Jurisprudência em Destaque

STJ. 4ª T. Consumidor. Sociedade. Pessoa jurídica. Conceito de consumidor. Utilização dos produtos e serviços adquiridos como insumos. Ausência de vulnerabilidade. Não incidência das normas consumeristas. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre a questão da vulnerabilidade do consumidor. Precedentes do STJ. CDC, arts. 2º, 3º, 4º, I, 29 e 39.

Postado por Emilio Sabatovski em 08/03/2012
«... 4. Não se olvida que o dinamismo e a complexidade das relações sócio-econômicas levaram à necessidade de aprofundamento desses critérios, criando uma tendência nova na jurisprudência, concentrada não apenas na figura do consumidor final imediato, mas também na noção de vulnerabilidade, conforme o teor do art. 4º, I, do CDC:


Art. 4º - A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:


I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

A vulnerabilidade é a pedra de toque do direito consumerista, mormente no que tange aos contratos, podendo ser conceituada como «a situação permanente ou provisória, individual ou coletiva, que fragiliza, enfraquece o sujeito de direitos, desequilibrando a relação de consumo». (MARQUES, Claudia Lima. Op. Cit. p. 73)

Surge, então, a figura do consumidor por equiparação, prevista no art. 29 do CDC, aplicável à pessoa jurídica que comprova a sua vulnerabilidade e cujo contrato com o fornecedor encontra-se fora do âmbito de sua especialidade.

É o que se extrai do art. 29 do CDC, inserto no capítulo referente às práticas comerciais:


Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

Recorrendo mais uma vez ao magistério de Cláudia Lima Marques:


O art. 29 supera, portanto, os estritos limites da definição jurídica de consumidor para imprimir uma definição de política legislativa. Para harmonizar os interesses presentes no mercado de consumo, para reprimir eficazmente os abusos de poder econômico, para proteger os interesses econômicos dos consumidores finais, o legislador colocou um poderoso instrumento nas mãos daquelas pessoas (mesmo agentes econômicos) expostas às práticas abusivas. Estas, mesmo não sendo «consumidores stricto sensu», poderão utilizar as normas especiais do CDC, seus princípios, sua ética de responsabilidade social no mercado, sua nova ordem pública, para combater as práticas comerciais abusivas. (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 635)

Nesses casos, este Tribunal Superior tem mitigado o rigor da concepção finalista do conceito de consumidor, consoante se dessume dos seguintes julgados:


AGRAVO REGIMENTAL . AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSUMIDOR. RELAÇÃO DE CONSUMO. CARACTERIZAÇÃO. DESTINAÇÃO FINAL FÁTICA E ECONÔMICA DO PRODUTO OU SERVIÇO. ATIVIDADE EMPRESARIAL. MITIGAÇÃO DA REGRA.


VULNERABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA. PRESUNÇÃO RELATIVA.


1. O consumidor intermediário, ou seja, aquele que adquiriu o produto ou o serviço para utilizá-lo em sua atividade empresarial, poderá ser beneficiado com a aplicação do CDC quando demonstrada sua vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica frente à outra parte.


2. Agravo regimental a que se nega provimento.


(AgRg no Ag 1316667/RO, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 11/03/2011)


ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR. MULTA IMPOSTA PELO PROCON. LEGITIMIDADE. RELAÇÃO DE CONSUMO CARACTERIZADA. ART. 29 DO CDC.


1. Hipótese em que o Procon aplicou à impetrante multa de R$ 3.441, 00, «levando em consideração a publicação do anúncio não autorizado pelo Reclamante» (Auto Posto Boa Esperança). A recorrente sustenta que não poderia ter sido autuada, pois o serviço por ela prestado - publicidade em lista empresarial impressa - «é classificado como insumo e não consumo».


2. Discutem-se, portanto, o enquadramento da atividade desenvolvida pela impetrante como relação de consumo e a conseqüente competência do Procon para a imposição de multa, por infração ao Código de Defesa do Consumidor (CDC).


3. O CDC incide nas relações entre pessoas jurídicas, sobretudo quando se constatar a vulnerabilidade daquela que adquire o produto ou serviço, por atuar fora do seu ramo de atividade.


4. De acordo com o art. 29 do CDC, «equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas». Nesse dispositivo, encontra-se um conceito próprio e amplíssimo de consumidor, desenhado em resposta às peculiaridades das práticas comerciais, notadamente os riscos que, in abstracto, acarretam para toda a coletividade, e não apenas para os eventuais contratantes in concreto.


5. A pessoa jurídica exposta à prática comercial abusiva equipara-se ao consumidor (art. 29 do CDC), o que atrai a incidência das normas consumeristas e a competência do Procon para a imposição da penalidade.


6. Recurso Ordinário não provido.


(RMS 27.541/TO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2009, DJe 27/04/2011)


DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. CONCEITO DE CONSUMIDOR. PESSOA JURÍDICA. EXCEPCIONALIDADE. NÃO CONSTATAÇÃO NA HIPÓTESE DOS AUTOS. FORO DE ELEIÇÃO. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. REJEIÇÃO.


- A jurisprudência do STJ tem evoluído no sentido de somente admitir a aplicação do CDC à pessoa jurídica empresária excepcionalmente, quando evidenciada a sua vulnerabilidade no caso concreto; ou por equiparação, nas situações previstas pelos arts. 17 e 29 do CDC.


- Mesmo nas hipóteses de aplicação imediata do CDC, a jurisprudência do STJ entende que deve prevalecer o foro de eleição quando verificado o expressivo porte financeiro ou econômico da pessoa tida por consumidora ou do contrato celebrado entre as partes.


- É lícita a cláusula de eleição de foro, seja pela ausência de vulnerabilidade, seja porque o contrato cumpre sua função social e não ofende à boa-fé objetiva das partes, nem tampouco dele resulte inviabilidade ou especial dificuldade de acesso à Justiça.


Recurso especial não conhecido.


(REsp 684.613/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/06/2005, DJ 01/07/2005, p. 530)


AGRAVO REGIMENTAL- PESSOA JURÍDICA - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICAÇÃO - POSSIBILIDADE, NA ESPÉCIE - DESTINATÁRIO FINAL E VULNERABILIDADE - CARACTERIZAÇÃO - ENTENDIMENTO OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME NESTA INSTÂNCIA ESPECIAL - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ - CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DO FORO - DECLARAÇÃO DE NULIDADE - ENTENDIMENTO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE - APLICAÇÃO DA SÚMULA 83/STJ - RECURSO IMPROVIDO.


(AgRg no Ag 1032259/MG, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/02/2009, DJe 12/03/2009)

Verifica-se, assim, que, conquanto consagre o critério finalista para interpretação do conceito de consumidor, a jurisprudência do STJ também reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e consumidores-empresários em que fique evidenciada a relação de consumo.

5. Retomando o caso concreto, verifica-se que a ora recorrida não se insere em situação de vulnerabilidade, porquanto não se apresenta como sujeito mais fraco, com necessidade de proteção estatal, mas como sociedade empresária que «explora o ramo de indústria, comércio, importação e exportação de cordas para instrumentos musicais e afins, acessórios para veículos, ferragens e ferramentas, serralheria em geral e trefilação de arames» (fl. 90), sendo certo que não utiliza os produtos e serviços prestados pela recorrente como sua destinatária final, mas como insumos dos produtos que manufatura.

Deveras, a sentença e o acórdão recorrido partiram do pressuposto de que todas as pessoas jurídicas são submetidas às regras consumeristas, razão pela qual entenderam pela abusividade da cláusula contratual que estipula o consumo mínimo, nada mencionando acerca de eventual vulnerabilidade - técnica, jurídica, fática, econômica ou informacional.

Confira-se elucidativo excerto do voto condutor (fls. 333-334):


Com efeito, ao contrário do alegado no apelo, o digno órgão a quo deu adequado desate ao litígio, de seu exame se verificando o acerto no enfrentamento das matérias relacionadas ao negócio jurídico em comento e às circunstâncias em que os atos teriam sido praticados, de tudo se aferindo que os pontos controversos, depois da cuidadosa análise das questões de fato e de direito postas em discussão, foram devidamente apreciados pelo julgador, que chegou ao dispositivo final dentro das razões de seu convencimento, com motivação pertinente, bem decidindo pela improcedência da ação, plenamente justificado esse resultado desfavorável à autora, ora apelante, diante da interpretação que o contrato admitia e que se mostrava mais que suficiente para desacolher a ação de cobrança, outro desfecho não comportando o r. decisório monocrático, dúvida não remanescendo sob o desequilíbrio entre as partes, que emanava da cláusula contratual estipulando consumo mínimo.


Ora, sendo inegável que o caso em tela se submetia ao Código de Defesa do Consumidor, segue-se que à ré, ora apelada, cabia ver resguardados seus direitos lá assegurados, bem agindo o douto sentenciante ao eximi-la de responder pela quantia que, dentro daquele contexto, estava sendo exigida pela autora na presente ação.


O art. 39 do CDC, que trata das práticas consideradas abusivas por parte do fornecedor, veda em seu inciso I, «condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos.»


O art. 51 do mesmo estatuto, por sua vez, determina que são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.


Dentro desses parâmetros, portanto, a cláusula quarta do contrato, que estipulava consumo mínimo mensal, não podia mesmo subsistir [...]

5. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para reconhecer a não incidência das regras consumeristas ao presente caso, cassando o acórdão recorrido e determinando o retorno dos autos ao Tribunal de apelação, para que outro julgamento seja proferido, observando-se os fundamentos acima invocados. ...» (Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (121.4235.0000.1300) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Consumidor (Jurisprudência)
Sociedade (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Pessoa jurídica (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Conceito (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Utilização dos produtos e serviços (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Insumos (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
Vulnerabilidade (v. Consumidor ) (Jurisprudência)
CDC, art. 2º
CDC, art. 3º
CDC, art. 4º, I
CDC, art. 29
CDC, art. 39
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