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STJ. 3ª T. Medida cautelar. Protesto contra alienação de bens. Limites. Requisitos. Legítimo interesse. Não-nocividade. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. CPC, arts. 869 e 870.

Postado por Emilio Sabatovski em 08/05/2012
«... II. Do protesto. Violação do art. 869 do CPC.

Inicialmente, vale destacar que a recorrida fez uso do protesto contra a alienação de bens objetivando resguardar herdeiros e terceiros dos riscos relacionados à aquisição de cotas da sociedade de advogados mantida pelo seu falecido pai e pelo recorrente. Aduz que parte das cotas pertencentes ao seu pai, José de Castro Ferreira, teria sido irregularmente transferida para o recorrente, em detrimento dos herdeiros daquele.

De acordo com o recorrente, a recorrida careceria de interesse na utilização do protesto contra alienação de bens, na medida em que «ela não herdará cotas, mas apenas seu respectivo valor pecuniário a ser pago pela pessoa jurídica da sociedade e, mesmo assim, considerando-se a situação da sociedade no momento em que seu falecido pai deixou de ser sócio da mesma». (fl. 377, e-STJ).

O TJ/MG entendeu estar presente o legítimo interesse, pois a recorrida «alega a ocorrência de fraudes e possível prejuízos aos herdeiros de José de Castro Ferreira», concluindo que «o protesto tem por escopo prevenir terceiros sobre eventual cessão de cotas da sociedade de advogados». (fls. 339/340, e-STJ).

O protesto é medida judicial destinada a comprovar ou documentar uma manifestação formal de comunicação de vontade, a fim de prevenir responsabilidades. O requerente revela sua intenção de fazer atuar no mundo jurídico uma pretensão, entre as quais a ressalva de direitos, como ocorre na espécie.

Como anota Vicente Greco Filho, o protesto «não tem outra consequência jurídica a não ser o conhecimento incontestável da manifestação de alguém. Se essa manifestação tem relevância ou não será decidido no processo competente, se houver». (Direito processual civil brasileiro. vol. III, 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 200).

No mesmo sentido é a lição de Pontes de Miranda, para quem «os efeitos do protesto independem de atos de outrem. Estão vinculados à vontade do protestante na inicial declarada, visando constituir o fato do protesto para a prova da sua intenção, ou para a conservação de algo». (Comentários ao código de processo civil. vol. XII. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 317-318).

Fixada a premissa de que o protesto não acrescenta nem diminui direitos, conclui-se que a sua utilização contra a alienação de bens não terá o condão de obstar o respectivo negócio tampouco de anulá-lo; apenas tornará inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como a alegação desse – simplesmente alegação – em ter direitos sobre o bem e/ou motivos para anular a alienação.

É nesse contexto que se deve interpretar o art. 869 do CPC, que subordina o protesto à presença de dois requisitos: legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida.

Na verdade, essas exigências derivam de regras gerais de direito processual contidas nos arts. 3º e 129 do CPC, as quais, respectivamente, impõe o interesse de agir como condição da ação e coíbe o abuso de direito de ação.

O primeiro requisito – legítimo interesse – se traduz na necessidade ou utilidade da medida para assegurar ao promovente o fim colimado. Assim, devem ser sumariamente indeferidos por falta de legítimo interesse os protestos formulados por quem não demonstra vínculo com a relação jurídica invocada ou que se mostrem desnecessários frente aos próprios fatos descritos na petição inicial.

Com relação ao segundo requisito – não prejudicialidade efetiva da medida – o protesto não pode atentar contra a liberdade de contratar ou de agir juridicamente, ou seja, o seu deferimento não deve dar causa a dúvidas e incertezas que possam impedir a formação de contrato ou a realização de negócio lícito.

Humberto Theodoro Junior observa ser esse impedimento «de natureza psicológica (dúvidas e incertezas), porque na realidade as medidas conservativas em exame não têm a força de direito de impedir qualquer negócio jurídico». (Curso de direito processual civil, vol. II, 45 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 624).

Na prática, portanto, o Juiz deve tolher o uso abusivo da medida, como meio de suscitar suspeitas infundadas ou exageradas sobre o bem ou direito objeto do protesto, a ponto de afastar indevidamente o possível interesse de terceiros em firmar negócio jurídico envolvendo o mencionado bem ou direito.

Sergio Sahione Fadel bem diferencia o procedimento lícito do protestante daquele em que há abuso, destacando que,


no primeiro caso, o que se pretende é defender um direito, ou ressalvá-lo, contra os eventuais atos depredatórios do devedor inescrupuloso (...). Nessa hipótese, mesmo que o protesto reflita negativamente sobre o requerido e o impeça da concretização do ato fraudulento, o juiz deferirá o pedido». No segundo caso, o requerente da medida, sem qualquer base jurídica ou respaldo legal, tem em mente tão só impedir a concretização de negócio. Em tal contingência, cabe ao juiz indeferir de plano a petição (Código de processo civil comentado. vol. IV. Rio de Janeiro: Borsói, 1974, p. 301).

Na hipótese específica dos autos, a recorrida justifica a utilização do protesto como meio de resguardar herdeiros e terceiros «quanto aos riscos que abrangem a aquisição de bens do requerido e correligionários, especialmente quanto à totalidade das cotas da sociedade». (fl. 107, e-STJ).

Nesse aspecto, o próprio recorrente admite que o falecido sócio, pai da recorrida, Dr. José de Castro Ferreira, «transferiu 40% dos 50% das cotas societárias de sua propriedade à sua ex-exposa». que, tempos depois, «atendendo às necessidades e conveniência do casal ofertou e vendeu para o agravante [recorrente], as cotas então recebidas do marido». (fl. 03, e-STJ).

Induvidoso, também, que os herdeiros de José de Castro Ferreira, entre eles a recorrida, vêm travando árduas batalhas judiciais com o recorrente, na tentativa de desfazer a cessão de cotas. O próprio TJ/MG consigna que «os fatos narrados são controversos e as partes têm se digladiado, insistentemente, com a troca de acusações de cometimentos de ilícitos e recorrente ajuizamento de ações na Justiça». (fl. 339, e-STJ).

Diante disso, vislumbro na espécie a presença de ambos os requisitos exigidos pelo art. 869 do CPC.

A condição de herdeira confere à recorrida legítimo interesse no protesto, sobretudo tendo em vista a controvérsia existente acerca do direito a 40% das cotas da sociedade de advogados.

Não se ignora o fato de que a sociedade de advogados se constrói intuitu personae e que o falecimento de um sócio não implica transmissão dessa condição aos herdeiros, porém essa circunstância não elide o interesse da recorrida em resguardar os direitos que ela considera deter sobre as cotas que pertenciam ao seu falecido pai.

Além disso, saliento que a transação noticiada pelo recorrente, por ele firmada com parte dos herdeiros (fls. 598/606, e-STJ), não afasta o legítimo interesse da recorrida no protesto, pois ela não participou do acordo.

A despeito do instrumento por fim a diversas ações existentes entre as partes, não foi feita nenhuma menção ao presente protesto, de sorte que o legítimo interesse da recorrida não só permanece hígido como se fortalece, garantindo a ciência dos demais herdeiros acerca da sua posição frente aos fatos objeto do protesto.

Ademais, mesmo sendo verídica a informação do recorrente, de que não houve insurgência expressa da recorrida, não há como pressupor esteja ela de acordo com a transação, tanto que dela não participou, sendo razoável inferir a sua divergência.

Outrossim, não se constata abuso na utilização da medida. O protesto objetivou apenas tornar pública a pretensão da recorrida, de modo a precaver eventuais interessados na aquisição de cotas da sociedade.

Da forma como apresentado, o protesto não inviabiliza a alienação das referidas cotas, mas assegura que potenciais compradores fiquem cientes tratar-se de bem litigioso, evitando com isso futura alegação de desconhecimento dos riscos envolvidos na negociação. Reveste-se, portanto, de garantia não apenas à recorrida e aos demais herdeiros, como também a terceiros de boa-fé.

Aliás, se como afirma o recorrente, o seu direito às cotas é tão claro e inconteste, basta apresentar seus argumentos a eventuais interessados, de sorte a afastar qualquer desconfiança suscitada pelo protesto.

Noto, por oportuno, que as instâncias ordinárias se limitaram a deferir o protesto por mandado, consignando não haver «a necessidade de que o protesto seja feito por edital, exceção prevista no art. 870 do CPC, uma vez que a situação objetiva espelhada nestes autos não é prevista em lei e a publicidade não é essencial para que o protesto atinja seu fim (ciência de terceiros), até porque as diversas ações que entre as partes tramitam pela Comarca de Belo Horizonte, traz o assunto para domínio público», bem como que «o CPC não dispõe sobre qualquer outro procedimento a ser adotado para as medidas cautelares de protesto, tal como a averbação ora requerida perante a OAB, não havendo razão para o deferimento de tal pedido». (fls. 308/309, e-STJ).

Sendo assim, também não se cogita que possa a medida «agredir a moral e a honra do recorrente», visto que o teor do protesto não terá ampla publicidade, tampouco constará dos assentamentos da OAB. A rigor, chegará ao conhecimento apenas do próprio recorrente e daqueles que tiverem interesse na aquisição das cotas da sociedade e, ainda assim, não como um elemento a impedir a concretização do negócio, mas como contingência a ser observada e levada em consideração pelo potencial comprador. ...» (Minª. Nancy Andrighi).»

Doc. LegJur (122.8763.7000.3400) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
Medida cautelar (Jurisprudência)
Protesto contra alienação de bens (v. Medida cautelar ) (Jurisprudência)
Alienação de bens (Jurisprudência)
Legítimo interesse (Jurisprudência)
CPC, art. 869
CPC, art. 870
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