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STJ. 3ª T. Fraude contra credores. Anterioridade do crédito. Compromisso de compra e venda. Promessa de compra e venda não registrada. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. Precedentes do STJ. CCB, art. 106, parágrafo único. CCB/2002, arts. 158, § 2º 1.471. Dec.-lei 58/1937. Lei 6.766/1979. CCB, art. 135.

Postado por Emilio Sabatovski em 22/10/2013
«... Cinge-se a controvérsia a determinar se, para fins de reconhecimento da anterioridade do crédito, exigida para a caracterização da fraude contra credores, deve ser considerada a data do registro da escritura pública de compra e venda ou a data em que foi firmado o contrato particular de promessa de compra e venda do bem.

II – Da ausência de anterioridade do crédito impugnado. Violação do art. 106, parágrafo único, do CC/16.

Na hipótese em exame, as instâncias ordinárias concluíram pela existência de fraude contra credores e foi desconstituída a relação jurídica de compra e venda do imóvel celebrada entre os recorrentes. No presente recurso, não se discute, ressalte-se, a existência de conluio fraudatório (consilium fraudis) e o prejuízo com a prática do ato (eventos damni), mas se o crédito do recorrido é anterior ao ato tido por fraudulento e praticado pelo devedor.

O nosso ordenamento jurídico disciplinou, no art. 106, parágrafo único, do CC/16, o instituto da fraude contra credores, visando coibir a prática, pelo devedor, de atos fraudulentos que acarretem a diminuição de seu patrimônio com o propósito de prejudicar seus credores. Contra essa artimanha utilizada pelo devedor, instituiu a ação pauliana ou revocatória, que busca, uma vez caracterizada a fraude contra credores, anular o negócio e conservar no patrimônio do devedor determinados bens, garantia do cumprimento das obrigações assumidas por este.

É certo que da literalidade do dispositivo em questão extrai-se que a afirmação da ocorrência de fraude contra credores depende, para além da prova de consilium fraudis e de eventus damni, da anterioridade do crédito em relação ao ato de compra e venda.

Isto é, o crédito deve ser anterior ao ato de disposição dos bens, porque somente os credores que já o eram ao tempo dos atos fraudulentos é que podem demandar a anulação, dado que apenas em relação a eles é que estes atos diminuem a garantia que o patrimônio do devedor oferece.

A par dessa exigência da anterioridade do crédito, deve ser ressaltado que, no julgamento do REsp 1.092.134/SP (de minha relatoria, DJe de 18.11.2010), essa 3ª Turma decidiu que o requisito da anterioridade do crédito pode ser afastado, quando as instâncias ordinárias concluem que houve o desfazimento antecipado dos bens, com vistas a afastar o referido requisito. Naquela oportunidade, ressaltei que a regra do art. 106, parágrafo único, do CC/16 deve ser aplicada com temperamento e, portanto, conquanto a anterioridade do crédito seja, via de regra, pressuposto de procedência da ação pauliana, ela pode ser excepcionada quando for verificada a fraude predeterminada em detrimento de credores futuros.

Na hipótese sob julgamento, o contrato particular de promessa de compra e venda foi celebrado em 02.01.1998 (e-STJ fl.464); a averbação da venda na matrícula do imóvel ocorreu em 15.04.1998 (e-STJ fl. 621); e a nota promissória que embasa o pedido de reconhecimento da fraude contra credores foi emitida em 05.02.1998, com vencimento em 10.04.1998 (e-STJ fl. 467).

Os recorrentes alegam que deve ser considerada como data da alienação do imóvel aquela constante no contrato particular de promessa de compra e venda firmado, o que afastaria a presença do requisito da anterioridade do crédito.

O Tribunal de origem assim se manifestou a respeito do tema:


De se observar, assim, que enquanto não formalizada a compra e venda através de escritura pública e registrada esta no Registro de Imóveis competente, inexiste alienação do imóvel. E como bem se depreende da inclusa promessa de compra e venda, enquanto não formalizado o registro, nos termos da legislação antes referida, as partes tinham uma mera expectativa de direito, incapaz de produzir, portanto, o efeito ora pretendido.


A anterioridade do crédito deve ser aferida, saliento, em cotejo com o competente registro da escritura, não valendo, para tal desiderato, a data da promessa de compra e venda, cujo marco temporal, reitero, reside na formalização do registro, datada de 15 de abril de 1998 (fl. 09), é posterior ao vencimento da dívida, verificado em 10 de abril de 1998. (e-STJ fl. 621)

A questão controversa, portanto, consiste em verificar se a existência de contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel é suficiente para afastar a anterioridade do crédito.

A promessa de compra e venda constitui espécie de contrato preliminar pelo qual as partes, ou uma delas, comprometem-se a celebrar adiante o contrato definitivo de compra e venda, que gerará o direito real de propriedade.

O Decreto-Lei 58/37 e a Lei 6766/79 cuidam, respectivamente, do compromisso de compra e venda de loteamentos rurais e urbanos, já que a Lei do parcelamento do solo urbano revogou o DL nº 58/37 na parte referente ao loteamento urbano, portanto a matéria era regulada em leis especiais, assim, para compreender a promessa de compra e venda é preciso analisar os efeitos tanto sob o ângulo de uma relação obrigacional, como de um direito real à aquisição.

Mesmo antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, que previu, no art. 1.471, que «mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel», a jurisprudência já aceitava que o compromisso de compra e venda devidamente registrado constitui ato obrigacional com eficácia real. Nesse sentido: REsp 431.432/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 27.06.2005 e REsp 76.927/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Nilson Naves, DJ de 13.04.1998.

Não estando o contrato registrado, o promitente comprador pode exigir do promitente vendedor a outorga da escritura – através da ação de adjudicação compulsória –, mas não poderá opor seu direito a terceiros. O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, sumulou o entendimento no sentido de que «o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis». (Súmula 239).

O registro, contudo, conquanto não interfira na relação de direito obrigacional, é necessário para a eficácia da promessa de compra e venda perante terceiros, que não participaram do contrato. O registro da promessa de compra e venda, portanto, gera um direito real à aquisição, em caráter erga omnes.

O art. 135 do CC/16 prevê expressamente que o instrumento particular, assinado por quem possa dispor livremente de seus bens e subscrito por duas testemunhas, prova as obrigações convencionais de qualquer valor. Mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de transcrito no Registro Público.

É com o registro da promessa de compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis que o direito do promissário comprador alcança terceiros estranhos à relação contratual originária. A oponibilidade absoluta do direito real gera sequela e torna ineficazes, em face daquele, as alienações e onerações posteriores ao registro do contrato preliminar. Esses efeitos decorrem apenas do registro, antes e independentemente do pagamento do preço.

Calha aqui mencionar que é admitida a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse decorrente do compromisso de compra e venda de imóvel ainda não registrado, conforme preceitua a Súmula 84/STJ.

Ocorre que, em que pese ser possível proteger o terceiro possuidor de boa-fé, essa proteção não deve ser estendida ao terceiro de má-fé, que comprovadamente agiu em consenso com o proprietário do bem, com vistas a prejudicar credores. Nessas hipóteses, deve ser restringida a eficácia dada à promessa de compra e venda.

A orientação jurisprudencial citada, que visa proteger o terceiro possuidor e adquirente de boa-fé, não tem aplicabilidade quando se trata de fraude contra credores, na medida em que se exige, para o reconhecimento da fraude, a existência de conluio fraudatório.

Ressalte-se, ainda, que o Tribunal de origem não mencionou a existência de qualquer outro elemento que poderia evidenciar a alienação do imóvel antes do registro da escritura pública de compra e venda, como, por exemplo, a comprovação de que o pagamento já havia sido feito, ou que o comprador encontrava-se na posse do imóvel.

Por conseguinte, quando o ato do devedor é feito por instrumento particular, para fins de se constatar a anterioridade do crédito em relação ao ato fraudulento, nas hipóteses em que existiu o conluio fraudatório, deve ser considerada a data do registro do instrumento particular, e não a da sua elaboração. Permitir o contrário acabaria por enfraquecer o instituto da fraude contra credores, dada a facilidade em dar a um documento uma data falsa e, ao mesmo tempo, a dificuldade em demonstrar essa fraude.

Inexiste, portanto, ofensa ao art. 106, parágrafo único, do CC/16. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»

Doc. LegJur (136.2630.7000.3400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Fraude contra credores (Jurisprudência)
▪ Anterioridade do crédito (v. ▪ Fraude contra credores) (Jurisprudência)
▪ Compromisso de compra e venda (v. ▪ Fraude contra credores) (Jurisprudência)
▪ Promessa de compra e venda (v. ▪ Fraude contra credores) (Jurisprudência)
▪ CCB, art. 106, parágrafo único
▪ CCB/2002, art. 158, § 2º.
▪ CCB/2002, art. 1.471.
Dec.-lei 58/1937 (Legislação)
Lei 6.766/1979 (Legislação)
▪ CCB, art. 135
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