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STJ. 4ª T. Execução. Penhora. Bem de família. Impenhorabilidade. Considerações do Min. Luis Felipe Salomão sobre o histórico do instituto. Lei 8.009/1990, art. 1º.

Postado por Emilio Sabatovski em 17/11/2011
«... 4.1. Na verdade, o instituto do bem de família teve origem na República do Texas, regulamentado pela lei de 26.1.1839, Homestead Exemption Act. Homestead signifca local do lar (home = lar; stead = local), surgindo em defesa da pequena propriedade, em decorrência das penhoras em massa realizadas pelos credores nos bens dos devedores, resultantes da grande crise econômica ocorrida nos Estados Unidos entre os anos de 1837 e 1839.

Segundo o prof. Álvaro Villaça Azevedo, in Bem de Família, Comentários à Lei 8.009/90, 5ª Ed., Ed. RT, a Lei do Homestead (...) veio a proteger as famílias radicadas na República do Texas, livrando de qualquer execução judicial 50 acres de terra natural ou um lote de terreno na cidade, compreendendo a habitação e melhoramentos de valor não superior a 500 dólares, todos os móveis e utensílios de cozinha, desde que o valor não excedesse de 200 dólares, todos os instrumentos aratórios, até o valor de 50 dólares, além das utilidades, instrumentos e livros destinados ao comércio ou ao exercício profissional do devedor ou qualquer cidadão, cinco vacas leiteiras, uma parelha de bois ou um cavalo, 20 porcos e todas as provisões necessárias a uma ano de consumo. Teve esse diploma legislativo principalmente em vista firmar homem à terra, objetivando o desenvolvimento de uma civilização cujos cidadãos tivessem o mínimo necessário a uma vida decente e humana. (...) O homestead estadual, após o seu nascimento, em 1839, no Texas, é verdade, espalhou-se pelo território americano, implantando-se, no ano de 1849, em Vermont e Wisconsin; no de 1850, em Nova York e Michigan; no de 1851, em Indiana, New Jersey e Delaware e, no de 1864, em Nevada. Nestes Estados do Norte, mais necessitados do instituto, veio ele com remédio imediato, que, em seguida, foi sendo adotado no sul, dados os nefastos efeitos da Guerra de Secessão causados àquele rico território, primeiramente, no ano de 1865, na Flórida e Virgínia, depois, no ano de 1868, em Arkansas e Alabama; no de 1870, no Mississipi e na Geórgia. (...) Ao exame das legislações estaduais que adotaram o instituto jurídico do homestead, deixadas de lado as pequenas diferenças de tratamento legislativo do assunto, percebemos que essas leis apresentam uma tônica, exaltam três qualidades substanciais, três condições marcantes do homestead, apresentadas por Bureau: necessidade de existência de um direito sobre determinado imóvel que se pretende ocupar a título de homestead; necessidade de que o titular desse direito seja chefe de uma família (head of a family); necessidade de que seja esse imóvel ocupado pela família (occupancy). (...) As bases do bem de família, traçadas na primitiva República do Texas, permanecem vivas na legislação americana atual, nos Estados que admitem sua existência (págs. 25-38).

Destaca esse autor, ainda, que a crise norte-americana (...) impressionou a Europa, principalmente a França, que, em 12.7.1909, editou sua lei sobre o bien de famille, regulamentada, mais tarde, pelo decreto de 26.9.1910 (pág. 53).

4.2. Cumpre verificar, ademais, que o bem de família, tal como instituído em nosso sistema pela Lei 8.009/90, surgiu em razão da necessidade de aumento da proteção legal aos devedores, em momento de grande atribulação econômica decorrente do malogro de sucessivos planos governamentais, conforme refere, com propriedade, Márcio Manoel Maidame, in Impenhorabilidade e Direitos do Credor, Ed. Juruá, 2007, e de Carlos Gonçalves, in Impenhorabilidade do Bem de Família, Ed. Síntese, 4ª edição.

A propósito, vale transcrever as palavras do ex-Ministro da Justiça Saulo Ramos, ao prefaciar a última obra citada:


(...) Foi VICENTE RÁO quem me fez ler os primeiros livros sobre bem de família: Du Bien de Famille Insaisissable, de JACQUES TRÉMEAU, edição de 1910, e O Direito ao Lar, de ANTÔNIO MACIEIRA, Lisboa, edição de 1914, chamando a atenção para o direito preconizado naquelas obras. Com efeito, no trabalho de TRÉMEAU, tudo está resumido no primeiro parágrafo do prefácio, escrito pelo Senador JEAN RICHARD, na primeira década do século XX:

@EMEOUT1 = Dans notre pays, où le sentiment de la propriété individuelle est si dévelopé, enraciné si profondément dans le coeur de celui surtout qui cultive la terre, el fallait faciliter la formation de cette propriété à sa naissance contre les risques de destruction indépendants de la volonté du propriétaire, supérieurs même à cette volonté.


Fiquei fascinado pela tese. Advogado militante, conhecia bem a crueldade de algumas execuções, que lançavam famílias inteiras a condições degradantes de miséria, situações que, mais tarde, foram bem retratadas por CLÁUDIO VIANA DE LIMA quando advertiu: Não pode a execução ser utilizada como instrumento para causar a ruína, a fome, o desabrigo do devedor e sua família, gerando situações incompatíveis com a dignidade humana.


Impressionou-me, depois e profundamente, o excelente estudo do Professor ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO, em sua obra Bem de Família, quando analisa a falência do instituto da impenhorabilidade por ato voluntário, e formula o significativo apelo: Assim, não pode o Estado negar à família uma proteção sólida, por meio de um eficaz ordenamento jurídico, pois que mais lhe cabe responsabilidade nesse sentido do que ao indivíduo.


A Lei 8.009/90 cumpriu esta responsabilidade. JOSÉ SARNEY havia trabalhado com VICENTE RÁO, e absorvido as mesmas influências que absorvi. O destino o levou à Presidência da República. Convocou-me para auxiliá-lo. Sofremos quatro anos nas mãos dos economistas dando forma jurídica a planos de combate à inflação, sem resultado. Nos últimos meses do Governo Sarney, o processo inflacionário disparou, sob o impacto das declarações do Presidente eleito em 1989 e sua futura Ministra da Fazenda, que ameaçavam deixar a esquerda aturdida e a direita estarrecida. Juntou-se a nós o saudoso advogado FERRO COSTA, então Consultor-Geral da República, entusiasta do homestead norte-americano, embora não distinguisse entre o estadual e o federal, mas sustentando que um deles era preciso adotar em defesa da família brasileira, sacrificada pelos planos econômicos e, sobretudo, diante do desastre que se antevia no Governo Collor. Informei que já havia tratado da matéria em projeto enviado ao Congresso. Estávamos na última semana do mandato do Presidente SARNEY, que considerou ser a matéria urgente e relevante. Concordamos que para inovar em profundidade somente poderíamos adotar o modelo texano, o resto seria paliativo, como nos ensinara VICENTE RÁO há mais de trinta anos. O Presidente autorizou. Tranquei-me no Ministério da Justiça, redigi a Medida Provisória e uma ligeira exposição de motivos. Auxiliou-me, como em tudo, o meu então Chefe de Gabinete, Professor CARVALHO. Era o dia 7 de março, quarta-feira. No dia seguinte, SARNEY assinou-a e enviou-a ao Congresso Nacional. Havia tomado o número 143. Fomos embora no dia 15, e quando foi decretado o confisco dos ativos financeiros do povo pensei que o Governo Collor iria retirar a mensagem, mas o novo Ministro da Justiça ignorava sua existência. Felizmente, o Congresso aprovou-a sem alterações e promulgada foi pelo Senador NELSON CARNEIRO, grande batalhador pelo direito de família em nosso país, que, emocionado, me transmitiu a notícia pelo telefone, pedindo que a comunicasse a SARNEY. Assim, a Lei 8.009, de 29 de março de 1990, nasceu limpa. (pág. 29-30).

(...). »(Min. Luis Felipe Salomão).»

Doc. LegJur (117.7174.0000.4000) - Íntegra: Click aqui


Referências:
Execução (Jurisprudência)
Penhora (Jurisprudência)
Bem de família (v. Penhora ) (Jurisprudência)
Imóvel valioso (v. Impenhorabilidade ) (Jurisprudência)
Bairro nobre (v. Impenhorabilidade ) (Jurisprudência)
Lei 8.009/1990, art. 1º (Legislação)
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