Jurisprudência em Destaque

STJ. 3ª T. Comercial. Propriedade industrial. Marca evocativa. Marca «Paleteira». Registro no INPI. Exclusividade. Mitigação. Possibilidade. Considerações da Minª. Nancy Andrighi sobre o tema. Lei 9.279/1996, arts. 124, VI, 129 e 209.

Postado por Emilio Sabatovski em 06/02/2014
«... Cinge-se a lide a determinar se, na hipótese específica dos autos, houve violação de direito marcário da recorrente, bem como se há dano moral indenizável. Incidentalmente, cumpre estabelecer se o direito de terceiro à utilização de determinada marca exige prévia desconstituição do respectivo registro junto ao INPI.

A presente ação foi ajuizada com o escopo de assegurar à recorrente o direito à utilização, com exclusividade, da marca «paleteira», por ela registrada junto ao INPI.

Antes de prosseguir, saliento constituir fato incontroverso nos autos que a marca em questão se utiliza de vocábulo de uso comum. Trata-se, pois, de marca que se classifica como fraca ou evocativa, isto é, de reduzido grau de distintividade, por estar associada ao produto ou serviço que pretende assinalar.

Partindo dessa premissa, o TJ/SP reconheceu o direito da recorrente à utilização da marca, mas analisou a controvérsia sob outra perspectiva, qual seja, «se poderiam outras empresas utilizar expressão de uso comum, concomitantemente com a proteção da marca registrada com exclusividade», concluindo que «neste caso, não há propriamente a anulação do registro, mas a possibilidade de outras empresas utilizarem o vocábulo de uso comum, designativo, no caso, de uma máquina específica provida de garras apropriadas para o transporte de paletes». (fl. 215, e-STJ).

Com efeito, marcas evocativas possuem um âmbito de proteção limitado, de modo que a exclusividade a elas conferida admite mitigação, examinando-se a sua distintividade a partir de critérios mais flexíveis.

Afinal, o monopólio de um nome ou sinal genérico em benefício de um comerciante implicaria exclusividade inadmissível, a favorecer a detenção e o exercício do comércio de forma única, com prejuízo não apenas à concorrência empresarial – impedindo os demais industriais do ramo de divulgarem a fabricação de produtos semelhantes através de expressões de conhecimento comum, obrigando-os à busca de nomes alternativos estranhos ao domínio público – mas sobretudo ao mercado em geral, que teria dificuldades para identificar produtos similares aos do detentor da marca.

Tanto é assim que a própria Lei 9.279/96, em seu art. 124, VI, dispõe não ser registrável como marca sinal de caráter genérico, necessário, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço.

Aliás, a linha que divide as marcas genéricas – não sujeitas a registro – das evocativas é extremamente tênue, por vezes imperceptível, fruto da própria evolução ou desenvolvimento do produto ou serviço no mercado.

Melhor explicando, há expressões que, não obstante estejam diretamente associadas a um produto ou serviço, de início não estabelecem com este uma relação de identidade tão próxima ao ponto de serem empregadas pelo mercado consumidor como sinônimas. Com o transcorrer do tempo, porém, à medida em que se difunde no mercado, o produto ou serviço pode vir a estabelecer forte relação com a expressão, que passa a ser de uso comum, ocasionando sensível redução do seu caráter distintivo. Nesses casos, expressões que, a rigor, não deveriam ser admitidas como marca por força do óbice contido no art. 124, VI, da LPI, acabam sendo registradas pelo INPI, ficando sujeitas a terem sua exclusividade mitigada.

Quem, por exemplo, 50 anos atrás, imaginaria que a expressão «fast-food». iria se popularizar ao ponto de ser utilizada para indicar não apenas um gênero de comida, mas, por metonímia, os próprios estabelecimentos onde esse tipo de alimento é servido. Hoje, contudo, tivesse alguém registrado a expressão «fast-food». como marca, não se mostraria razoável impedir a sua utilização por terceiros, ante ao claro prejuízo que se acarretaria para a concorrência e para os consumidores em geral.

É justamente essa a situação dos autos. Conforme ressalta a própria recorrente, ela detém o registro da marca «paleteira». junto ao INPI desde 05.06.1972. É provável que, há mais de 40 anos, o vocábulo «paleteira». – que nada mais é do que o nome dado ao veículo próprio para o transporte de paletas ou estrados – ainda não fosse tão difundido no mercado, o que levou o INPI a ignorar as restrições do art. 65 da Lei 5.772/71, então vigente, agora contidas no art. 124 da Lei 9.279/96. Atualmente, no entanto, conforme definido pelas instâncias ordinárias, o termo «paleteira». constitui expressão de uso comum, cujo uso exclusivo enquanto marca há de ser visto com temperamento.

Outrossim, independentemente do motivo que tenha levado o INPI a aceitar marca composta por expressão de baixo grau de distintividade, fato é que não se põe em discussão, nesse processo, a validade ou legitimidade do registro – o que, consoante jurisprudência consolidada desta Corte, demandaria ação própria, para a qual seria competente a Justiça Federal – mas sim os limites conferidos à exclusividade assegurada pelo art. 129 da Lei 9.279/96.

Nesse aspecto, o STJ já decidiu que «a marca registrada junto ao INPI de cunho genérico, estreitamente ligada ao produto, torna possível o uso por empresas do mesmo ramo de atividades, desde que no sentido comum e em conjunto com outros elementos identificadores, não havendo que se falar em exclusividade e anulação de registro por via própria». (REsp 128.136/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 09.10.2000. No mesmo sentido: REsp 62.754/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Nilson Naves, DJ de 03.08.1998; REsp 242.083/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 05.02.2001; e REsp 237.954/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 15.03.2004).

  • 242.083/STJ (Marca. Ausência de confusão ou dúvida. «Ticket». Expressão de uso comum, corriqueiro. Precedentes do STJ. Súmula 07/STJ).


  • 237.954/STJ (Marca. «Off price». Vocábulo de uso comum. Uso no contexto da denominação de um centro comercial. Possibilidade. Proteção ao à marca ou nome comercial. Necessidada da essencial distintividade. Precedentes do STJ. Considerações do Min. Castro Filho sobre o tema. Lei 9.279/96, arts. 124, VI e 129).


  • 128.136/STJ (Propriedade industrial. Marca registrada «banknote» - Denominação genérica de produto. Desnecessidade de anulação do registro. Precedentes do STJ).


  • 62.754/STJ (Propriedade industrial. Marca/nome comercial. «Delicatessen»).


Vale destacar, ainda, julgado mais recente, de minha relatoria, no qual se consignou que «marcas fracas ou evocativas, que constituem expressão de uso comum, de pouca originalidade ou forte atividade criativa, podem coexistir harmonicamente. É descabida, portanto, qualquer alegação de notoriedade ou anterioridade de registro, com o intuito de assegurar o uso exclusivo da expressão de menor vigor inventivo». (REsp 1.166.498/RJ, 3ª Turma, DJe de 30.03.2011).

No particular, além de reconhecer que a marca em questão se utiliza de vocábulo de uso comum, o TJ/SP ressalvou que «nem a má-fé, nem a concorrência desleal restaram demonstradas nos autos», frisando que «embora a empresa autora seja titular da marca paleteira perante o INPI, identifica-se perante seus clientes pelo nome Zeloso», para concluir que «não se pode penalizar o réu por utilizar nome comumente empregado para designar maquinário vendido pela ré e por diversas outras empresas do ramo». (fl. 220, e-STJ).

Como se vê, a hipótese dos autos se amolda perfeitamente à situação excepcional vislumbrada pelo STJ para mitigar a exclusividade conferida pelo registro da marca no INPI.

Por outro lado, qualquer tentativa de infirmar as premissas fixadas pelo TJ/SP de modo a afastar a incidência do entendimento contido nos precedentes acima mencionados exigiria o revolvimento do substrato fático-probatório dos autos, procedimento que encontra óbice no enunciado da Súmula 7/STJ.

No que tange ao precedente alçado a paradigma pela recorrente – REsp 325.158/SP – uma análise detida dos fundamentos do voto divergente e vencedor lançado pelo saudoso Min. Carlos Alberto Menezes Direito evidenciam que o julgado, na verdade, corrobora o raciocínio aqui desenvolvido.

  • 325.158/STJ (Ação cominatória. INPI. Registro. Nulidade incidental. Marca. Expressão «no breaks» e sigla «UPS». Exclusividade de uso pelo titular do registro).


Após minucioso levantamento dos julgados até então proferidos pelo STJ, o i. Min. Menezes Direito concluiu que esta Corte, como regra, considerava necessária a prévia desconstituição do registro, por ação própria, para que se pudesse afastar a garantia de exclusividade da marca. Em seguida, porém, ressalvou a existência de casos em que o STJ «autorizou o uso [da marca por terceiros] apesar do registro», por ter constatado a existência de «circunstâncias peculiares, a partir da condição do registro deferido pelo próprio INPI».

Na realidade, a divergência do i. Min. Menezes Direito em relação ao voto que então proferi foi quanto à possibilidade da nulidade do registro ser arguida em sede de defesa e reconhecida incidentalmente pela Justiça Comum. Cuida-se, como visto, de divergência superada no âmbito do STJ, tendo eu mesma revisto meu posicionamento ao julgar o REsp 1.322.718/SP, 3ª Turma, minha relatoria, DJe de 11.12.2012, quando decidi que «a alegação de que é inválido o registro, obtido pela titular de marca perante o INPI, deve ser formulada em ação própria, para a qual é competente a Justiça Federal. Ao Juiz estadual não é possível, incidentalmente, considerar inválido um registro vigente perante o INPI». Nessa ocasião, ressalvei expressamente que, no julgamento do REsp 325.158/SP, aqui alçado a paradigma, «proferi voto vencido, defendendo a possibilidade de reconhecimento incidental da nulidade de marca. Contudo, curvo-me à posição que se sagrou vencedora no âmbito desta 3ª Turma, não apenas por uma questão de disciplina judiciária, mas também porque, no mérito, convenci-me, depois, de que este é o melhor entendimento acerca do assunto».

  • 1.322.718/STJ (Processo civil e comercial. Marca. Nulidade. Declaração. Competência. Contrafação. Danos materiais e morais. Prova).


  • 325.158/STJ (Ação cominatória. INPI. Registro. Nulidade incidental. Marca. Expressão «no breaks» e sigla «UPS». Exclusividade de uso pelo titular do registro).




Seja como for, o REsp 325.158/SP não caracteriza dissídio; ao contrário, ratifica o entendimento ora exposto de que, em circunstâncias excepcionais, verificado que a marca contém expressão de uso comum, deve-se mitigar a regra de exclusividade decorrente do registro, admitindo-se a utilização dessa expressão por terceiros de boa-fé.



Sendo assim, não se vislumbra ofensa ao art. 129 da Lei 9.279/96.

No mais, afastada a alegação de violação a direito de propriedade, fica prejudicada a análise de negativa de vigência dos arts. 186 e 927 do CC/02; e 129 da Lei 9.279/96.

Forte nessas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial. ...» (Minª. Nancy Andriughi).»

Doc. LegJur (140.2850.6000.0000) - Íntegra: Click aqui


Referência(s):
▪ Comercial (Jurisprudência)
▪ Propriedade industrial (Jurisprudência)
▪ Marca (v. ▪ Marca evocativa) (Jurisprudência)
▪ Marca evocativa (Jurisprudência)
▪ Marca «Paleteira» (Jurisprudência)
▪ Registro no INPI (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
▪ INPI (v. ▪ Marca) (Jurisprudência)
Lei 9.279/1996, art. 124, VI (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 129 (Legislação)
Lei 9.279/1996, art. 209 (Legislação)
▪  1.322.718/STJ (Processo civil e comercial. Marca. Nulidade. Declaração. Competência. Contrafação. Danos materiais e morais. Prova).
▪  325.158/STJ (Ação cominatória. INPI. Registro. Nulidade incidental. Marca. Expressão «no breaks» e sigla «UPS». Exclusividade de uso pelo titular do registro).
▪  242.083/STJ (Marca. Ausência de confusão ou dúvida. «Ticket». Expressão de uso comum, corriqueiro. Precedentes do STJ. Súmula 07/STJ).
▪  237.954/STJ (Marca. «Off price». Vocábulo de uso comum. Uso no contexto da denominação de um centro comercial. Possibilidade. Proteção ao à marca ou nome comercial. Necessidada da essencial distintividade. Precedentes do STJ. Considerações do Min. Castro Filho sobre o tema. Lei 9.279/96, arts. 124, VI e 129).
▪  128.136/STJ (Propriedade industrial. Marca registrada «banknote» - Denominação genérica de produto. Desnecessidade de anulação do registro. Precedentes do STJ).
▪  62.754/STJ (Propriedade industrial. Marca/nome comercial. «Delicatessen»).
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