Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Consumidor. Plano de saúde. Relação de consumo. Relação jurídica material. Consumo. Recurso especial. Reexame de provas. Impossibilidade. Lei 9.656/1998, art. 30. Norma auto-aplicável, que prescinde de regulamentação. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre o tema. Precedentes do STJ. CDC, arts. 2º, 3º, 6º, III, IV, V, 46, 51, I, IV, XV, §§ 1º e 2º. Lei 9.656/1998, art. 16, IX. Lei 9.961/2000, art. 4º.

Postado por Emilio Sabatovski em 02/09/2013
«... 6.2. Destarte, o artigo 30 da Lei 9.656/1998 confere direito ao recorrido de ser mantido nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava durante a vigência do contrato de trabalho, após a cessação do seu vínculo laboral, contanto que assuma o pagamento integral do plano.

Nesse mesmo sentido se manifesta a doutrina:


A regra do «caput» do art. 30 vem corrigir grave injustiça praticada contra o consumidor contribuinte de plano privado coletivo de saúde ao assegurar-lhe, em caso de rescisão de seu contrato de trabalho, o direito de permanecer como beneficiário.


[...]


A norma do «caput», como dito, é corretíssima. Ela vem evitar graves distorções que atingem o empregado que saiu de seu emprego, por meio do qual acabou vinculando-se a determinado plano de saúde. Muitas vezes a perda do consumidor-empregado é bastante grande, a começar pelas carências: a saída do plano joga fora automaticamente sua conquista na superação dos períodos de carência impostos pela operadora.


Além disso, muitas vezes são anos e anos de contribuição, e o consumidor, por ter-se tornado mais idoso, tinha feito toda uma programação de atendimento preventivo ou de acompanhamento de doenças com certos prestadores e serviços médicos, que é obrigado a abandonar.


A questão é simples: o desligamento da empresa de seu patrão não implica - nem pode- a desconstituição da relação mantida com a operadora.


É natural que as operadoras não queriam manter o vínculo por conta do preço: normalmente nos planos coletivos o preço é mais baixo para o consumidor, pois ele recebe subsídio do empregador, que arca com parte do valor cobrado. Agora, esse argumento não mais pode vingar, porque a norma garante a continuidade ao consumidor, desde que ele assuma a responsabilidade pelo pagamento da diferença.


[...]


O grande equívoco do legislador foi a inserção da limitação do § 1º. Não há dúvida sobre as garantias e o cálculo: 1/3 do tempo decorrido com um mínimo de seis (independentemente, portanto, da passagem de qualquer tempo) e um máximo de vinte e quatro meses. A lei está adiando a injustiça que se praticará. Não ocorre no ato da saída, mas vigerá por dois anos! (NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários à Lei de Plano Privado de Assistência à Saúde. São Paulo: Saraiva, 2000, ps. 86-88)


---


O § 1º do art. 30 da Lei 9.656 limita o prazo de manutenção da condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho com três marcações.


A primeira é um terço do tempo de permanência nos produtos, isto é, um terço do tempo em que esteve filiado ao plano de saúde coletivo empresarial o empregado, ou qualquer outro que tenha direito de manter-se sob cobertura daquele plano a que se filiava por dependência ou agregação.


Os outros termos que limitam são os 6 meses, como piso, e os 24 meses como teto. Quem tem mais de 72 meses de filiação não tem regalia para permanecer filiado, visto que 24 meses são 1/3 de 72. Mas, no lado do piso, um único mês de filiação ao plano gera direito de manter-se filiado, pagando integralmente, sempre, por mais 6 meses. Aqui não há necessidade de que o consumidor tenha permanecido filiado por 18 meses para ter direito aos 6 meses de manutenção.


Há quem veja grandes injustiças na regra, que estaria apenas adiando a data do corte da cobertura, aliadas a grandes dificuldades com a execução dos outros dispositivos do art. 30.


[...]


Há outras referência doutrinárias que anotam o equívoco do legislador na fixação desses prazos.


[...]


A ausência de tal regra limitadora do tempo de filiação seria um estímulo para que as empresas se desinteressassem pela estipulação dos planos e seguros coletivos aos empregados, esse provavelmente o maior filão do mercado explorado pelas operadoras no país.


[...]


O interesse por este tipo de assistência complementar oferecido por instituições sólidas e confiáveis é tanto que a Cassi passou a explorar a atividade como operadora de planos de saúde, oferecendo sua experiência e sua rede de credenciados a interessados que não tenham mais qualquer vínculo com o Banco do Brasil, ex-funcionários, aposentados e os dependentes e agregados deles.


Segundo seu Relatório de Atividades de 2001, a Cassi entrou no ano de 2000 administrando três grandes planos denominados «Associados» e «Saúde Família I» e «II», congregando mais de 970.000 associados e dependentes, vindos dos quadros de funcionários da mantenedora Banco do Brasil e de outras empresas e instituições conveniadas, inclusive da associação dos servidores do STF.


[...]


Havendo manifestação expressa do titular do plano ou seguro pela manutenção do vínculo contratual às suas expensas, dentro dos prazos estabelecidos, a operadora ou a seguradora não podem recusar o pedido nem simultaneamente denunciar o contrato em razão da resolução do contrato de trabalho.


O direito de manter o vínculo com a operadora não está sujeito à condição. Trata-se de relação jurídica distinta da principal que subsiste em qualquer hipótese de extinção do contrato de trabalho... (BOTTESINI, Maury Ângelo; MACHADO, Mauro Conti. Lei dos Planos e Seguros de Saúde Comentada e Anotada. São Paulo: Revista dos Tribunais,2003, ps. 212-216)

7. Com efeito, a tese de que o recorrido não teve interesse em permanecer no «Plano Associado», que lhe era amplamente favorável e, de modo voluntário e consciente, aderiu ao «Plano Saúde Família», deve ser repelida, pois, conforme o apurado pela Corte local, verbis:


Não é crível a alegação de que o embargante abdicou voluntariamente de um bom plano assistencial do qual era associado há anos, para aderir a outro mais oneroso e com menos vantagens. Ressalte-se que o autor despendia R$ 110,75 (cento e dez reais e setenta e cinco centavos) pela assistência médico-hospitalar, e o empregador arcava com R$ 166,13 (cento e sessenta e seis reais e treze centavos), totalizando R$ 276,88 (duzentos e setenta e seis reais e oitenta e oito centavos). Com a alteração do plano, passou a pagar R$ 592,92 (quinhentos e noventa e dois reais e noventa e dois centavos). Tal atitude só poderia ser esperada diante de uma imposição por parte da empresa, ou pela falta de informação. Ambas as conjeturas são repelidas no ordenamento jurídico pátrio, tanto pelo Código de Defesa do Consumidor, como à luz do Estatuto Civil. (fl. 386)

Outrossim, a título de reforço de argumentação, das próprias razões recursais da recorrente, ressai nítida a sua malícia, pois sustenta que, ao arrepio da lei, seu estatuto prevê que só é possível a manutenção do consumidor no «Plano Associado» enquanto perdurar o vínculo empregatício do titular com o Banco.

Neste particular, a moderna doutrina civilista, ao adotar a concepção do vínculo obrigacional como relação dinâmica, revela o reconhecimento de deveres secundários, ou anexos, que incidem de forma direta nas relações obrigacionais, prescindindo da manifestação de vontade dos participantes e impondo às partes o dever de zelar pelo cumprimento satisfatório dos interesses da outra parte, vista no direito moderno como parceira contratual.

Sobre a importância da boa-fé nos contratos entabulados, vale conferir, a propósito, as abalizadas ponderações de Ruy Rosado de Aguiar Júnior:


[...] a boa-fé se constitui numa fonte autônoma de deveres, independentemente da vontade, e, por isso, a extensão e o conteúdo da relação obrigacional já não se medem somente nela (vontade), e, sim, pelas circunstâncias ou fatos referentes ao contrato, permitindo-se construir objetivamente o regramento do negócio jurídico com a admissão de um dinamismo que escapa ao controle das partes. A boa-fé significa a aceitação da interferência de elementos externos na intimidade da relação obrigacional, com poder limitador da autonomia contratual. O princípio da boa-fé significa que todos devem guardar fidelidade à palavra dada e não frustrar ou abusar da confiança que constitui a base imprescindível das relações humanas, sendo, pois, mister que se proceda tal como se espera que o faça qualquer pessoa que participe honesta e corretamente do tráfego jurídico. (Ruy Rosado Aguiar Junior, Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, p. 238)

Convém registrar, também, o magistério de Cláudia Lima Marques, em artigo doutrinário versando especificamente a respeito de contratos de plano de saúde:


Já os aqui estudados contratos de planos de saúde, trata-se de contratos de cooperação e solidariedade, cuja essência é justamente o vínculo recíproco de cooperação (wechselseitige Verbundenheit), é a consciência da interdependência de cada um de seus participantes, consciência da necessidade de direcionar-se para o mesmo fim, de manter uma relação de apoio e de adesão ao objetivo compartilhado (Zusammengehörigkeitsgefühl), única forma de realizar as expectativas legítimas de todos. Como ensina Ronaldo Porto Macedo, apoiando-se nos ensinamentos de Durkheim e Macneil, cooperar é dividir com outro uma tarefa comum, é associar-se com outro para benefício mútuo ou para a divisão mútua dos ônus, solidariedade é o elemento moral pressuposto nas relações de cooperação, entendidas como divisão com outrem de uma tarefa comum, é o elemento de coesão social (de natureza moral) que permite aos homens estabelecerem relações de cooperação, é a unidade (de grupos ou classe) que produz ou está baseada em comunidade de interesses, objetivos e padrões.


Os contratos de planos de assistência à saúde são contratos de cooperação, regulados pela Lei 9.656/1998 e pelo Código de Defesa do Consumidor, onde a solidariedade deve estar presente, não só enquanto mutualidade (típica dos contratos de seguros, que já não mais são, ex vi a nova definição legal como planos), mas enquanto cooperação com os mais velhos, enquanto divisão paradigmática-objetiva e não subjetiva da sinistralidade, enquanto cooperação para a manutenção dos vínculos e do sistema suplementar de saúde, enquanto organização do sistema para possibilitar a realização das expectativas legítimas do contratante mais fraco.


Trata-se de contratos cativos de longa duração, como antes explicitado, e que hoje mencionam e regulam (em ação afirmativa) a contratação por idosos. Os contratos de planos de saúde são contratos cativos de longa duração, pois envolvem por muitos anos um fornecedor e um consumidor, com uma finalidade em comum, assegurar para o consumidor o tratamento e ajudá-lo a suportar os riscos futuros envolvendo a saúde deste, de sua família, dependentes ou beneficiários. Aqui está presente o elemento moral, imposto ex vi lege pelo princípio da boa-fé, pois solidariedade envolve a idéia de confiança e cooperação. Confiar é ter a expectativa mútua, de que, em um contrato, nenhuma parte irá explorar a vulnerabilidade da outra em outras palavras, o legislador consciente de que este tipo contratual é novo, dura no tempo, que os consumidores todos são cativos e que alguns consumidores, os idosos, são mais vulneráveis do que outros, impõe a solidariedade na doença e na idade e regula de forma especial as relações contratuais e as práticas comerciais dos fornecedores, rivalizando com uma ação afirmativa a evitar e compensar uma discriminação existente no mercado em relação a estes consumidores» (in Revista Trimestral de Direito Civil, Editora Padma, Ano 2. vol. 8, 2001, pp. 25/26).

André Soares Hentz, em obra intitulada «Ética nas Relações Contratuais à Luz do Código Civil de 2002», Editora Juarez de Oliveira, ps. 98/99, explicita que:


Somente com advento do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, é que a boa-fé objetiva foi consagrada no Brasil. Legislação derivada de ditames constitucionais, a boa-fé passou a ser utilizada tanto para a interpretação de cláusulas contratuais como também para a integração das obrigações pactuadas, revelando ser fundamental que as partes se comportem com correção e lealdade até o cumprimento de suas prestações.


Cláudia Lima Marques explica que a adoção da boa-fé objetiva pelo Código de Defesa do Consumidor contribuiu sobremaneira na exegese das relações contratuais no Brasil como linha teleológica de interpretação (art. 4º, III), e como cláusula geral (art. 51, IV), positivando em todo o seu corpo de normas a existência de uma série de deveres anexos às relações contratuais, como dever de informação dos fornecedores e prestadores de serviços (art. 31) e a vinculação à publicidade divulgada, (arts. 30 e 35) dentre outros.

A existência dos chamados deveres anexos, instrumentais, secundários ou acessórios, revela-se como uma das faces de atuação ou operatividade do princípio da boa-fé objetiva, sendo nítido que a recorrente faltou com aqueles deveres, notadamente os de lealdade; o de não agravar, sem razoabilidade, a situação do parceiro contratual; e os de esclarecimento; informação e consideração para com os legítimos interesses do parceiro contratual:


«O adimplemento atrai e polariza a obrigação. É o seu fim». Com essas palavras, Clóvis do Couto e Silva inicia a sua obra «A obrigação como Processo», que entre nós introduziu, já na década de 1960, a noção dinâmica da relação obrigacional, considerada como «estrutura de processos» e como «totalidade», para a qual a noção de adimplemento desempenha um papel fundamental, distinto do mero modo de extinção das obrigações. O extremado relevo deste papel para a própria noção de obrigação só agora vem reconhecido pelo direito legislado, em razão da nova arquitetura da disciplina das Obrigações, traduzida pela estrutura sistemática adotada pelo novo Código Civil e pelas diretrizes teóricas que as polarizam.


Essa é, ao nosso juízo, a maior novidade do Código que entrou em vigor em 2003 em tema de obrigações: o traçar de uma estrutura que enseja um método diverso daquele tradicional, tudo estando embasado em uma nova ideologia, superadora do individualismo a outrance que, desde o inaugurar da Modernidade, tem sido colado ao Direito Privado como se fosse o seu selo, a marca gravada em sua genética.


Para bem marcar a diferença, observe-se que o Código de 1916 elencava as regras acerca do inadimplemento no Título II do Livro III da Parte Especial (Do Direito das Obrigações) sob a genérica denominação «Dos Efeitos das Obrigações». Este elenco de regras vinha posto misturadamente às regras sobre o inadimplemento (Capítulo XIII), logo subseqüente à parte onde se classificavam as «Modalidades das Obrigações» (Título I), e antecedentemente ao Título relativo ao fenômeno da transmissão das obrigações (reduzido ao caso da Cessão de Crédito, no Título III). O novo Código, diferentemente, introduz nesta matéria alteração metodológica que deve ser bem realçada.


[...]


No Título III, ao invés de englobar, assistematicamente, todas as formas pelas quais a relação obrigacional pode desaparecer, cuidou-se especificamente do cumprimento, ou adimplemento, ou ainda, pagamento, seja o cumprimento direto voluntário e adequado pelo devedor, correspondente ao conceito técnico ou estrito de adimplemento, seja o chamado cumprimento indireto, tudo nomeando, com maior rigor técnico, «Do Adimplemento e Extinção das Obrigações».


[...]


Foi esta importância vital do adimplemento na economia da relação obrigacional que o novo Código pretendeu realçar, inserindo o tema em capítulo autonômo. Adquiriu assim novo realce a pioneira concepção de Couto e Silva, que já dera frutos na doutrina e na jurisprudência.


[...]


Não mais se discute, em foros da ciência jurídica, que a relação jurídica obrigacional


«alberga, sem prejuízo de sua unidade, uma pluralidade de elementos autonomizáveis com utilidade para a captação do seu regime, constituindo, por isto, uma realidade complexa».


Oportunamente cuidaremos da idéia de relação obrigacional complexa. Por ora é importante reter que cada relação obrigacional surge, normalmente, polarizada em torno de uma ou mais prestações que definem a sua configuração típica. Trata-se dos deveres principais ou primários de prestação, que constituem o núcleo, a «alma da relação obrigacional», tendo em vista o atingimento do seu fim. Por esta razão, são eles que definem o tipo do contrato, se a relação obrigacional for contratual, sendo sempre os mesmos se for o mesmo tipo contratual.


Os deveres de prestação podem ainda ser secundários ou acidentais, o que comporta, por sua vez, outra subdivisão.


[...]


Porém, o conteúdo da relação obrigacional não se esgota nos deveres de prestação. Como averba Carneiro Da Frada, «a envolver os deveres de prestar, qualquer que seja a sua natureza, predispõem-se na relação obrigacional uma outra série de deveres essenciais ao seu correto processamento». São os chamados deveres instrumentais, entre os quais se inserem os deveres de proteção.


Os deveres instrumentais adquirem diversa terminologia. Ditos Nebenpflichten, na terminologia alemã, e por vezes mesmo chamados de anexos, ou laterais, ou acessórios, têm como particularidade o seu escopo, que diz com o exato processamento da relação obrigacional considerada como uma totalidade unificada finalisticamente, e considerados os legítimos interesses de ambos. Nesta medida, são deveres marcados pela instrumentalidade, razão pela qual nós os denominamos «deveres instrumentais». Como explica Carneiro Da Frada, estes deveres, diversos do dever de prestar,


«não estão estes virados, pura e simplesmente, para o cumprimento do dever de prestar, antes visam a salvaguarda de outros interesses que devam, razoavelmente, ser tidos em conta pelas partes no decurso de sua relação».


Os deveres instrumentais não decorrem necessariamente do exercício da autonomia privada nem de explicitação legislativa. Podem comparecer em qualquer relação obrigacional, apresentando-se em graus escalonados de intensidade conforme o dinâmico desenrolar da relação, as situações jurídicas subjetivas em causa, as suas características e circunstâncias concretas, sendo de impossível definição taxativa ou a priori. O desenvolvimento de sua tipologia, que é aberta, muito deve à atividade judicial.


Acentuemos as características.


São instrumentais os deveres decorrentes da boa-fé porque direcionam a relação obrigacional ao seu adequado adimplemento, à vista das concretas finalidades para que foi criado o vínculo; a mesma característica da instrumentalidade se verifica porque auxiliam a densificar a diretriz constitucional da solidariedade social no campo do Direito das Obrigações.


Igualmente, são «avoluntariadas» porque não derivam, necessariamente, do exercício da autonomia privada (podendo mesmo limitar aquele exercício) nem de pontual explicitação legislativa (servindo, muitas vezes, para suprir e corrigir disposição legal) tendo presente a relação obrigacional concretamente considerada, a sua «economia», o programa econômico contratual a ser visualizado no quadro da efetiva realidade social e econômica em que o contrato opera.


[...]


Embora não se possa, como alertamos acima, apresentar uma «listagem taxativa» dos deveres instrumentais, o estágio da doutrina e da jurisprudência já permite sinalizar dois grandes tipos ou grupos. A distinção opera entre os que têm um fim marcadamente positivo e os que visam proteger a contraparte dos riscos de danos na sua pessoa e no seu patrimônio, sendo, então, denominados deveres de proteção.


Exemplificativamente, constituem deveres instrumentais (positivos e de proteção) os deveres de lealdade, de cuidado, previdência e segurança; de aviso e esclarecimento; de informação; de consideração com os legítimos interesses do parceiro contratual; de proteção ou tutela com a pessoa e o patrimônio da contraparte; de não agravar a situação do parceiro contratual; de evitar ou diminuir os riscos; de abstenção de condutas que possam pôr em risco o programa contratual; de omissão e de segredo, em certas hipóteses, deveres que podem anteceder o contrato, na chamada fase pré-contratual, ou mesmo prolongar-se findo o negócio, hipótese da responsabilidade pós-contratual, como já vinha apontando a jurisprudência esclarecida.


[...]


Assim como ocorre a criação de deveres, pode ainda verificar-se, pela incidência da boa-fé objetiva, a limitação do exercício de direitos subjetivos ou de direitos formativos.


[...] vedando a contrariedade da conduta contratual, hipótese designada pela expressão tu quoque, ou ainda carreando à antiga fattispecie do abuso de direito uma conotação objetiva, assim como procede, agora, o art. 187 do Código Civil.


Estes deveres e limitações não são passíveis de definição a priori, porque, notadamente na relação obrigacional derivada de contrato, são os que resultarão necessários para a realização do «programa contratual» (entendido no aspecto objetivo e econômico-social) concretamente considerado. Portanto, sua especificação depende de cada contrato, à vista da sua relação econômica de base, afirmando Ruy Rosado de Aguiar que a boa-fé,


«implica a criação de uma norma para o caso de acordo com os dados objetivos que ele mesmo apresenta, atendendo à realidade social e econômica em que o contrato opera, ainda que isto o leve para fora do círculo da vontade».


Em suma, em paralelo aos deveres derivados do exercício da autonomia privada e daqueles especificamente cominados na lei, os deveres decorrentes da boa-fé, concretizados por via da atividade jurisdicional no campo de função demarcado pela relação obrigacional, sinalizam o adequado adimplemento, apontando, correspectivamente, às hipóteses de inadimplemento, cujo conceito resta, assim, correspondentemente alargado, pois pode ser ocasionado não só pela quebra dos deveres de prestação como pela violação dos deveres instrumentais e, de modo especial, dos deveres de proteção.


Por esta via compreende-se a íntima ligação ente o adimplemento (e, reversamente, o inadimplemento) e os deveres e limitações impostos pela boa-fé, considerada em sua feição objetiva. Esta, na medida em que implica a efetiva prossecução do fim da obrigação -isto é, o adimplemento com satisfação - «complementa as formulações, por vezes lacônicas, dos vínculos creditícios», ao provocar, para ambos os integrantes da relação jurídica, a já aludida assunção de deveres instrumentais e ao impor, por vezes, limitações a direitos subjetivos e poderes formativos. (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Org.). Comentários ao Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. V, ps. 1-43)

Com efeito, os artigos 6º incisos III, IV, V, 46, 51, incisos I, IV, XV, parágrafos 1º e 2º do Código de Defesa do Consumidor e 16, inciso IX, da Lei 9.656/1998 impõem seja reconhecido o direito de o autor permanecer, no período subsequente ao rompimento de seu vínculo empregatício com o Banco, com as mesmas condições e cobertura assistencial, no Plano em que se enquadrava, qual seja, o «Plano Associado».

8. Todavia, como o artigo 30, § 1º, da Lei 9.656/1998 impõe a manutenção do ex-empregado como beneficiário do plano de saúde, pelo período máximo de 24 meses e, no caso, por força de antecipação dos efeitos da tutela, o autor permanece no denominado «Plano Associado» desde o ano de 2003, não pode ser mais imposto à ré a manutenção do recorrido naquele Plano:


RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - PLANO DE SAÚDE EM GRUPO - CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL (CASSI) - ARTIGO 30, «caput», DA Lei 9656/98 - NORMA AUTO-APLICÁVEL – PRECEDENTE - EX-EMPREGADO QUE PEDIU DEMISSÃO - PERMANÊNCIA NA QUALIDADE DE BENEFICIÁRIO - IMPOSSIBILIDADE - RESTRIÇÃO DA APLICAÇÃO DO ARTIGO 30, «caput», DA Lei 9656/98 - - LIMITAÇÃO TEMPORAL NA CONDIÇÃO DE BENEFICIÁRIO – NECESSIDADE - ARTIGO 30, § 1º, DA Lei 9656/98 - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.


[...]


3. O § 1º, do art. 30, da Lei 9.656/1998 estabelece prazo mínimo de 6 (seis) meses e máximo de 24 (vinte e quatro) meses para a permanência do empregado exonerado/demitido sem justa causa permanecer no plano ou seguro saúde ao qual estava ligado durante período em que mantinha o vínculo empregatício. A prorrogação compulsória da permanência por tempo superior ao prazo máximo de 24 (vinte e quatro) meses, não encontra amparo legal.


4. A única hipótese legal de alteração no prazo do benefício do «caput» do art. 30, da Lei 9.656/1998 é a estabelecida em seu § 5º, o qual prevê a sua extinção quando da admissão do ex-empregado em novo emprego.


6. Recurso especial conhecido e provido.


(REsp 1078991/DF, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/06/2009, DJe 16/06/2009)

Ademais, apenas a título de registro, cabe observar que a Resolução Normativa da Diretoria Colegiada Agência Nacional de Saúde Suplementar 279, de 24 de novembro de 2011, que revogou as Resoluções CONSU 20 e 21 de 1999, estabelece no artigo 4º, parágrafo único, verbis:


Art. 4º É assegurado ao ex-empregado demitido ou exonerado sem justa causa que contribuiu para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do artigo 1º da Lei 9.656, de 1998, contratados a partir de 2 de janeiro de 1999, em decorrência de vínculo empregatício, o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.


Parágrafo único - O período de manutenção a que se refere o «caput» será de 1/3 (um terço) do tempo de permanência em que tenha contribuído para os produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do artigo 1º da Lei 9.656, de 1998, ou seus sucessores, com um mínimo assegurado de 6 (seis) e um máximo de 24 (vinte e quatro) meses na forma prevista no artigo 6º desta Resolução.

9. Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso especial apenas para reconhecer que a manutenção do autor, no mesmo plano em que estava incluído por ocasião do rompimento de seu vínculo de emprego com o Banco, não pode mais ser imposta à recorrente, vencido o prazo fixado em lei, mantido o acórdão quanto ao mais, inclusive os ônus sucumbenciais. ...» (Min. Luis Felipe Salomão sobre o tema).»

Doc. LegJur (135.1741.3000.5900) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Consumidor (Jurisprudência)
▪ Plano de saúde (Jurisprudência)
▪ Relação de consumo (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Relação jurídica material (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Consumo (v. ▪ Consumidor) (Jurisprudência)
▪ Recurso especial (Jurisprudência)
▪ Reexame de provas (v. ▪ Recurso especial) (Jurisprudência)
▪ Norma auto-aplicável (v. ▪ Plano de saúde) (Jurisprudência)
▪ CDC, art. 2º
▪ CDC, art. 3º
▪ CDC, art. 6º, III, IV, V
▪ CDC, art. 46
▪ CDC, art. 51, I, IV, XV, §§ 1º e 2º
(Legislação)
(Legislação)
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