogias para sua constrição.
DESAFIOS PRÁTICOS NA PENHORA DE ATIVOS DIGITAIS
LOCALIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DOS ATIVOS
A localização de ativos digitais é um dos maiores desafios enfrentados pelos advogados e pelo Poder Judiciário. Diferentemente dos ativos financeiros tradicionais, os digitais podem ser transferidos instantaneamente para carteiras digitais (wallets) sob controle exclusivo do devedor, muitas vezes em jurisdições estrangeiras ou sob anonimato. Os sistemas eletrônicos como o SISBAJUD ainda não abarcam de maneira integral as exchanges de criptomoedas, dificultando a efetividade da penhora.
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E LACUNAS NORMATIVAS
O avanço tecnológico supera, em velocidade, a atualização das normas processuais e administrativas. A ausência de regramento específico sobre a apreensão de criptomoedas gera insegurança jurídica e pode abrir margem para alegações de nulidade da constrição ou de excesso de execução. Cabe ao operador do direito fundamentar seus pedidos com robustez, utilizando analogias, princípios e doutrina para suprir tais lacunas.
PROTEÇÃO PATRIMONIAL E GARANTIAS DO EXECUTADO
O executado não pode ter constritos bens que ultrapassem o valor da dívida ou que sejam essenciais à sua subsistência ou ao exercício de atividade empresarial (princípio da menor onerosidade). O artigo 50 da Lei 7.250/2014 e o princípio da preservação da empresa devem ser invocados sempre que a constrição de ativos digitais possa comprometer a continuidade das atividades econômicas...