Tese: 3328

TESE DOUTRINÁRIA EXTRAÍDA DO ACÓRDÃO:

É admissível a relativização da coisa julgada em ação de investigação de paternidade julgada improcedente por insuficiência de provas, quando a parte autora, beneficiária da assistência judiciária gratuita, não teve condições econômicas para realizar o exame de DNA — essencial à elucidação do vínculo biológico — e o Estado não proporcionou os meios necessários à produção da prova. Nesses casos, a repropositura da demanda é possível, em respeito ao direito fundamental à identidade genética, como emanação do direito à personalidade, devendo a proteção à coisa julgada ceder diante da prevalência axiológica dos direitos fundamentais à filiação, à assistência jurídica integral e à dignidade da pessoa humana.

COMENTÁRIO EXPLICATIVO

A tese consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece que, diante de casos excepcionais, o valor da coisa julgada — corolário da segurança jurídica — pode ser mitigado para permitir a efetivação de direitos fundamentais de envergadura superior, como é o caso do direito à identidade genética e à própria filiação. O acórdão fixa que, se a improcedência da ação de investigação de paternidade decorreu da impossibilidade de o autor, hipossuficiente, acessar o exame de DNA, por ausência de custeio estatal, não se pode eternizar a situação de incerteza jurídica, vedando a rediscussão da matéria. O Tribunal entende que o direito de conhecer a própria origem, enquanto expressão do direito da personalidade, deve ser garantido, mesmo contra a imutabilidade da decisão judicial anterior, sendo a repropositura da ação legítima quando superado o óbice probatório.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL

FUNDAMENTO LEGAL

  • CPC/2015, art. 485, VII: ação rescisória por documento novo (analogia para relativização da coisa julgada em situações excepcionais)
  • Lei 8.069/1990, art. 27: direito personalíssimo, indisponível e imprescritível ao reconhecimento do estado de filiação

SÚMULAS APLICÁVEIS

  • Súmula 149/STF: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança.”
  • Súmula 301/STJ: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.”

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A decisão do STF representa um marco evolutivo na proteção dos direitos da personalidade e dos interesses existenciais da pessoa humana no âmbito do direito de família brasileiro. Ao relativizar a coisa julgada em hipóteses excepcionais, o Tribunal reafirma a centralidade do acesso à verdade biológica como elemento constitutivo da dignidade, identidade e igualdade dos filhos. Ressalta-se, contudo, que a permissão para reproposição da demanda está restrita a situações em que a anterior improcedência decorreu da impossibilidade de produção da prova genética por ausência de custeio estatal, e não por simples desídia da parte. A tese não institui um salvo-conduto para reabrir toda e qualquer demanda de filiação, mas delimita um critério objetivo, em consonância com a ponderação dos valores constitucionais em conflito.

ANÁLISE JURÍDICA, CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS E JURÍDICAS

A argumentação jurídica do STF se baseia na ponderação de princípios, em que a proteção à coisa julgada cede, de forma excepcional, diante da necessidade de concretização de direitos fundamentais, especialmente quando o próprio Estado falha na prestação jurisdicional adequada, negando acesso à prova científica. O entendimento contribui para harmonizar os valores da segurança jurídica e da dignidade humana, evitando a perpetuação de injustiças materiais em nome de formalismos processuais. Como consequência prática, a decisão estimula o Poder Público a estruturar mecanismos de efetivo acesso à justiça, sob pena de ver desconstituídas decisões judiciais por falhas estatais. Além disso, orienta os tribunais a analisar com rigor a origem da insuficiência probatória nas ações de estado, prevenindo banalização da relativização da coisa julgada.

Por fim, a decisão projeta efeitos futuros ao reafirmar a supremacia dos direitos existenciais, especialmente o direito à filiação, frente a institutos processuais clássicos, e pode impactar outras áreas do direito em que o acesso à verdade depende de avanços tecnológicos ou do dever de proteção estatal, como nas ações de investigação de maternidade, anulação de registro civil e outras demandas existenciais.