Jurisprudência em Destaque

STJ. 1ª T. Mandado de segurança. Coisa julgada. Terceiro interessado. Eficácia natural e imutabilidade da sentença. Distinção. Efeitos perante terceiros. Considerações do Min. Teori Albino Zavascki sobre o tema. Precedentes do STJ. Súmula 202/STJ. CPC, arts. 467 e 472. Lei 12.016/2009.

Postado por Emilio Sabatovski em 18/01/2013
«... 2. No mais, sem razão a recorrente. Não há dúvida de que a coisa julgada, assim considerada «a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença» (CPC, art. 467), embora tenha efeitos restritos «às partes entre as quais é dada» (art. 472 do CPC, primeira parte), não inibe que a sentença em si produza, como todo ato estatal, efeitos naturais de amplitude subjetiva mais alargada. Há, a propósito do tema, estudo clássico de Enrico Tullio Liebman, sempre lembrado, em que afirma:


«[A] sentença, como ato autoritativo ditado por um órgão do Estado, reivindica naturalmente, perante todos, seu ofício de formular qual seja o comando concreto da lei ou, mais genericamente, a vontade do Estado para um caso determinado. As partes, como sujeitos da relação processual a que se refere a decisão, são certamente as primeiras que sofrem a sua eficácia, mas não há motivo que exima os terceiros de sofrê-la igualmente. Uma vez que o juiz é o órgão ao qual atribui o Estado o mister de fazer atuar a vontade da Lei caso concreto, apresenta-se a sua sentença como eficaz exercício dessa função perante todo o ordenamento jurídico e todos os sujeitos que nele operam. Certamente, muitos terceiros permanecem indiferentes em face da sentença que decidiu somente a relação jurídica que em caso concreto foi submetida a exame do juiz; mas todos, sem distinção, se encontram potencialmente em pé de igualdade de sujeição a respeito dos efeitos da sentença, efeitos que se produzirão efetivamente para todos aqueles cuja posição jurídica tenha qualquer conexão com o objeto do processo, porque para todos contém a decisão a atuação da vontade da Lei caso concreto. O juiz, que na plenitude de seus poderes e com todas as garantias outorgadas pela lei, cumpre sua função, declarando, resolvendo ou modificando uma relação jurídica, exerce essa atividade (e não é possível pensar diversamente) para um escopo que outra coisa não é senão a rigorosa e imparcial aplicação e atuação da lei; e não se compreenderia como esse resultado todo objetivo e de interesse geral pudesse ser válido e eficaz só para determinados destinatários e limitado a eles». (ENRICO TULLIO LIEBMAN. Eficácia e autoridade da sentença. Trad. de Alfredo Buzaid e Benvindo Aires. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 123).

Todavia, conforme estabelece o próprio art. 472 do CPC, tido pela recorrente como violado, essa eficácia expansiva não pode prejudicar terceiros. A esses se assegura, em demanda própria, defender seus direitos eventualmente atingidos por ato judicial produzido em demanda inter alios. O próprio Liebman deixou isso expresso no mesmo estudo já citado:


«[D]iversamente do que ocorre com as partes, para quem a própria sentença adquire a coisa julgada e seus efeitos se tornam imutáveis, para os terceiros a sentença é eficaz, mas - não ficando coberta pelo julgado - é discutível a qualquer tempo. O terceiro, desde que tenha interesse, pode, em qualquer circunstância e em qualquer novo juízo, demonstrar que a sentença está errada e não lhe pode ser oposta. A sentença, quando não fortalecida pela coisa julgada, compartilha com todos os outros atos do Estado da vulnerabilidade própria dos atos promanados em regime de estado de direito, e por isso mesmo condicionados à sua conformidade ao direito. Por isso os terceiros, embora sujeitos à eficácia da sentença, podem opor-lhe razões de fato e de direito que demonstrem a sua contrariedade à justiça. Nem por isso podem os terceiros, é claro, modificar ou anular a sentença, mas podem torná-la inaplicável, paralizando a sua eficácia no que lhe diz respeito» (op. cit., p. 289).

É nesse sentido também a doutrina pátria, fundada no sistema que entre nós disciplina a eficácia subjetiva da sentença e da coisa julgada, notadamente no art. 472 do CPC:


«Verifica-se, portanto [do art. 472], que o julgamento apenas entre as partes é imutável. Disto não se deduz, porém, que não deva produzir efeitos em relação a terceiros. Todo julgamento tem eficácia natural e imperativa, que resulta de sua qualidade de ato estatal. Mas, demonstrando-se estar errado, contra ius ou em contrário à lei, o julgado pode perder sua eficácia e obrigatoriedade, e bem como ser revogado, salvo no tocante às partes entre as quais foi dado. [...] Donde deve concluir-se que o julgamento final, como ato de órgão do Estado, tem eficácia erga omnes; mas seus efeitos somente são imutáveis entre as inter partes, pelo que o terceiro, que tenha interesse jurídico, poderá impugnar os efeitos do julgamento, demonstranto estar ele em desacordo com o direito objetivo» (MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil, 3º volume, 9ª ed., SP: Saraiva, 1987, p. 243).


«A sentença, do mesmo modo que todo ato jurídico - diz Chiovenda - existe e vale em relação a todos [...]. Mas afirmar que a sentença, e, pois, a coisa julgada, vale em relação a terceiros, não quer dizer que possa prejudicar terceiros.Apenas quer dizer que terceiros não podem deconhecê-la, não que por ela podem ser prejudicados» (AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 3º volume, 21ª ed., SP: Saraiva, 2003, p. 75/76)


«A sentença faz coisa julgada às partes entre aos quais é dada, não beneficiando nem prejudicando terceiros. Não quer dizer isto que os estranhos possam igonar a coisa julgada. Como todo ato jurídico relativamente às partes entre as quais intervém, a sentença existe e vale com respeito a todos [Chiovenda, Instituições di Direito Processual Civil, 3ª ed., v. I, nº 133, p. 414]. Não é certo, portanto, dizer que a sentença só prevalece ou somente vale entre as partes. O que ocorre é que apenas a imutabilidade e a indiscutibilidade da sentença não podem prejudicar, nem beneficiar, estranhos ao processo em que foi preferida a decisão trânsita em julgado [...] Assim, um estranho pode rebelar-se contra aquilo que foi julgado entre as partes e que se acha sob a autoridade da coisa julgada, em outro processo, desde que tenha sofrido prejuízo jurídico» (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. I, 51ª ed., RJ: Forense, 2.010, p. 557)

No mesmo sentido, entre outros: MARINONI, Luiz Guilherme; e ARENHART, Sérgio Cruz, Processo de Conhecimento, v. 2, 6ª ed., SP:RT, 2007, p.641; ALVIM, J. E. Carreira. Comentários ao Código de Processo Civil, volume 5, Ed. Juruá, Curitiba, 2009, p.187-190.

É justamente em decorrência dessa doutrina que Ovídio Baptista da Silva chegou à seguinte conclusão, bem apropriada ao caso dos autos:


À medida que o estudo dos efeitos ultra partes que a sentença pode provocar no que se refere a terceiros, evidencia que tais efeitos na têm a ver com a indiscutibilidade peculiar à coisa julgada, mais se fortalece a convicção de que a sentença só tem valor de coisa julgada inter partes, só a favor e contra aqueles que integraram a respectiva relação processual.[...] O princípio cardeal, em matéria de extensão subjetiva da coisa julgada, consubstancia-se no seguinte: ou a lei faz extensiva a eficácia peculiar da coisa julgada a alguém que haveria de permanecer terceiro, estranho à demanda, e, nesse caso, a questão se resolve numa das hipóteses de litisconsórcio necessário, de modo que o suposto terceiro passa a ser parte; ou a intervenção não é necessária, no sentido de ser inafastável, e ter-se-ão casos de efeitos reflexos ou outros efeitos (ditos naturais) da sentença que não impedem que os terceiros rediscutam o julgado, havendo aquele nexo de prejudicialidade-dependência, definida pela doutrina italiana como capaz de dar ensejo à intervenção de terceiros; ou, nos demais casos, que envolveriam os chamados terceiros indiferentes, estes hão de suportar, não a coisa julgada, mas as eficácias naturais da sentença» (BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A.. Sentença e coisa julgada, 4ª ed., RJ: Forense, 2003, p. 95/96)

Ora, no caso, - que não se enquadra nem na primeira, nem na última, mas na segunda das situações alvitradas por Ovídio Baptista - o que o acórdão recorrido garantiu à impetrante foi justamente a tutela que Liebman considerou legítima a terceiros prejudicados pela sentença, ou seja, a de «torná-la inaplicável, paralizando a sua eficácia no que lhe diz respeito». Não são poucos os casos análogos em que o STJ assegurou essa tutela em casos análogos, admitindo o mandado de segurança como meio adequado à tal finalidade, nos termos da Súmula 202/STJ:


RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO JUDICIAL. POR TERCEIRO PREJUDICADO, QUE NÃO PARTICIPOU E NEM TEVE ACESSO AO PROCESSO. SÚMULA 202/STJ.


1. O terceiro prejudicado, não sujeito aos vínculos da coisa julgada, está legitimado a defender seus interesses por ação própria, inclusive por mandado de segurança, independentemente da interposição de recurso. Aplicação da Súmula 202/STJ.2. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no RMS 32311/MG, Ministro Teori Albino Zavascki, 1ª Turma, DJe 10/10/2011). No mesmo sentido, também de minha relatoria: RMS 24384/MG, 1ª Turma, DJe 03/09/2008; RMS 18172/SP, 1ª Turma, DJ 04/10/2004).


PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA. IMPETRAÇÃO QUE SE VOLTA CONTRA ATO JUDICIAL. TERCEIRO PREJUDICADO. CABIMENTO.


SÚMULA 202/STJ.


1.[...] 2. É cabível a impetração de mandado de segurança por terceiro interessado que, não citado no processo e sem condições de tomar ciência da decisão que lhe prejudicou, ficou impossibilitado de se utilizar do recurso cabível no prazo legal. 3. Incidência da Súmula 202/STJ, que preleciona: a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso. 4. Agravo regimental improvido.(AgRg no AgRg no RMS 22.536/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 23/08/2011)


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO POR TERCEIRO PREJUDICADO. DEPOSITÁRIO JUDICIAL. POSSIBILIDADE.


1. É certo que, nos termos da Súmula 267/STF, «não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição». No entanto, «a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona a interposição de recurso» (Súmula 202/STJ). Nesse sentido: RMS 17.406/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ 23.8.2004; RMS 3.725/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 13.3.1995, p. 5.297.2. Recurso ordinário provido para afastar a aplicação da Súmula 267/STF, determinando-se ao Tribunal de origem que prossiga no julgamento do mandado de segurança.(RMS 29.985/RJ, Ministro Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, DJe 25/11/2010)

3. À luz dessas considerações é de se concluir que o acórdão recorrido não violou o art. 472 do CPC, mas, ao contrário, deu-lhe a adequada aplicação. ...» (Min. Teori Albino Zavascki).»

Doc. LegJur (130.3501.2000.9300) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Mandado de segurança (Jurisprudência)
▪ Coisa julgada (Jurisprudência)
▪ Terceiro (Jurisprudência)
▪ Terceiro interessado (v. ▪ Coisa julgada) (Jurisprudência)
▪ Eficácia natural (v. ▪ Coisa julgada) (Jurisprudência)
▪ Imutabilidade da sentença (v. ▪ Coisa julgada) (Jurisprudência)
▪ Sentença (v. ▪ Coisa julgada) (Jurisprudência)
▪ Distinção (v. ▪ Eficácia natural e imutabilidade da sentença) (Jurisprudência)
▪ Efeitos perante terceiros (v. ▪ Coisa julgada) (Jurisprudência)
▪  Súmula 202/STJ (Mandado de segurança. Impetração por terceiro. Desnecessidade de recurso específico. CF/88, art. 5º, XXXV. CPC, art. 499, «caput», § 1º. Lei 1.533/51, art. 5º).
▪ CPC, art. 467
▪ CPC, art. 472
(Legislação)
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