Jurisprudência Selecionada

Doc. LEGJUR 156.4933.2002.2800

1 - STJ Seguro de vida. Morte do segurado. União estável. Concubinato. Companheira. Sucessão. Ausência de indicação de beneficiário. Pagamento administrativo à companheira e aos herdeiros. Pretensão judicial da ex-esposa. Separação de fato. Configuração. CCB/2002, art. 792. Hermenêutica. Interpretação sistemática e teleológica. Divisão igualitária entre o cônjuge não separado judicialmente e o convivente estável. Multa do CPC/1973, art. 557, § 2º. Afastamento. Exaurimento da instância ordinária. Necessidade. Intuito protelatório. Não configuração. Resp 1.198.108/RJ (representativo de controvérsia). Decreto-lei 4.657/1942, art. 5º. CCB/2002, art. 790, parágrafo único. CF/88, art. 236, § 3º. CCB/2002, arts. 1.723 a 1.727.

«1. Cinge-se a controvérsia a saber quem deve receber, além dos herdeiros, a indenização securitária advinda de contrato de seguro de vida quando o segurado estiver separado de fato na data do óbito e faltar, na apólice, a indicação de beneficiário: a companheira e/ou o cônjuge supérstite (não separado judicialmente). ... ()

(Íntegra e dados do acórdão exclusivo para clientes)
Plano mensal por R$ 19,90 veja outros planos
Cadastre-se e adquira seu pacote

Íntegra HTML Íntegra PDF

Comentário:

Trata-se de recurso especial da 3ª Turma, do STJ, relatado pelo Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 04/08/2015, DJ 12/08/2015 [Doc. LegJur 156.4933.2002.2800].

A controvérsia gira em torno de saber quem deve receber, além dos herdeiros, a indenização securitária advinda de contrato de seguro de vida quando o segurado estiver separado de fato na data do óbito e faltar, na apólice, a indicação de beneficiário, ou seja, devem receber a companheira e/ou o cônjuge supérstite (não separado judicialmente). Para a 3ª Turma, a controvérsia resolve-se, no sentido, de que no seguro de vida, na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, o capital segurado deverá ser pago metade aos herdeiros do segurado, segundo a vocação hereditária, e a outra metade ao cônjuge não separado judicialmente e ao companheiro, desde que comprovada, nessa última hipótese, a união estável, já que o artigo 792, do CCB/2002, não resolve a questão.

Eis o que nos diz, o relator, no fundamental:

[...].

Extrai-se dos autos que o segurado firmou contrato de seguro de vida, mas deixou de designar beneficiários. Assim, após o seu falecimento, a quem deve ser paga a indenização securitária? Em tal situação, o art. 792 do CC prevê que o capital segurado deverá ser pago, por metade, ao cônjuge não separado judicialmente e a outra parte aos herdeiros, obedecida a ordem de vocação hereditária. Eis a redação do mencionado dispositivo legal:

«Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

Parágrafo único - Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.» (grifou-se)

Ocorre que, na espécie, o segurado estava separado de fato e vivia em união estável com outra mulher quando se deu o sinistro, condição essa comprovada pela companheira, visto que recebia pensão por morte paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

Nesse contexto, a doutrina pátria diverge a respeito da interpretação a ser dada ao art. 792 do CC. Com efeito, enquanto alguns entendem que a exegese a ser feita é literal, de forma que o cônjuge não separado judicialmente deve receber o capital segurado mesmo havendo comprovação da separação de fato, outros lecionam que a interpretação da norma deve ser sistemática e teleológica, a amparar também a figura do companheiro (união estável).

Perfilho a última corrente, porquanto o intérprete não deve se apegar simplesmente à letra da lei, mas deve perseguir o espírito da norma a partir de outras, inserindo-a no sistema como um todo, para extrair, assim, o seu sentido mais harmônico e coerente com o ordenamento jurídico. Além disso, nunca se pode perder de vista a finalidade da lei, ou seja, a razão pela qual foi elaborada e o bem jurídico que visa proteger.

Nesse sentido, o art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB):

«Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum».

[...].

Cumpre pontificar, por pertinente, que há, no Direito Securitário, outros casos em que ocorreu omissão quanto à figura do companheiro. Cite-se, a título exemplificativo, o enunciado nº 186 da III Jornada de Direito Civil, que, teleologicamente e privilegiando uma visão constitucional de unidade do sistema, a harmonizar os institutos do direito de família com o direito obrigacional, dispôs que «O companheiro deve ser considerado implicitamente incluído no rol das pessoas tratadas no art. 790, parágrafo único, por possuir interesse legítimo no seguro da pessoa do outro companheiro».

Logo, a interpretação do art. 792 do CC mais consentânea com o ordenamento jurídico é que, no seguro de vida, na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, o capital segurado deverá ser pago metade aos herdeiros do segurado, segundo a vocação hereditária, e a outra metade ao cônjuge não separado judicialmente e ao companheiro, desde que comprovada, nessa última hipótese, a união estável.

Assim, o pagamento da indenização securitária quando inexistir indicação de beneficiário na apólice de seguro de vida se coadunará ao que já acontece na previdência social e na do servidor público e militar nos casos de pensão por morte. Isso porque, em tais situações, é possível o rateio igualitário do benefício entre o ex-cônjuge e o companheiro do instituidor da pensão, visto que não há ordem de preferência entre eles.

Em outras palavras, a vigência do matrimônio não é empecilho para a caracterização da união estável se configurada a separação de fato entre os ex-cônjuges. Por isso, havendo o pagamento de pensão por morte, o valor poderá ser fracionado, em partes iguais, entre a ex-esposa e a convivente estável, haja vista a possibilidade de presunção de dependência econômica simultânea de ambas em relação ao falecido.

[...].» (Min. Ricardo Villas Bôas Cueva).»

JURISPRUDÊNCIA DE QUALIDADE

Esta é uma jurisprudência de qualidade. Para o profissional do direito este julgado é uma fonte importante de subsídio, já para o estudante é muito mais relevante, justamente por dar vida ao direito, ou seja, aqui estão envolvidas pessoas reais, problemas reais que reclamam soluções reais. Vale a pena ler esta decisão. Certa, ou errada, podemos ou não concordar com ela, contudo, está bem fundamentada pelo Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Tudo está exposto de forma didática, clara, fácil compreensão e de prazerosa leitura, como é de longa tradição do ministro relator.

Como pode ser visto nesta decisão, o ministro relator, em poucas linhas, delimitou a controvérsia, distinguiu, definiu e determinou o fundamento legal dos institutos jurídicos envolvidos na hipótese, ou seja, no fundamental contém o que toda decisão judicial ou tese jurídica deveriam conter, se estão corretas, ou não, o exame é feito noutro contexto. Neste sentido esta decisão deveria ser lida e examinada com carinho, principalmente pelo estudante de direito, na medida que é uma fonte importante de estudo, aprendizado e qualificação. Decisões bem fundamentadas estimulam a capacidade de raciocínio lógico do estudioso. O raciocínio lógico é a ferramenta mais importante para qualquer profissional desenvolver sua capacidade criativa.

Vale lembrar que é sempre importante antes de definir uma tese jurídica consultar a jurisprudência das cortes superiores, particularmente as súmulas e os julgados tomados em recursos repetitivos e em repercussão geral.

Consulte o banco de dados do site LegJur sobre os leadingCase (repetitivo e repercussão geral), consulte também as súmulas e a jurisprudência. É só clicar.

LeadingCase Súmulas Jurisprudência