Fórum Jurídico - Conectando profissionais do direito

Direito de Familia

Sucessão. Direito de Habitação. Hermenêutica.

Imagem do usuário Emilio Sabatovski

Advogado/Consultor Jurídico

Escreveu em 04/08/2011 09:08

Sucessão. Direito de Habitação. Hermenêutica.

(Doc. LEGJUR 114.5730.1000.3000) - ÍNTEGRA LIBERADA PARA DEMONSTRAÇÃO

1 - STJ. Sucessão. Inventário. Direito real de habitação do cônjuge supérstite. Evolução legislativa. Situação jurídica mais vantajosa para o companheiro que para o cônjuge. Equiparação da união estável (concubinato). Hermenêutica. Lei 4.121/1962 (Estatuto da Mulher Casada). Precedentes do STJ. Lei 9.278/1996, art. 7º, parágrafo único (aplicação analógica). CCB, art. 1.611, § 2º. CF/88, art. 226, § 3º. CCB/2002, art. 1.831.

REFERÊNCIAS:

Sucessão
Inventário
Direito real de habitação
Habitação
Cônjuge supérstite
Companheiro
União estável
Concubinato
Hermenêutica
Aplicação analógica
Lei 4.121/1962
Lei 9.278/1996, art. 7º, parágrafo único
CCB, art. 1611, § 2º
CF/88, art. 226, § 3º
CCB/2002, art. 1.831


«1.- O Código Civil de 1916, com a redação que lhe foi dada pelo Estatuto da Mulher Casada, conferia ao cônjuge sobrevivente direito real de habitação sobre o imóvel destinado à residência da família, desde que casado sob o regime da comunhão universal de bens. 2.- A Lei 9.278/1996 conferiu direito equivalente aos companheiros e o Código Civil de 2002 abandonou a postura restritiva do anterior, estendendo o benefício a todos os cônjuges sobreviventes, independentemente do regime de bens do casamento. 3.- A Constituição Federal (CF/88, art. 226, § 3º) ao incumbir o legislador de criar uma moldura normativa isonômica entre a união estável e o casamento, conduz também o intérprete da norma a concluir pela derrogação parcial do § 2º do art. 1.611 do CCB/1916, de modo a equiparar a situação do cônjuge e do companheiro no que respeita ao direito real de habitação, em antecipação ao que foi finalmente reconhecido pelo CCB/2002. 4.- Recurso Especial improvido.»  

INTEGRA DO JULGADO
Esta decisão ficará liberada para quem não é assinante do site LegJur por 30 dias.

COMENTÁRIOS:

A decisão é da 3ª T. do STJ e foi relatada pelo Min. Sidnei Beneti. A questão interessante posta aqui é tipicamente de hermenêutica, pois, a Lei 9.278/1996, art. 7º parágrafo único, conferiu direito real de habitação ao convivente após a morte do companheiro em condições mais vantajosas que aquela que o Código Civil/1916 (art. 1.611, § 2º) conferia ao cônjuge sobrevivente. Ao final o Código Civil/2002 (art. 1.831) acabou por equiparar as duas hipóteses. A vantagem consistia em que o direito real de habitação ao cônjuge só era deferido se o casamento fosse pelo regime da comunhão universal de bens, condicionante não exigida na hipótese de união estável. Ao profissional do direito, esta decisão significa um importante precedente e uma lembrança que a hermenêutica existe e que existem valores que devem sempre serem lembrados, relembrados e aplicados, principalmente quando se deparar com injustiças ou com outras circunstâncias que revelem discriminações ou ofendam a racionalidade e o bom senso. Ao estudante de direito, esta decisão tem um significado ainda maior, ele deve ler esta decisão com carinho, já que, além de precedente, ela é um importante instrumento de puro cunho doutrinário e didático. A jurisprudência de qualidade é a mais qualificada das doutrinas.

Ela, também, serve para o estudante ambientar-se no tema. Esta decisão faz lembrar a todos, e ao estudante de direito em particular, que existem valores maiores que o aplicador do direito precisa respeitar e que não é suficiente uma rápida, literal e gramatical leitura do dispositivo legal e dele extrair uma verdade imutável e sobretudo sem aval constitucional. Ela nos lembra que existe casuística e que a lei é genérica. Ela nos lembra que a hermenêutica, a exegese e a interpretação não são apenas responsabilidade dos doutos. Ela nos lembra que a lei não é um instrumento de opressão ou vetor de injustiças, ódios ou rancores. Ela nos lembra que as pessoas são o foco mais importante da nossa atividade e é para as pessoas e para a vida que devemos respeito incondicional. Ela nos lembra que não existe mais aquele positivismo omissivo e rancoroso, que diante das maiores injustiças, simplesmente o aplicador do direito dizia ao cidadão vilipendiado «está escrito nada posso fazer?».

Ela nos lembra finalmente que dar a cada um o que é seu não é uma escolha subjetiva ou discricionária do aplicador do direito. Ela é uma obrigação constitucional indeclinável. Nesta decisão, o Ministro Sidnei Beneti disse, «eu posso fazer» e fez. Todas estas lembranças nasceram porque o relator não se relevou omisso diante do jurisdicionado e preocupou-se em fazer o que era certo e precisava ser feito, ou seja, ser justo e dar a cada um o que é seu. Dado que, em torno de cada processo existem pessoas, elas têm sentimentos, sonhos, angústias que não podem ser ignorados ou negligenciados por quem esta envolvido na prestação jurisdicional, inclusive os advogados, peritos, entre outros. Não há jurisdição sem respeito incondicional às pessoas e a vida. Para finalizar não custa relembrar as palavras sensatas do Min. Sidnei Beneti:

«21.- Considerando, pois, que a interpretação literal das normas postas levaria à conclusão de que o companheiro estaria em situação privilegiada em relação ao cônjuge e, bem assim, que essa exegese, propõem uma situação de todo indesejada no ordenamento jurídico brasileiro, é de se rechaçar a adoção dessa interpretação literal da norma. 22.- Uma interpretação que melhor ampara os valores espelhados na Constituição Federal é aquela segundo a qual o artigo 7º da Lei 9.278/96 teria derrogado, a partir da sua entrada em vigor, o § 2º do artigo 1.611 do Código Civil de 1916, de modo a neutralizar o posicionamento restritivo contido na expressão «casados sob o regime da comunhão universal de bens». 23.- Em outras palavras é de se admitir que a Constituição Federal (artigo 226, § 3º) ao exortar o legislador a criar de uma moldura normativa pautada pela isonomia entre a união estável e o casamento, exortou também o intérprete da norma e o juiz a concluírem pela derrogação parcial do § 2º do artigo 1.611 do Código Civil de 1916, de modo a equiparar a situação do cônjuge e do companheiro no que respeita ao direito real de habitação. 24.- Perceba-se que, dessa maneira, tanto o companheiro, como o cônjuge, qualquer que seja o regime do casamento, estarão em situação equiparada, adiantando-se, de tal maneira, o quadro normativo que só veio a se concretizar de maneira explícita, com a edição do novo Código Civil. 25.- Resumindo é possível afirmar que, no caso dos autos, como o cônjuge da recorrida faleceu em 1999, é indevido recusar a esta o direito real de habitação sobre o imóvel em que residiam desde essa data, tendo em vista a aplicação analógica por extensão do artigo 7º da Lei 9.278/96. ...» (Min. Sidnei Beneti).»

Quando, nos princípios fundamentais, a CF/88 diz no art. 3º, que «constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;» Isto quer dizer que uma prestação jurisdicional injusta não é apenas injusta, mas flagrantemente inconstitucional por violar o inc. I, do art. 3º da Constituição Federal/88. Não é mais válida, se é que um foi, aquela ideia que dizia que a finalidade do processo era obter, ao final, uma verdade formal. Hoje ela é incompatível com os valores fundamentais da nossa Constituição. Decisão injusta é decisão inconstitucional.

Esta é mais uma jurisprudência de qualidade, didaticamente fundamentada e de fácil compreensão, mas não é só, ela sintoniza problemas reais com pessoas reais e soluções reais. Acredite, saber como o STJ, o TST, ou o STF julgam, é habilitar-se para a advocacia. Este acórdão relatado pelo Min. Sidnei Beneti revela quanto é importante ao profissional e ao estudante de direito consultarem sistematicamente jurisprudência de qualidade. A lei, na hipótese vertente, literalmente tratava de forma diferenciada situações que os valores constitucionalmente assegurados não o permitiam e para tanto foi necessário aplicar regras de hermenêutica facilmente compreensíveis e que devem fazer parte do cotidiano de quem fez das leis seu instrumento de trabalho e vida. Como visto, um normativo nunca deve ser visto isoladamente e interpretado literal e gramaticalmente.

Existem princípios condicionantes que precisam sempre serem avaliados. Na hipótese, para chegar a esta conclusão, o relator utilizou o disposto no art. 226, § 3º da CF/88 para buscar a isonomia necessária entre casamento e união estável. Ao estudante, consultar jurisprudência de qualidade significa receber um conhecimento mais completo e qualificado, enquanto, para o profissional a consulta a jurisprudência de qualidade pode significar a tomada de decisões corretas.

O direito moderno abandonou por completo a ideia simplista de um positivismo arcaico. Ele, o direito, está subordinado a toda sorte de princípios, principalmente legais e constitucionais, esta decisão é um exemplo. É fundamental conhecer tais princípios, dar-lhes uma exegese adequada, dar-lhes vida e aplicá-los corretamente. Leia, medite e avalie as alternativas que a Corte poderia ter tomado, caso existam, pois, este é o melhor caminho para um aprendizado de qualidade. Vale a pena, repetir de novo, o processo não é um monte de papéis, em torno dele há vida, há pessoas reais com seus sentimentos, angústias, alegrias, frustrações, necessidades e sobretudo esperança. Ao final, só uma solução é aceitável, ou seja, dar a cada um o que é seu. Nada além nem aquém. Olhar o processo e apenas ver petições, despachos, provas ou sentenças, é negar por completo o compromisso da jurisdição.

DO SITE LEGJUR

Não há mais desculpas para a falta ou dificuldade de acesso às leis e a jurisprudência de qualidade. Se as leis, são o seu instrumento de trabalho, faça agora a assinatura do site LEGJUR e o aproveite ao máximo. Vale lembrar, principalmente ao estudante de direito, que o acesso direto a tão importante instrumento de aprendizado e trabalho, como as leis, e a jurisprudência de qualidade, é algo recentíssimo, já não é mais uma questão que se resolve em benefício de quem pode, mas de quem quer. Portanto, aproveite ao máximo esta oportunidade. A jurisprudência de qualidade é imprescindível para o estudo e a compreensão do processo, seja ele civil, penal ou administrativo. A jurisprudência de qualidade, também, facilita a compreensão do mecanismo processual, desde o início com a petição inicial até o recurso final e seu trânsito em julgado. Não há como entender processo sem jurisprudência. Leve no seu NoteBook a informação jurídica on line que o site LegJur proporciona diretamente para a sala de aula e deixe de comprar pesados, caros e desnecessários livros. Exija que a tua instituição de ensino disponibilize uma internet de qualidade. Ela deve aos seus alunos que são seus clientes e consumidores, pois a internet disponibiliza uma parte fundamental do aprendizado que ela comprometeu-se ministrar. Como dito, faça agora sua assinatura do site LegJur e a aproveite ao máximo.

Ele tem uma ampla base de dados de legislação, jurisprudência e súmulas. O portal é um produto onde foi empregada a melhor das tecnologias da informação. Essa tecnologia permitiu disponibilizar ao consulente um produto de qualidade por um preço quase simbólico. O conteúdo não é uma cópia simples das fontes governamentais, ele é trabalhado para um melhor retorno da informação ao consulte e possui uma interface mais agradável. A informação jurídica on line não é apenas excelente para o estudante, mas, também, é para o professor que tem a possibilidade de ministrar aulas de qualidade enriquecidas com a jurisprudência que é a parte viva do direito. A consequência é uma aula rica, agradável, lúdica e proveitosa, tanto para quem leciona quanto para quem estuda. Para a instituição de ensino implica prestar um melhor serviço aos seus clientes que são os estudantes e ter uma melhor classificação nas provas aplicadas pelo do Ministério da Educação. Para uma instituição de ensino jurídico a aprovação no Exame de Ordem pode significar uma questão de sobrevivência. Nunca podemos esquecer que não há qualificação jurídica sem a Constituição, sem as leis e sem a jurisprudência de qualidade. O princípio da legalidade (CF/88, art. 5º, II) é o ponto de partida para o aprendizado do direito. Não há tese jurídica sem fundamento legal ou constitucional. Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, esta é a premissa fundamental. Como, também, não há direito sem o respeito incondicional à vida, às pessoas e as suas necessidades materiais e imateriais.

DA PROVA DA OAB

Informa a OAB que na última prova do Exame de Ordem menos de 10% dos inscritos lograram aprovação, muitos faculdades de direito não conseguiram aprovar nenhum aluno neste exame. Isto quer dizer que o aluno de direito precisa desde o primeiro ano da faculdade sedimentar seu conhecimento na lei e na jurisprudência de qualidade, únicos instrumentos capazes de habilitá-lo a passar nos concursos públicos e no Exame de Ordem e por último e mais importante, habilitam-no a advogar. A impressão inexorável, que resulta desta estatística, é que as nossas instituições de ensino não se adaptaram as novas condicionantes e continuam não ensinando nada como sempre, com algumas episódicas e raras exceções.

A aprovação desses 9% de candidato certamente é resultante muito mais do esforço pessoal e autodidata de cada bacharel do que propriamente da atividade escolar. Isto quer dizer que no momento o verdadeiro estudante de direito se encontra só e desamparado, e depende somente de si, enquanto é obrigado a contribuir durante anos para uma instituição de ensino supervisionada pelo Ministério da Educação e tudo mais, sem resultado útil ao final. Pense nisso. Não desista nem abdique do teu sonho. Ser um magistrado, ou advogado, ou manter vivo um sonho, depende muito da determinação pessoal de cada um. Conhecer e viver o direito prescinde de atividade escolar direta da forma como se faz hoje.

Contudo, culpar, por isso, unicamente as instituições de ensino não é prudente, também, há uma culpa coletiva que pode ser imputada a cada um de nós. Cada um precisa apenas fazer a sua parte, esta é uma questão de cidadania e nada melhor do que fazer agora.

Fique aqui, desenvolva-se e cresça conosco.

Curitiba, 03/08/2011. Emilio Sabatovski