Jurisprudência em Destaque

STF. Pleno. Seguridade social. FUNRURAL. Supremo desobriga empregador rural de recolher Funrural sobre receita bruta de sua comercialização. Lei 8.540/92, art. 1º. Inconstitucionalidade.

Postado por Emilio Sabatovski em 03/03/2010
Por votação unânime, o Plenário do STF declarou, no dia 03/02/2010, a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/92, que prevê o recolhimento de contribuição para o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural de empregadores, pessoas naturais.
A decisão, que neste caso beneficia os fornecedores de bovinos para abate, foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 363.852, interposto pelo Frigorífico Mataboi S/A, de Mato Grosso do Sul, e uma subsidiária sua. No recurso, elas contestavam acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que manteve sentença proferida em Mato Grosso do Sul no sentido da constitucionalidade do dispositivo legal impugnado.
Rombo
No mesmo julgamento, o Plenário do STF negou, por maioria, pedido da Advocacia Geral da União (AGU), que atuou em defesa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), para que a Suprema Corte modulasse os efeitos da decisão, aplicando-a com efeitos ex nunc, ou seja de forma não-retroativa (nesse caso não haveria devolução dos valores recolhidos, que simplesmente deixariam de ser cobrados). A negativa da Suprema Corte abre a possibilidade de outros produtores ajuizarem ações pleiteando o mesmo direito obtido pelo Frigorífico Mataboi S/A.
Era justamente o temor de novas ações – já que o recurso hoje julgado somente beneficia seus autores - que levou o INSS, por intermédio da AGU, a pedir a modulação. O Instituto alegou que haveria risco potencial de uma enxurrada de tais ações provocar um rombo superior a R$ 11 bilhões nas contas da Previdência.
Único voto discordante neste particular, a ministra Ellen Gracie votou pela modulação da decisão, justamente para evitar uma possível enxurrada de ações na Justiça de primeiro grau que, segundo ela, vai de encontro ao esforço em curso para tornar o Judiciário mais ágil.
Além disso, no entender da ministra, a restituição de contribuições ao Funrural, já efetuadas por conta do dispositivo hoje declarado inconstitucional, propiciaria um enriquecimento ilícito, visto que as contribuições recolhidas no passado certamente foram incorporadas pelos produtores aos preços dos seus produtos.
No entanto, o ministro Cezar Peluso, que trouxe o processo de volta ao Plenário, depois de haver pedido vista em novembro de 2006, manifestou opinião em sentido contrário. No entendimento dele, a contribuição ao Funrural representa uma dupla tributação, uma vez que o produtor rural que trabalha em regime familiar, sem empregados, é um segurado especial que já recolhe, por força do artigo 195, parágrafo 8º, uma contribuição sobre o resultado da comercialização de sua produção para ter direito a benefícios previdenciários.
Ademais, no entender dele, o artigo agora declarado inconstitucional representa um desestímulo ao produtor rural, encorajando-o a viver da mera subsistência para fugir da tributação, em vez de dar a sua propriedade uma destinação social, oferecendo emprego e produzindo alimentos para a sociedade.
O caso
No RE, o Frigorífico Mataboi S/A e a empresa comercial do mesmo grupo alegaram que o TRF-1, cujo acórdão contestam, interpretou incorretamente o disposto no art. 195, I e § 4º e 8º e no art. 14, III da CF/88, ao decidir que as empresas deveriam recolher ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) o Funrural sobre a venda dos produtos.
As empresas alegaram, também, que o art. 1º da Lei 8.540/92 teria criado nova forma de contribuição social sobre a receita bruta decorrente da comercialização da produção rural, ao equiparar «empregadores rurais» a «segurados especiais». Segundo elas, esta equiparação se restringiria às empresas comerciais, industriais e prestadoras de serviços, não alcançando os empregadores rurais, pessoas naturais.
Argumentaram, além disso, que a norma não poderia ser criada por meio de lei ordinária, mas somente por intermédio de lei complementar.
Para a defesa da Mataboi, a lei atacada, ao considerar receita e faturamento como conceitos equivalentes, promove a bitributação, devido à incidência de PIS/Cofins. Alegam as empresas que o artigo 1º da Lei 8.540/92 fere os princípios constitucionais da isonomia, da capacidade produtiva e da proporcionalidade, pedindo assim, incidentalmente, a declaração de sua inconstitucionalidade.
Desobrigação
A decisão desta quarta-feira, tomada pelo Plenário do STF, que acolheu os argumentos da empresa e de sua subsidiária, desobriga-as da retenção e do recolhimento da contribuição social ou de seu recolhimento por sub-rogação sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural de empregadores pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate.
Esta desobrigação é consequência da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII; 25, I e II, e 30, IV, da Lei 8.212/91 (Lei geral da Previdência), com redação atualizada até a Lei 9.528/97, que alterou. A decisão valerá até que legislação nova, arrimada na Emenda Const. 20/98 (que modifica o sistema de previdência social), venha a instituir a contribuição.
A origem do processo está no fato de o Frigorífico Mataboi adquirir bovinos de produtores rurais, pessoas naturais e, nessa condição, acabar figurando como sub-rogado nas obrigações da pessoa física de recolher o tributo.
Iniciado em 2002
O processo deu entrada no STF em novembro de 2002, tendo inicialmente como relator o ministro Maurício Corrêa. Em dezembro de 2003, a relatoria passou para o ministro Marco Aurélio. Levado a julgamento pela primeira vez em novembro de 2005, o ministro Eros Grau pediu vista, depois que o relator havia dado provimento ao recurso.
Em novembro de 2006, o Min. Eros Grau trouxe o processo de volta a julgamento, manifestando-se também por seu provimento. Foi acompanhado pelos votos dos ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Carlos Britto. Mas o julgamento foi interrompido por novo pedido de vista, desta feita, do Min. Cezar Peluso.
Hoje, o ministro levou seu voto-vista ao Plenário, que concluiu o julgamento do processo, dando integral provimento ao RE. Além de Peluso, que acompanhou os votos até então proferidos, deram provimento ao recurso, também, os ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ellen Gracie e o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes.



Veja a íntegra do Relatório e Voto do Min. Marco Aurélio:

RELATÓRIO



O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – O Tribunal Regional Federal da 1ª Região negou acolhida a pedido formulado em apelação, ante fundamentos assim sintetizados (folha 743):

CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS RURAIS. CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA FÍSICA. CONTRIBUIÇÃO DO SEGURADO ESPECIAL. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE AFASTADA. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA POR SUBSTITUIÇÃO DO ADQUIRENTE DA PRODUÇÃO RURAL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 195, I. CTN, ART. 128. LEI 8.540/92, ART. 1º, QUE CONFERIU NOVA REDAÇÃO AOS ARTS. 12, V E VII, 25, I E II, E 30, IV, DA LEI 8.212/91. FATO SUPERVENIENTE. CPC, ART. 462.

I. A autoridade da decisão proferida em mandado de segurança deve ser respeitada enquanto não reformada, ensejando, em um primeiro momento, a inexigibilidade das exações questionadas até a edição da Lei 8.540/92. Posteriormente, em face dos arts. 462 e 497, ambos do CPC, com a denegação da ordem de segurança neste Tribunal, restou exigível a Contribuição ao FUNRURAL sem as restrições determinadas no mandamus.

II. A Contribuição Social ao FUNRURAL incidente sobre a Comercialização de Produtos Rurais foi recepcionada pelo novo Estatuto Constitucional (ADCT, art. 34), mormente porque atende à universalidade do custeio da seguridade social e aos requisitos da competência residual, veiculação por lei complementar, vedação de bis in idem e não cumulatividade (CF, art. 195, § 4º c/c o art. 154, I).

III. Com a edição da Lei 8.212/91, referida contribuição não foi referendada.

IV. Os arts. 12, V e VII, e 25, I e II, da Lei 8.212/91, com a redação que lhes foi conferida pela Lei 8.540/92, têm amparo constitucional no art. 195, I e § 8º, da Carta Constitucional.

V. Não há bis in idem ou bitributação se estão todos os tributos questionados discriminados na Constituição Federal.

VI. Prevalece, na jurisprudência do excelso Pretório, o entendimento de que, para fins da composição do arquétipo de incidência fiscal, receita bruta e faturamento se equiparam, tendo esse reconhecimento ocorrido no âmbito da Emenda Constitucional 20/98.

VII. O art. 30, IV, da Lei 8.212/91, com a redação imprimida pelo art. 1º da Lei 8.541/92 consubstancia modalidade de substituição regressiva, tendo fundamento no art. 128 do CTN.

VIII. Apelação improvida.

No recurso extraordinário de folha 745 a 764, interposto com alegada base na alínea «a» do permissivo constitucional, articula-se com a transgressão dos artigos 146, inciso III, 154, inciso I, e 195, inciso I, § 4º e § 8º, da Carta Política da República. Sustenta-se que «a crença de que todos devem participar do custeio da seguridade social não pode ser levada ao extremo de que a contribuição se faça a qualquer custo e sobre todas as fontes evidenciadas no artigo 195, inciso I, da Constituição Federal» (folha 752). Salienta-se que devem ser considerados os limites da lei e as características da atividade de determinados empregadores. «Assim, aqueles que não possuem faturamento nem lucro, como os empregadores rurais, pessoas físicas, contribuem somente sobre a folha de salários, sem que isto signifique a sua exclusão do universo de contribuintes; e aqueles que não possuem empregados, exercendo suas atividades rurais em regime de economia familiar, não contribuem sobre a folha de salários, nem sobre o lucro, mas contribuem sobre o resultado da comercialização da sua produção» (folha 752). Aponta-se a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei 8.212/91. Assevera-se que o resultado da comercialização da produção constituía base de cálculo da contribuição social apenas para os produtores rurais que exercessem suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados, sendo inviável que se estendesse tal hipótese de incidência, mediante lei ordinária, aos demais empregadores rurais, equiparando-os aos segurados especiais. Aduz-se ser imprescindível, para tanto, a edição de lei complementar, cuja ausência acabou por viciar também as leis posteriores a respeito da matéria, até a Lei 9.528/97. Nesse ponto, argui-se, inclusive, a necessidade, para alteração, de emenda constitucional, em face do disposto no artigo 195, § 8º, da Constituição Federal. Afirma-se que as decisões desta Corte proferidas na Ação Declaratória de Constitucionalidade 1 1/DF e na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.103-1/DF, acerca da equiparação de faturamento a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza, restringem-se a empresas comerciais, industriais e prestadoras de serviços, não alcançando os empregadores rurais, pessoas naturais. Ressalta-se que a superveniência da Emenda Constitucional nº 20/98, com o acréscimo, na alínea «b» do inciso I do artigo 195 da Carta, da expressão «a receita ou o faturamento», não serve à situação, na medida em que apenas deixou claro que os conceitos de receita e faturamento são distintos. Argumenta-se que, a partir daí, poder-se-á aprovar lei complementar, definindo-se,

como base de cálculo para a contribuição social devida pelos empregadores rurais, a receita ou o faturamento. Quanto ao passado, no entanto, mostrar-se-ia inviável a cobrança da exação sobre o resultado da comercialização da produção. Procede-se à transcrição de longo trecho de trabalho doutrinário elaborado por Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo, denominado «Inconstitucionalidade da Contribuição Previdenciária dos Produtores Rurais, Instituída pela Lei 8.870/94».

O Instituto Nacional do Seguro Social apresentou as contra-razões de folha 767 a 773. Esclarece que a empresa recorrente é responsável, por substituição tributária, pela retenção e recolhimento das contribuições sociais dos empregadores rurais – pessoas naturais -incidentes sobre a receita bruta da comercialização dos produtos e salienta que a fixação de tal base de incidência por meio de lei ordinária «não constitui inconstitucionalidade, pois não se trata de nova fonte de custeio, já que o faturamento já era expressamente previsto pela CF/88 como base de incidência para as contribuições sociais» (folha 772).

O pronunciamento atinente ao juízo primeiro de admissibilidade encontra-se à folha 774.

A Procuradoria Geral da República, no parecer de folha 778 a 783, preconiza o não-acolhimento do recurso.

É o relatório.


VOTO



O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO (RELATOR) – Na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos gerais de recorribilidade. Os documentos de folhas 43, 213 e 765 evidenciam a regularidade da representação processual e do preparo. Quanto à oportunidade, o acórdão recorrido teve notícia veiculada no Diário de 22 de janeiro de 2002, segunda-feira (folha 744), ocorrendo a manifestação do inconformismo em 14 de fevereiro imediato, quarta feira (folha 745), no prazo assinado em lei, considerando-se que o início da contagem deu-se após o término do período de férias coletivas.

A origem deste processo está no fato de os recorrentes adquirirem bovinos de produtores rurais, pessoas naturais. Então, à luz do inciso IV do artigo 30 da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, surgem como «sub-rogados nas obrigações da pessoa física de que trata a alínea «a» do inciso V do art. 12 e do segurado especial pelo cumprimento das obrigações do art. 25 desta Lei, exceto no caso do inciso X deste artigo, na forma estabelecida em regulamento». A exceção aberta à responsabilidade fixada corre à conta da comercialização direta pelo produtor rural, a pessoa natural, com o exterior ou no varejo, para o consumidor. Em síntese, são os recorrentes os responsáveis pelo que devido pelo segurado obrigatório, pessoa natural que explore atividade pecuária, consoante dispõe o artigo 25, incisos I e II, da Lei 8.212/91:

Art. 25. A contribuição da pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente, na alínea «a» do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta lei, destinada à Seguridade Social, é de:

I. dois por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;

II. um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento de complementação das prestações por acidente de trabalho.

(...)

O artigo 195 da Carta da República, ao revelar, no inciso I, as balizas primárias da contribuição do empregador, alude à «folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício»; à receita ou ao faturamento e ao lucro – alíneas «a», «b» e «c». A previsão é exaustiva quanto aos fatos que podem dar causa à obrigação de financiamento da seguridade social. Na redação primitiva, anterior à Emenda Constitucional nº 20/98, tratando-se de empregador, a contribuição decorreria da folha de salários, do faturamento ou do lucro, não surgindo a possibilidade de se ter cumulação em virtude de ato normativo ordinário. Somente a Constituição Federal é que, considerado o mesmo fenômeno jurídico, pode abrir exceção à unicidade de incidência de contribuição. Isso ocorre, como exemplificado em parecer de Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo, publicado na Revista Dialética de Direito Tributário, página 94, no tocante à folha de salários, no caso das contribuições para o SESI, o SESC, etc e em relação ao faturamento, presentes a Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS e o Programa de Integração Social – PIS. Tanto é assim que, no artigo 240 inserto no Título IX – «Das Disposições Constitucionais Gerais» - da Carta de 1988, previu-se:

Art. 240. Ficam ressalvadas do disposto no art. 195 as atuais contribuições compulsórias dos empregadores sobre a folha de salários, destinadas às entidades privadas de serviço social e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical.

Já o PIS veio a ser agasalhado, especialmente considerada a contribuição da empresa a partir do faturamento, pelo artigo 239 também das Disposições Gerais da Carta de 1988:

Art. 239. A arrecadação decorrente das contribuições para o Programa de Integração Social, criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970, e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, criado pela Lei Complementar 8, de 3 de dezembro de 1970, passa, a partir da promulgação desta Constituição, a financiar, nos termos que a lei dispuser, o programa do seguro-desemprego e o abono de que trata o § 3º deste artigo.

(...)

Cumpre assentar, como premissa constitucional, que, no tocante ao faturamento e ao financiamento do gênero «seguridade social», conta-se apenas com essas duas exceções. A regra, dada a previsão da alínea «b» do inciso I do referido artigo 195, é a incidência da contribuição social sobre o faturamento, para financiar a seguridade social instituída pela Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991, a obrigar não só as pessoas jurídicas, como também aquelas a ela equiparadas pela legislação do

imposto sobre a renda – artigo 1º da citada lei complementar. Já aqui surge duplicidade contrária à Carta da República, no que, conforme o artigo 25, incisos I e II, da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, o produtor rural passou a estar compelido a duplo recolhimento, com a mesma destinação, ou seja, o financiamento da seguridade social – recolhe, a partir do disposto no artigo 195, inciso I, alínea «b», a COFINS e a contribuição prevista no referido artigo 25. Vale frisar que, no artigo 195, tem-se contemplada situação única em que o produtor rural contribui para a seguridade social mediante a aplicação de alíquota sobre o resultado de comercialização da produção, ante o disposto no § 8º do citado artigo 195 -a revelar que, em se tratando de produtor, parceiro, meeiro e arrendatários rurais e pescador artesanal bem como dos respectivos cônjuges que exerçam atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, dá-se a contribuição para a seguridade social por meio de aplicação de alíquota sobre o resultado da comercialização da produção. A razão do preceito é única: não se ter, quanto aos nele referidos, a base para a contribuição estabelecida na alínea «a» do inciso I do artigo 195 da Carta, isto é, a folha de salários. Daí a cláusula contida no § 8º em análise «... sem empregados permanentes...».

Forçoso é concluir que, no caso de produtor rural, embora pessoa natural, que tenha empregados, incide a previsão relativa ao recolhimento sobre o valor da folha de salários. É de ressaltar que a Lei 8.212/91 define empresa como a firma individual ou sociedade que assume o risco de atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos, ou não, bem como os órgãos e entidades da administração pública direta, indireta e fundacional – inciso I do artigo 15. Então, o produtor rural, pessoa natural, fica compelido a satisfazer, de um lado, a contribuição sobre a folha de salários e, de outro, a COFINS, não havendo lugar para ter-se novo ônus, relativamente ao financiamento da seguridade social, isso a partir de valor alusivo à venda de bovinos. Cumpre ter presente, até mesmo, a regra do inciso II do artigo 150 da Constituição Federal, no que veda instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente. De acordo com o artigo 195, § 8º, do Diploma Maior, se o produtor não possui empregados, fica compelido, inexistente a base de incidência da contribuição -a folha de salários -a recolher percentual sobre o resultado da comercialização da produção. Se, ao contrário, conta com empregados, estará obrigado não só ao recolhimento sobre a folha de salários, como também, levando em conta o faturamento, da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS e da prevista -tomada a mesma base de incidência, o valor comercializado -no artigo 25 da Lei 8.212/91. Assim, não fosse suficiente a duplicidade, considerado o faturamento, tem-se, ainda, a quebra da isonomia.

O tema ora em discussão por pouco não foi objeto de julgamento quando apreciada a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.103-1/DF. O Tribunal deixou de adentrar a questão ante a falta de pertinência temática, porque ajuizada a ação pela Confederação Nacional da Indústria. Todavia, foi adiante quanto ao § 2º do artigo 25 da Lei 8.870/94, que tinha a seguinte redação:

§ 2º O disposto neste artigo se estende às pessoas jurídicas que se dediquem à produção agroindustrial, quanto à folha de salários de sua parte agrícola, mediante o pagamento da contribuição prevista neste artigo, a ser calculada sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado.

Pois bem, concluiu-se pelo surgimento de uma nova base de cálculo, ficando assim redigida a ementa:

1. Preliminar: ação direta conhecida em parte quanto ao § 2º do art. 25 da Lei 8.870/94; não conhecida quanto ao caput do mesmo artigo, por falta de pertinência temática entre os objetivos da requerente e a matéria impugnada.

2. Mérito. O art. 195, I, da Constituição prevê a cobrança de contribuição social dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; desta forma, quando o § 2º do artigo 25 da Lei 8.870/94 cria contribuição social sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado o seu preço de mercado, é ele inconstitucional porque usa uma base de cálculo não prevista na Lei Maior.

3. § 4º do art. 195 da Constituição prevê que a lei complementar pode instituir outras fontes de receita para a seguridade social; desta forma, quando a Lei 8.870/94 serve- se de outras fontes, criando contribuição nova, além das expressamente previstas, ela é inconstitucional, porque é lei ordinária, insuscetível de veicular tal matéria.

4. Ação direta julgada procedente, por maioria, para declarar a inconstitucionalidade do § 2º do artigo 25 da Lei 8.870/94 – Diário da Justiça de 25 de abril de 1997, ementário 1866/02.

Assentou o Plenário que o § 2º do artigo 25 da Lei 8.870/94 fulminado ensejara fonte de custeio sem observância do § 4º do artigo 195 da Constituição Federal, ou seja, sem a vinda à balha de lei complementar. O enfoque serve, sob o ângulo da exigência desta última, no tocante à disposição do artigo 25 da Lei 8.212/91. É que, mediante lei ordinária, versou-se a incidência da contribuição sobre a proveniente da comercialização pelo empregador rural, pessoa natural. Ora, como salientado no artigo de Hugo de Brito Machado e Hugo de Brito Machado Segundo, houvesse confusão, houvesse sinonímia entre o faturamento e o resultado da comercialização da produção, não haveria razão para a norma do § 8º do artigo 195 da Constituição Federal relativa ao produtor que não conta com empregados e exerça atividades em regime de economia familiar. Já estava ele alcançado pela previsão imediatamente anterior – do inciso I do artigo 195 da Constituição. Também sob esse prisma, procede a irresignação, entendendo-se que comercialização da produção é algo diverso de faturamento e este não se confunde com receita, tanto assim que a Emenda Constitucional 20/98 inseriu, ao lado do vocábulo «faturamento», no inciso I do artigo 195, o vocábulo «receita». Então, não há como deixar de assentar que a nova fonte deveria estar estabelecida em lei complementar. O mesmo enfoque serve a rechaçar a óptica daqueles que vislumbram, no artigo 25, incisos I e II, da Lei 8.212/91, a majoração da alíquota alusiva à citada contribuição que está prevista na Lei Complementar 70/91.

Ante esses aspectos, conheço e provejo o recurso interposto para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por sub rogação sobre a «receita bruta proveniente da comercialização da produção rural» de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei 8.212/91, com redação atualizada até a Lei 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional 20/98, venha a instituir a contribuição, tudo na forma do pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência (folha 699).


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